segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Jogos perigosos

Actos de irresponsabilidade, decididos por emoção e sem qualquer tipo de reflexão séria podem incendiar um país e reduzi- -lo a cinzas. Cabem nesta categoria a decisão de atacar a comitiva do presidente da Renamo, Afonso Dhlakama, na província de Manica, assim como a acção do próprio Dhlakama, ao ordenar, num comício na última quinta-feira em Tambarra, também em Manica, a detenção do administrador local, o chefe das operações do comando da polícia e o primeiro secretário da Frelimo. Apesar de todo o tipo de especulações até aqui aventadas, continuam desconhecidos os verdadeiros autores do ataque à caravana de Dhlakama. Também ninguém sabe quais teriam sido as motivações. A Renamo acusa a Frelimo de tentar assassinar o seu líder, e esta responde acusando o seu inimigo de estimação de ter engendrado o incidente para encontrar justificação para iniciar a guerra. Não restam dúvidas que a Renamo está em modo de guerra, mas a menos que haja uma investigação técnica, objectiva e independente que nos possa dar luz sobre o que realmente aconteceu, todo o pronunciamento não sairá do reino da especulação. Agora que foi um jogo perigoso, como uma criança que ao brincar com o fogo pode incendiar a casa, não há a mínima dúvida. Será que alguém está interessado em provocar uma crise pior do que aquela em que o país se encontra? Na mesma linha se enquadra a ordem do presidente da Renamo, ao mandar prender as três figuras já referidas. Felizmente o pior não aconteceu porque o administrador instruiu as pessoas visadas a saírem dos seus postos de trabalho e abandonarem as suas casas. Ele próprio desapareceu da circulação. São episódios mal pensados como estes que se podem transformar numa tragédia de consequências incalculáveis. A actual situação política no país já é propícia para isso, e basta um pequeno acto de irresponsabilidade para se atear um fogo que se pode alastrar por todo o país. Basta imaginar como é que um chefe de opera- ções da polícia, com homens fortemente armados sob seu comando, reagiria a uma acção ilegal, protagonizada por uma milícia igualmente ilegal para o desarmar e colocá-lo sob custódia. Instintivamente iria responder com as armas e homens em seu poder, e no fogo cruzado o resultado seria uma verdadeira chacina. Dhlakama pode ter dado esta ordem acreditando que isso iria demonstrar junto da população local o seu poder, mas como líder político que é, deveria ter antes calculado as consequências da sua acção, das quais não se pode descartar a possibilidade de colocar em causa a sua própria integridade física. A Renamo está em desavenças com o governo, mas é importante que os seus dirigentes compreendam que será na mesa das conversações de onde virá a solução. Molestar dirigentes da administração do Estado, num verdadeiro acto de delinquência juvenil, é dificilmente a postura de um dirigente político que pretende que o povo o leve a sério.

Os vigaristas
Por João Carlos Barradas*

Haceno positivo! á um potencial vigarista a cada esquina apostado em explorar em proveito próprio as fraquezas alheias e esta é uma realidade incontornável da economia concorrencial capitalista, a crer no que a Volkswagen e dois Nobel da Economia acabam de demonstrar.   Martin Winterkorn - tal como Ricardo Espírito Santo, um cultor do pormenor e da gestão centralizada - acabou enleado na própria fraude, enquanto a Volkswagen nos Estados Unidos tentou iludir, durante mais de um ano, as suspeitas do Departamento de Protecção do Ambiente.  Aventar informação errónea ou fraudulenta é, por sinal, uma das típicas estratégias concorrenciais referenciadas pelos Nobel da Economia, George Akerlof (2001) e Robert  Schiller (2013), no recente livro “Enganar os Tolos”, um estudo sobre “manipula- ção e engano”. Uma economia de mercado não se reduz à folia de tramóias, tem equilíbrios instáveis de oferta e procura, mas sem regulação concertada na compita, segundo regras democrá- ticas, de interesses contraditórios dá azo à proliferação de arroubos especulativos, asseveram Schiller e Akerlof.                      A artimanha Um artimanha informática para falsi- ficar dados sobre emissões poluentes de veículos a diesel e aumentar vendas no mercado norte-americano dominado pela Ford, Toyota e General Motors justificou a fraude Volkswagen desde 2009, segundo admite a empresa de Wolfsburg.   A fraude vai, contudo, além das 482 mil unidades vendidas nos Estados Unidos, tendo idênticos dispositivos sido instalados em 11 milhões de veículos a diesel, de acordo com a Volkswagen. Inquéritos anunciados da Europa à Austrália vão não só afectar a Volkswagen e demais empresas alemãs, como a Daimler ou BMW, mas, também, prejudicar fortemente as vendas do segmento de veículos a diesel na Europa e nos Estados Unidos. Baixar custos de produção e manutenção na filtragem de poluentes, promovendo, simultaneamente, uma falsa imagem de veículos “amigos do ambiente” e económicos, apesar do preço superior do diesel nos Estados Unidos em relação à Europa, alimentaram a vigarice e convém chamar as coisas pelos seus nomes. A hierarquia A primeira tentação é equiparar o escândalo Volkswagen às manipulações da taxa LIBOR, onde proventos ilícitos individuais propiciavam a escalada fraudulenta, mas no caso da empresa alemã os indícios apontam para uma estratégia aprovada ao mais alto nível em que o provento financeiro pessoal imediato aparenta ser secundário. Faz sentido dado que optimizar lucro ou divisar forma excepcional de ganhar quota de mercado ou gerar novas receitas é, de acordo com Akerlof e Schiller, próprio de uma economia capitalista, gerando equilíbrios de mercado peculiares.   Tal propensão é identificável, também, em sistemas não-capitalistas, mas o que está em causa para os economistas norte-americanos é, essencialmente, a presença em mercado, livre de interferências arbitrárias de poderes políticos, de agentes com capacidades de persuasão, negociação e cabedal de conhecimentos díspares.   Traduza-se Os dois Nobel interessam-se especialmente pelos mercados financeiros dada a sua volatibilidade e volume de transacções, traduzidas em ganhos e perdas espectaculares em função de dados económicos, políticos ou contabilísticos passíveis de manipulação. Das expectativas de ganho sugeridas ou induzidas por certos agentes no mercado à apreciação sóbria, ingénua ou deficiente dos demais interessados - compradores, reguladores, cooperantes ou concorrentes - é ampla a gama de alternativas de compra, venda, investimento  e regulação que, por definição, deixam margem para a vigarice.   O livro “Phishing for Fools: the economics of manipulation and deception” foi lançado este mês pela Princeton University Press. *Jornalista

Filipe Nyusi
Em blogues, jornais e redes sociais digitais é frequente desejar-se que o presidente da República, Eng.º Filipe Nyusi, faça mais do que faz ou pode fazer. Pretende-se que ele tenha um superpoder capaz de resolver tudo o que há a resolver no país. É a ele que se apela e não às instituições, faz-se dele um ser providencial, um messias, um deus que deve governar por inteiro a terra pecaminosa. Isto é isolar Nyusi, individualizá- -lo por inteiro, Nyusi que, repetidamente, tem afirmado que respeita a Constituição, não lhe competindo por isso imiscuir-se nas instituições. Sem dúvida que os presidentes da República fazem história, mas não são livres de a fazer nas condições por eles escolhidas, arbitrariamente, estrangeiros à história, às determinações e a quem os apoia e escolheu - para adaptar uma famosa posição de Karl Marx.

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