domingo, 21 de junho de 2015

País 'obrigado' a aumentar dívida pública para crescer

O economista António Francisco, com terceira abordagem sobre a dívida pública em Moçambique. Acredito que vamos aprender um pouco da economia e muito mais se os economistas nos derem muito subsídio.
António Francisco: País 'obrigado' a aumentar dívida pública para crescer
Moçambique está obrigado a aumentar a dívida pública para financiar a sua expansão económica, o que seria um mal menor se as verbas fossem canalizadas para o consumo e não para o investimento, defende o economista António Francisco.
"Considerando a estratégia de crescimento principalmente com poupança externa, e a aceitação dos fazedores de políticas, de certo modo resignada ou fatalista, das baixas poupanças domésticas, na prática Moçambique não tem outra forma de acelerar o crescimento económico a não ser recorrer à dívida pública ou à convivência com défices elevados nas contas correntes", explica o fundador do Instituto de Estudos Sociais e Económicos.
Em entrevista à Lusa, António Francisco explica que, "como essa é a escolha seguida tanto pelo Governo como pelos seus parceiros internacionais, a questão que fica é discutir os riscos, os limites, potencialidades e consequências de tal opção", que aliás o economista critica por ter retirado espaço de manobra aos empresários moçambicanos.
"Diferentemente de alguns dos meus colegas que criticam o recurso à dívida pública, eu vejo esta opção como corolário inevitável da estratégia de crescimento com a poupança externa", que diz ser a preferida dos parceiros internacionais "por descrédito de que os governos consigam fazer melhor".
O debate sobre a dívida pública em Moçambique, que está perto dos 60% do PIB, tem sido um dos maiores focos de tensão política e de debate económico, com várias instituições económicas internacionais a questionarem se o montante será excessivo, e outras a defenderem que o financiamento é essencial para o desenvolvimento do país.
"Faço questão de me distanciar das duas abordagens prevalecentes: a abordagem dos crentes acríticos na ideia que está tudo sob o controlo; e a abordagem dos críticos do endividamento público galopante, mas que não reconhecem que este é um caminho inevitável se quisermos manter taxas elevadas de crescimento, sem ser pela alteração radical das políticas económicas, visando elevar a poupança doméstica e a acumulação de capital produtivo nacional, e por essa via reduzir a dependência das poupanças externas e défices nas contas correntes", conclui o economista.
No futuro, diz, é possível que Moçambique atinja ou ultrapasse o limite: "Iremos entrar em insustentabilidade ou crise, mas isso não será novidade, passámos por algo similar em 1984 e em 1999, não vejo por que não voltemos a cair em tal situação uma terceira vez, tendo em conta a complacência e a anuência da opção estratégica de crescimento do Estado e seus parceiros internacionais".
Aliás, acrescenta, "com a história de consumismo que temos, depois de nesses períodos termos estado na iminência de uma dívida impagável, estou convencido que não há duas sem três e vamos acabar por cair nessa tendência".
O que não se sabe, conclui, "é se tal crescente e inevitável endividamento irá acabar por ir mais para o consumo ou para o investimento", diz, lembrando que "nos últimos 50 anos, 52% das verbas do estrangeiro foram para o consumo e 48% para o investimento", quando a aposta no investimento reprodutivo devia ter sido muito mais vincada.
Fonte: Lusa – 20.06.2015
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  • Carlos Nuno Castel-Branco Acho que o António Francisco não entendeu a crítica feita por "alguns dos meus colegas", que discutem a dívida em várias dimensões - a velocidade galopante, as causas da dívida, a sua ligação com os padrões de investimento e crescimento e as suas implicações para o sistema financeiro. Esta crítica está enraizada na discussão das estruturas económicas e da política económica - por exemplo, o tipo de despesa pública e os incentivos e outros subsídios dados aos grande capital. Portanto, a crítica não é ao uso de dívida em si, apenas, mas por um lado ao abuso e vício de dívida e, por outro, ao tipo de dinâmicas de acumulação capitalista a que tal dívida está ligada. Os "meus cokegas" não são anti dívida em si. Fazer argumentos partindo da crítica a argumentos requer entender os argumentos que se criticam. De que valem altas taxas de crescimento se estas forem assentes e dependentes de dívida e especulação? Serão as altas taxas de crescimento a questão ou a questão é o tipo de economia que está a ser criado e para o que serve? Acho que vale a pena reler as críticas que existem sobre a questão do endividamento. Já agora, de onde virá a mobilização da poupança doméstica? O total de incentivos fiscais redundantes dados a facções do capital excede, anualmente, o total de acréscimo anual à dívida.
    20/6 às 20:03 · Editado · Gosto · 1
  • Antonio A. S. Kawaria Gostaria tanto que Antonio Francisco, pudesse responder as questões que coloca Carlos Nuno Castel-Branco. Não sei porquê não consigo lhe tagar.
  • Carlos Nuno Castel-Branco Se a dívida pública já entrou na área perigosa, e continua a crescer de forma galopante, como se pode manter a ideia de que a dívida pode continuar a ser usada como até aqui para sustentar crescimento económico? Não vai a crise travar esse mesmo crescimento? Porque é que crescimento tem que causar esse nível de dívida pública e a aceleração do endividamento público? O que se passa com a despesa - EMATUM, HCB, Ponte da Catembe, logística do gás e carvão, etc.? Porque é a despesa pública em crescimento tão intensiva em capital? Será essa a única opção de crescimento? Porque mantemos subsídios às multinacionais e outras formas extractivas de capital - isenções fiscais redundantes, entrega quase gratuita da gestão de infraestruturas públicas, da terra, dos recursos minerais e energéticos, das florestas e da água - que, entre muitos outros factores, afectam as dinâmicas de receita? Se a dívida financia sobretudo um tipo de crescimento - altamente intensivo em capital, que gera muito pouco emprego estável e a alto custo por posto de trabalho, e requer altos custos de financiamento público - não será a questão central a de discutir e questionar as prioridades e focos reais - não estamos a discutir a retórica - da estratégia de desenvolvimento? Como se mobilizam recursos domésticos para investimento? De onde virão - por exemplo, como é que a eliminação dos incentivos fiscais redundantes permitiria mobilizar recursos domésticos? Considerando apenas 3 multinacionais, os ganhos fiscais poderiam ter o seguinte impacto: 1) travar o endividamento público interno; 2) reduzir o incentivo especulativo no sistema financeiro doméstico e tornar os bancos mais interessados no financiamento produtivo de pequena e média escala e mais diveraificado; e 3) dar ao estado a capacidade de realizar o tipo de investimento que ajude a reduzir os custos marginais do investimento privado de pequena e média escala e diversificado, o que hoje não acontece. Isto poderia realocar recursos do grande capital extractiva para a diversificação da base produtiva, gerar dinâmicas positivas entre o sistema financeiro e produtivo e reduzir o que custa investir. Poderia ser este um caminho para mobilizar mais recursos domésticos? O que faria o capital com mais recursos domésticos? Onde é que investe em quê e porquê? As áreas privilegiadas do investimento real do capital doméstico são finanças, construção, transportes e comunicações, assim como intervenções periféricas em torno do núcleo extractiva da economia. Como é que maior consistência entre política fiscal e monetária e a eliminação de incentivos e subsídios redundantes para o grande capital poderiam ajudar a mudar as intenções de investimento? Ou seria necessária alguma forma de política industrial? Finalmente, a dívida não é só um efeito de alguma coisa - do consumo exceder o rendimento. Também tem efeitos dinâmicos na economia, dependendo do tipo de economia e das dinâmicas da divida. No caso de Moçambique, além do efeito directo de incentivar um sistema financeiro especulativo, as dinâmicas de dívida são parte de e estão a gerar uma bolha económica especulativa. Isso é mais perigoso do que a dívida em si. Portanto, a questão da dívida e os problemas associados não é para ser tratada com agregados e ideias abstractas, sem a investigação das dinâmicas económicas, sociais e políticas fundamentais a ela associadas, tanto globais como específicas. São estas questões detalhadas, e outras, que outros investigadores do IESE estão a analisar, discutindo as dinâmicas económicas, políticas e sociais da dívida e do seu papel no sistema de acumulação primitiva de capital. Assim que puder - agora estou numa viagem de longo curso de comboio dentro da Inglaterra - vou colocar aqui disponíveis uma série de artigos e pequenos textos que discutem estas questões. Entretanto, penso que a Fernanda Do Prince Chivulele, o Carlos Muianga, a Mindoca Nelsa, a Epifânia Langa, a Oksana Mandlate, a Sofia Dos Santos podem fazer outros contributos, pois ou estão a estudar a questão em detalhe, ou estão a confrontar-se com ela no contexto de outros assuntos que estão a estudar em detalhe.
    19 h · Editado · Gosto · 1

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