Julião João Cumbane adicionou 2 fotos novas.
Aqui reflicto sobre o plano de «aquisição» de carteiras escolares pelo Governo de Moçambique.
Presumivelmente, todos nós sabemos o que é uma carteira escolar. Será? Bom, uma carteira escolar é um «móvel comummente encontrado nas escolas, desenhado para propiciar aos alunos a acomodação adequada para assistir às aulas». Tradicionalmente, a carteira escolar consiste de uma cadeira e uma mesa de superfície plana (fisicamente separados e ligados), que permite que o aluno escreva de modo livre sobre ela, contando ainda com espaço para guardar livros, cadernos e afins. As carteiras escolares mais comuns entre nós são produzidas a partir da madeira. Mas também se empregam outros materiais no fabrico de carteiras, entre os quais o plástico. Modernamente, até já se produzem carteiras escolares informatizadas, nas quais à funcionalidade da carteira escolar convencional se adiciona o computador com todos os periféricos indispensáveis (e.g. teclado, monitor) acoplados, de modo a permitir que o professor possa optar por aulas convencionais ou agregar conteúdos informáticos para os alunos.
Ora, nas suas primeiras aparições públicas, depois da investidura, o Presidente da República (PR), Filipe Nyusi, visitou escolas primárias, onde observou 'in loco' as condições degradantes em que as nossas crianças estudam e os nossos professores ensinam. Se é que só ouviam dizer, o PR e o titular do novo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano—que acompanhava o PR naquelas visitas, com só tinha a ser—verificaram que as condições em que se ensina e aprende nas nossas escolas são deveras degradantes, em algumas situações, que era necessária uma intervenção "urgente". Aquelas visitas ocorreram numa altura em que o Plano Quinquenal do Governo (PQG) 2015 – 2019, Plano Económico e Social (PES) e o Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2015, instrumentos que o Governo precisava para começar a trabalhar, ainda não tinham sido aprovados pela Assembleia da República (AR), como assim dita a lei.
Gostei de ver o PR e o Ministro da Educação e Desenvolvimento Humano a fazerem aquelas visitas, mas confesso que fiquei com uma pulga atrás da orelha. É que não constitui novidade para ninguém que temos, neste país, crianças que estudam sentadas no chão e debaixo de árvores, por falta de carteiras e de salas de aula (...).
Ora, ocorreu que de repente foram conseguidos por ai 350 milhões de meticais (o equivalente a 10 milhões de dólares americanos, aproximadamente) para a «aquisição» de carteiras escolares. Aonde? Na China! Tudo na China! Os contornos das negociações para atender esta "emergência" identificada nas visitas do PR e do Ministro da Educação e Desenvolvimento Humano às escolas não estão claros. Mas não é isso que me indigna. Talvez o Marcelo Mosse se interesse por esta parte da estória, por ser da sua especialidade. O que me indigna é o facto de essas negociações terem sido para "negociar" a «aquisição» de carteiras escolares na China, China que é o país de origem das empresas envolvidas no negócio de exportação de madeira em toros de Moçambique para aquele país. Há tudo para se suspeitar que tais negociações foram uma negociata. E negociatas é o tipo de práticas que indiquei na minha reflexão sobre "Políticos empresários moçambicanos e clientelismo..." como uma das causas que asfixiam a democracia e atrasam o desenvolvimento de Moçambique (vede ligação fornecida abaixo).
Ah! Confesso que esta me dói muito. E me dói muito, porque suspeito que as carteiras escolares adquiridas na China tenham sido fabricadas a partir da madeira extraída de Moçambique. Não sei se não estará envolvido nesta negociata um dos PEM ( = políticos empresários moçambicanos). Estas negociatas são deveras perniciosas para o desenvolvimento de Moçambique, por facilitar o saque dos nossos recursos naturais, que depois de transformados em objectos de utilidade noutras paragens, para onde exportamos a madeira em toros, nós importamos os produtos acabados a preços muito mais altos do que os preços com que vendemos as matérias-primas usadas na produção desses objectos.
Enfim, eu pergunto: por que foi preciso tratar o assunto das carteiras escolares como um caso de urgência clínica? Alguém pode dar uma resposta? É que, pensando bem, o valor usado para a aquisição de carteiras escolares no mercado externo poderia muito bem ter sido usado para, por exemplo, montar uma fábrica de produção de mobiliário escolar aqui no país—de onde, afinal, a China importa madeira em toros para a produção de objectos que nós de lá importamos. Isto põe-me deveras triste!
Eis algumas ligações ligadas com esta reflexão:
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