segunda-feira, 23 de março de 2015

Sonhar com moçambicanos detentores da economia nacional é uma utopia


João Mosca – Economista (FotoDebate)
O Presidente da República, Filipe Nyusi, reiterou no seu discurso de investidura que um dos pilares da sua governação passa pela transformação da pirâmide económica, fazendo dos agentes económicos nacionais donos e detentores de grande parte das potencialidades e riquezas de que Moçambique dispõe. O economista moçambicano, João Mosca disse que este anseio não é mais do que uma utopia que não poderá efectivar-se, devido ao fraco poder financeiro dos fazedores da economia interna.
Quais os grandes desafios PARA o actual Governo?
Mosca aponta, como desafios imediatos, a resolução dos pendentes com a Renamo, que mina o crescimento económico, a criação de condições que assegurem a estabilidade política efectiva e a redução das assimetrias sociais que continuam preocupantes, situação agravada com a exclusão da população nos processos de tomada de decisões e a necessidade de transformar a máquina governativa como instrumento do povo e não para atender a interesses económicos da classe minoritária no poder, como outrora aconteceu com os Governos de Joaquim Chissano e Armando Guebuza.
Entretanto o que pode ser alcançado é o desenvolvimento inclusivo, onde a população vai ter mais benefícios com a exploração das riquezas existentes, o que vai contribuir PARA a redução dos índices elevados da pobreza, défice alimentar, subnutrição, falta de emprego e oportunidades de negócio para os moçambicanos.
Terá que haver igualmente um reajustamento das taxas de impostos, contractos e concessões, de modo a que mais investimento externo declarado permaneça em Moçambique, para custear as despesas internas relacionadas com o salário, entre outros. Para o efeito há necessidade de redefinir e reformular as directrizes da legislação fiscal e tributária para permitir que o Governo e os moçambicanos tirem mais dividendos económicos com a exploração dos recursos naturais existentes.
“Actualmente Moçambique ganha muito pouco com as receitas de exploração do gás e do carvão, porque falta capacidade técnica, competência humana e logística de negociação em defesa dos interesses do estado, o que é agravado porque não se aposta no mercado externo para aquisição desses recursos humanos para colmatar o défice”, vincou o interlocutor.
Dívida moçambicana vai limitar as manobras do actual Governo?
Na óptica do economista a dívida moçambicana, que ascende aos 6 biliões de dólares, reduz a margem de manobra do actual Governo, porque qualquer recessão económica resultante de uma falha na implementação da balança comercial, pode levar a um colapso macroeconómico e dificultar o pagamento do montante em alusão.
Outro aspecto levantado prende-se com a necessidade de adopção de um instrumento de gestão dos proventos dos recursos minerais, com vista a contribuir para o pagamento da dívida externa e desta forma reduzir paulatinamente a dependência e assegurar uma ligeira autonomia económica, que iria catapultar o desenvolvimento na sua plenitude.
Este desiderato, segundo Mosca, somente poderá ser alcançado com a melhoria do ambiente do negócio, a existência de uma competitividade económica interna capaz de acompanhar a variação do preço no mercado internacional, e colmatar eventuais insuficiências para assegurar a produção e exploração, incluindo a redução de gastos governamentais que atinge cerca de 50% da riqueza nacional, dos quais 11% são somente para o pagamento de salários, constituindo actualmente o indicador mais alto do mundo.
São a ineficiência técnica, a escassez de recursos humanos qualificados e a fraca monitoria das infra-estruturas erguidas, que obrigam o retardamento do processo de expansão destes serviços PARA regiões mais recônditas, entre outras.
O nosso interlocutor avança a necessidade de se adoptar uma estratégia de contenção e redução drástica de gastos governamentais, que actualmente são insuportáveis e uma ameaça para a estabilização e maximização do crescimento económico, melhoria da renda familiar, da actividade económica que é secundarizada, entre outros males que estão a contribuir para a estagnação dos índices da pobreza, que continuaram quase inalteráveis nos dois mandatos de Guebuza.
“Governo está preocupado com os seus negócios e não com a defesa da população” garante Mosca  
Mosca sustenta que não compreende como é que anualmente a chuva causa problemas sociais, que são evitáveis.  Na sua opinião esta é uma demonstração clara de que o Governo moçambicano apenas está preocupado com o alargamento dos seus negócios em detrimento da segurança da população.
”Não investimos na implantação de infra-estruturas que sirvam de meios de protecção e absorção da água da chuva, principalmente nas imediações dos afluentes dos rios, onde frequentemente ocorrem cheias”.
Mosca diz faltar a definição de prioridades imediatas por parte do executivo, porque tanto a circular como a construção de barragens para produção de energia, edifícios dos ministérios, não são prioritários, mas sim a criação de condições mínimas para garantir uma educação de qualidade, implantar recursos hídricos que facilitem a drenagem da água dos rios mais problemáticos são cruciais para acabar com o sofrimento das calamidades naturais.
O entrevistado é peremptório ao afirmar que o Governo não é mais do que uma rede de elites políticas, que estão na dianteira para acomodar os interesses económicos e partidários, em detrimento do bem-estar da população que sempre é relegada para o segundo plano.
Renamo não tem condições para formar um Governo
A Renamo não tem condições para criar uma região autónoma, ou Governo de gestão, porque parece que não tem apoio internacional, nem dinheiro ou estrutura humana e técnica suficientes e capaz de materializar o aludido desiderato, explicou a fonte.
PARA Mosca esta posição não é mais do que uma pressão do maior partido da oposição para ganhar hegemonia e ter o privilégio de ocupar algumas pastas no actual Governo. Ele explica ainda que não há condições para a criação de uma estrutura governamental paralela, mas há necessidade de as duas partes encontrarem consensos para evitar um possível conflito que retarde ainda mais a economia moçambicana.
“Dhlakama está a incutir e enraizar, ainda que de forma indirecta, o regionalismo e tribalismo para que possa incrementar os níveis de pressão ao Governo, incluindo a mobilização maciça da população para que adira aos objectivos da Renamo e obriguem o Governo a ceder algumas exigências da perdiz”.
O economista sustenta que as partes envolvidas no diálogo devem ser tolerantes e despir os ideais políticos pautando pelo respeito dos princípios democráticos, com vista a resgatar a confiança dos parceiros internacionais que de forma paulatina estão a vender as suas acções nos grandes megaprojectos. Em resultado da instabilidade política, falta de uma estrutura de segurança que suporte e proteja os empreendimentos e a população de eventuais calamidades naturais.
Sem deixar de lado, a necessidade da criação de um mecanismo de segurança para evitar inundações, recorrendo à redução da propagação de negócios dos dirigentes que em nada contribuem para a melhoria das condições de vida da população e apostar cada vez mais na construção de barragens hídricas para absorver toda a água da chuva e das descargas de alguns países da região.
Agricultura familiar é secundarizada pelo Governo
A agricultura é uma actividade económica importante em Moçambique, empregando mais de 70% da população rural, contribuindo com 25% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
Mosca sustenta que com quase 36 milhões de hectares de terra arável, apenas 5,7 milhões de hectares são ocupados por mais de 3,7 milhões de pequenas e médias propriedades. Cerca de 70% de toda a terra cultivada é ocupada por pequenas propriedades, com tamanho médio de 2 hectares, as “machambas”. O que significa que há necessidade de criar incentivos para transformação e industrialização da agricultura familiar.
 PARA o efeito urge a necessidade de criar facilidades na concessão e aquisição do crédito agrícola, que ainda exclui, visto que apenas os que têm poder de compra e cargos directivos beneficiam desses serviços, em detrimento do pequeno agricultor que é obrigado a depender das condições climatéricas para desenvolver a sua actividade para garantir a subsistência do agregado familiar.
Os principais desafios enfrentados pelos pequenos agricultores relacionam-se com a baixa produtividade agrícola, o que pode ser atribuído à insuficiência de infra-estruturas e serviços de apoio e os desafios para o comércio dos seus produtos em mercados confiáveis. Apenas as variedades de sementes de baixo rendimento, e métodos agrícolas tradicionais, estão disponíveis para os pequenos agricultores, e eles têm poucas alternativas para compor a sua renda fora da agricultura, o que os torna particularmente vulneráveis ​​em caso de escassez e desastres naturais, assegurou Mosca.
Mosca adverte o executivo para a necessidade de realização de estudos científicos sobre sementes resistentes à seca, de modo a evitar que o país, principalmente os pequenos produtores, continuem a depender da chuva para desenvolver a sua actividade. O que contribuiria também para o abastecimento permanente do mercado local com a produção interna e incremento do volume da cadeia produtiva nacional, que continua a atenuar o défice alimentar e a exportação.
 Coutinho Fernando (coutofernando.fernando1@gmail.com)

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