segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

"Falta de diálogo em Moçambique acentua polarização"

MOÇAMBIQUE

Em entrevista à DW África, professora da Universidade Leiden, na Holanda, diz que retorno à guerra civil é improvável, mas conflitos entre RENAMO e FRELIMO fragilizam o longo processo de paz.
Os efeitos do Acordo Geral de Paz de 1992, que selou o fim dos 16 anos de guerra civil em Moçambique, perde cada vez mais força. A intensificação dos conflitos entre RENAMO e FRELIMO nos últimos meses têm acentuado a polarização e a desigualdade social no país.
Para Corinna Jentzsch, professora assistente de Relações Internacionais da Universidade Leiden, na Holanda, a falta de reconciliação nacional e falhas na reintegração de ex-combatentes são os principais responsáveis pela instabilidade política atual.
"A polarização social persiste ao longo dos anos desde o acordo de paz. O país permanece dividido entre simpatizantes da RENAMO e da FRELIMO, entre o Norte e o Sul", explica a especialista que fez pesquisas de campo sobre a guerra civil e o processo de paz em Moçambique.
"Apoiadores da RENAMO reclamam de falta de acesso a postos de trabalho e de discriminação. E agora o país enfrenta um crescimento acentuado da desigualdade social, o que significa que nem todos têm acesso aos lucros gerados pelos recursos naturais."
Corinna Jentzsch, professora da Universidade Leiden, realizou pesquisas de campo em Moçambique
Num comunicado divulgado na semana passada, a RENAMO informou que só vai dialogar com o Governo de Filipe Nyusi se o partido governar as seis províncias onde reivindica a vitória nas eleições gerais de 2014.
Corinna analisa que o posicionamento da RENAMO, que mantém fileiras armadas, deve-se à incapacidade do líder do partido, Afonso Dhlakama, de inserir-se num ambiente político democrático. Segundo a especialista, Dhlakama mantém uma mentalidade de guerrilha. Por sua vez, a FRELIMO acentua as rivalidades.
“A repressão está aumentando. A FRELIMO propõe a ideia de união nacional ao ponto de silenciar a oposição. Nunca houve um processo de reconciliação a nível nacional. A guerra continuou não puramente com violência, mas com palavras. Todos os problemas sociais de Moçambique são entendidos hoje sob o espectro do conflito entre a RENAMO e a FRELIMO. Essas diferenças nunca foram superadas, então a rivalidade da guerra civil continua", analisa.
Solução ainda é o diálogo
Os últimos meses têm sido marcados por ataques, raptos e assassinatos, com trocas de acusações entre a RENAMO e a FRELIMO. Apesar disso, Corinna diz que um retorno à guerra civil é pouco provável.
"A violência atual está concentrada em regiões específicas e ainda não se espalhou por todo o país. Apesar de a RENAMO provocar o Governo com ataques, continua a ser um partido fraco. A questão é se o partido vai conseguir apoio adicional da população para se tornar uma ameaça real ao Governo", diz Corinna.
Diversos setores têm se oferecido para mediar o conflito. O envolvimento da Igreja Católica e do presidente da África do Sul, Jacob Zuma, podem ter um efeito positivo, mas segundo a professora da Universidade Leiden, o diálogo entre a RENAMO e FRELIMO ainda é a solução mais eficaz para um acordo permanente.
"No longo prazo, é preciso superar o discurso de 'nós contra eles', usados pelos dois lados. E isso requer um processo mais amplo que envolva mais do que tentativas de reuniões."
 
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