Escrito por Emildo Sambo em 01 Fevereiro 2016 |
O clima de cortar à faca alastra-se pelo país por conta do agravamento da tensão político-militar. A estratégia do Governo, de desacreditação e diabolização do partido Renamo para justificar o seu fracasso nos esforços de busca da paz, pode cair em saco roto, porque ao contrário do que o regime e a sua Polícia veiculam, as vítimas dos ataques supostamente perpetrados pelo maior partido da oposição asseguram que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) cometem desmandos e são responsáveis pela fuga de milhares de moçambicanos para o Malawi. Por sua vez, o Presidente da República, Filipe Nyusi, alega que há crise de liderança na “Perdiz”.
Em Addis-Abeba, capital da Etiópia, Filipe Nyusi, voltou a reconhecer que “sem a paz não há desenvolvimento” em Moçambique, mas não soube explicar o que é necessário para o fim da crise política que se arrasta há anos.
Em relação ao diálogo político entre o Governo e a Renamo, suspenso desde Agosto do ano passado por falta de consenso nos temas discutidos, ele disse que o seu Executivo não quer “inventar um diálogo forçado”, pelo que não indicou quando é que as partes voltarão a sentar à mesma mesa para ultrapassar os diferendos que lhes colocam de costas voltadas.
No que tange à pretensão da Renamo de governar as províncias onde reclama vitória nas últimas eleições gerais – Nampula, Niassa, Manica, Sofala, Tete e Zambézia – a partir de Março próximo, o Chefe de Estado mostrou-se contra, a par do que os seus correligionários têm vindo a defender desde que Afonso Dhlakama manifestou tal intenção.
“No dia em que eu disser que a Renamo vai governar as seis províncias alguém vai dizer que isso não é democracia”, disse Nyusi a jornalista em Addis-Abeba e acusou a “Perdiz” de falta de liderança, o que na sua opinião dificulta que se trave conversações conducentes à paz e estabilidade no país.
“O que se passa é que há falta um interlocutor base” na Renamo e “o problema” neste partido é o “de crise de liderança. Não se percebe no partido quem segue a quem. Não há hierarquia”, pese embora se saiba que o líder é Afonso Dhlakama, disse Nyusi.
Enquanto isso, no posto administrativo de Mapadza, distrito de Maringué, em Sofala, homens armados alegadamente pertencentes ao partido Renamo raptaram, na madrugada de sexta-feira (29), o chefe de uma povoação e antigo combatente no regulado de Nhamucoloo, identificado pelo nome de Lencastre Diquissone.
A Polícia naquela parcela do país disse que os guerrilheiros em causa, em número de cinco, depois de arrancar alguns bens e dinheiro, lembraram-se, a meio do trajecto, de que deviam regressar à casa da vítima para buscar os seus filhos, os quais escaparam porque não se encontravam no local. As FDS estão a para investigar o crime, que é o quarto de género em um mês. Os anteriores três sequestros aconteceram nos distritos de Nhamatanda e Gorongosa.
Um agente policial afecto aos serviços florestais no distrito de Mopeia, província da Zambézia, assistido no Hospital Provincial de Quelimane, alegou ter sido baleado por homens armados da Renamo, que o surpreenderam, na madrugada de quinta-feira (28), na companhia de oito colegas, quando trabalhavam no Posto Policial de Zero.
Contudo, Lusa Fátima Niquise, mãe de nove filhos, que a 8 de Janeiro chegou ao centro de refugiados de Kapise, no Malawi (onde há mais de dois mil moçambicanos), contou à Lusa ter visto blindados das Forças Armadas entrarem em Ndande, distrito de Moatize, em Tete, “para perseguir a população e a Renamo. Não há condições para voltar sem haver paz”.
As atrocidades protagonizadas pelas forças do regime, sobre as quais o ministro do Interior, Jaime Monteiro, e Filipe Nyusi mantêm um silêncio sepulcral, não são, afinal, recentes em Ndande. A agricultora de 45 anos disse àquela agência ter escapado por quatro vezes das perseguições das FDS.
Ainda na semana finda, presumíveis homens armados da “Perdiz” atacaram um posto policial e feriram um agente dos serviços florestais no distrito de Mopeia, na Zambézia.
Uma outra cidadã que se identificou por Magrace Joaquim, de 26 anos de idade, pai de cinco filhos, narrou, de acordo com a Lusa, que a sua sogra e duas cunhadas foram capturadas em Ndande pela Unidade de Intervenção Rápida quando se dirigiam à machamba para colher feijão e depois fugir da zona. “Foram torturadas, obrigadas a carregar madeira que os militares roubaram de moradores, e depois mantidas reféns numa escola que a FIR [leia-se UIR] tinha transformado em base".
A agricultora, frágil, novamente grávida e de lábios rasgados devido à fome, após ter percorrido 70 quilómetros a pé para chegar ao centro de refugiados de Kapise, afirmou que não há como voltar à casa enquanto UIR estiver na sua aldeia, pelo que apela ao Governo e à Renamo “para que se entendam e coordenem uma nova paz, porque é difícil voltar para casa sem paz".
Sobre estes cidadãos no Malawi, Nyusi mostrou-se reticentes em relação ao termo “refugiados”, pois segundo explicou a jornalistas, os habitantes de Tete entram naquele país com facilidade e o mesmo acontece com os malawianos.
Entretanto a presença dos refugiados no país viznho foi confirmada pelo Governo local e representantes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os refugiados (ACNUR), que estão a prestar apoio a esses moçambicanos.
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