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Pondo os pontos nos ís (IX)
Hoje proponho a colocação dos "pontos nos ís" na declaração, pelo Governo Americano (Administração do Barack Obama), a 1 de Junho de 2010, de que Mohamed Bachir Suleimane (MBS) é um "barão da droga" e, também, na nossa aparente colaboração com esta declaração. Coloco os "pontos nos ís" dizendo sobre este assunto o seguinte: Para os moçambicanos, apoiar a declaração do MBS como "barão da droga" é dar um tiro no próprio pé. Caros amigos, Mohamed Bachir Suleimane (MBS) até pode ser um "barão da droga", como assim o declarou o Governo dos Estados Unidos da América (através da Administração de Barack Obama). A pergunta que se coloca, porém, é: e depois? (O mesmo que "qual é o problema?") Na tentativa de achar uma resposta para esta perguta, vejamos primeiro o que se entende por "barão da droga" e como funciona. O termo "barão" é designação de um dos título da nobreza. Nobreza é uma classe social de maior estrato que se caracteriza por os seus membros levarem uma vida de conforto e de ostentação de riqueza. Assim, um "barão da droga" é uma pessoa que se distingue por possuir uma riqueza ganha ou poder conseguido à custa do negócio da droga. Muitas sociedades têm pessoas classificadas (geralmente por outrem) como "barões da droga". Como actua um "barão da droga"? Um "barão da droga" controla uma rede considerável de pessoas envolvidas na produção, comercialização e consumo de substâncias legalmente proibidas. Tais substâncias são, assim, denominadas 'drogas ilícitas'. O consumo de drogas ilícitas provoca alterações do estado de consciência do consumidor, levando-o eventualmente a que este fique quimicamente dependente. São exemplos de drogas ilícitas a maconha, a cocaína, o crack, o ecstasy, o LSD, a heroína, a morfina, o chá de cogumelo, as anfetaminas, o clorofórmio e o ópio, entre outras. Por serem proibidas, as drogas ilícitas entram num país e são comercializadas de forma ilegal. Dentre as consequências que a produção, comercialização e o consumo de drogas ilícitas trazem à uma sociedade destacam-se a violência, associada com a sua produção e comercialização (os produtores e comerciantes destas drogas disputam o mercado com o recurso à violência), e o recrudescimento do crime violento, associado ao consumo destas drogas. Outras consequências não menos nefastas entre os consumidores são doenças tais como a arritmia cardíaca, a trombose, o AVC, a necrose cerebral, a insuficiência renal e cardíaca, a depressão, a disforia, as alterações nas funções motoras, a perda de memória, as disfunções no sistema reprodutor e respiratório, o cancro, entre outras. Todos estes males associados com a produção, comercialização e consumo de drogas ilícitas podem representar encargos enormes para os Estados, dai a necessidade da sua proibição. Porém, exactamente a proibição oficial de produção, comercialização e consumo de drogas ilícitas torna o negócio destas substâncias altamente lucrativo e, por isso, apetecível de valer o risco. É aqui onde os "barões da droga" intervêm. Um "barão da droga" estabelece e controla as comunicações e as transacções comerciais entre os produtores e os distribuidores/ Para melhor encobrimento do seu envolvimento no negócio de drogas ilícitas, os "barões da droga" aplicam o dinheiro que amealham com este negócio em investimentos legal e socialmente permitidos e úteis, tais como a construção de imobiliária, o financiamento de actividades desportivas e de campanhas políticas, entre outras. Isto faz com que eles (os "barões da droga") tenham visibilidade diante dos líderes políticos e da sociedade (dai a designação "barões"). Geralmente, as actividades dos "barões de droga" pouco fazem de mal aos seus países de origem, senão facilitar o trânsito da mercadoria transaccionada entre os produtores e os distribuidores, actividade esta que é também conhecida pela denominação de 'narcotráfico' ou 'tráfico de drogas'. Pelo contrário, com a aplicação do dinheiro ganho pela facilitação do negócio de drogas ilícitas, os "barões da droga" ajudam os governos dos seus países—que passam a ser denominados "corredores da droga"—a través da sua participação directa na criação de postos de trabalho e indirectamente no aumento da receita que o Estado ganha com a colecta de impostos. Principalmente porque participam na criação da riqueza nacional, eles (os barões da drogam) podem beneficiar de protecção não-oficial do Estado que se beneficia dos seus investimentos. Agora sobre a nossa postura relativamente ao caso MBS. Por tudo o dito acima, o Estado moçambicano até pode proteger o MBS, mesmo se tiver sido provado de forma inequívoca que ele é "barão da droga". Para tal, pesam-se os 'prós' e os 'contras' das actividades convencionalmente consideradas ilícitas em que o cidadão se envolveu, para o Estado, e se toma e executa uma decisão política que é classificada e mantida fechada a sete chaves como "segredo do Estado". Qual é o problema em proceder-se desta maneira? Atenção! Não se está aqui a dizer que o negócio de substâncias ilícitas seja legalizado (se bem que em alguns países é permitida a produção, comercialização e consumo de algumas das substâncias indicadas acima como exemplos de drogas ilícitas). Longe disso. Está-se a dizer, isso sim, que o Estado moçambicano, entendendo que o MBS tem prestado um apoio considerável ao desenvolvimento de Moçambique, pode, como Estado soberano que é, considerar moralmente justificável oferecer uma protecção (ainda que não oficial) a este cidadão, enquanto o aconselha a se reabilitar. Racionando assim, pode até ser que o propalado "rapto" do MBS tenha sido arquitectado para evitar que ele fosse fisgado pela justiça norte-americana, a qual anda no seu encalço desde que foi declarado "barão da droga" pela administração de Barack Obama. Por que seria isto um problema para nós? Pessoalmente, não vejo por que seria um problema a ponto de eu ter que apoiar e ficar satisfeito com a capturar do MBS para ser julgado e condenado pelo Estado Federal norte-americano. Pensado bem, todas as sociedades têm os seus "barões de droga". E falando de "drogas ilícitas", as armas deviam também entrar na lista. Ao que se sabe, os Estados Unidos da América e os seus aliados tradicionais (nomeadamente os Estados da Europa Ocidental) constam da lista dos que mais armas fabricam e vendem neste mundo, armas essas que causam luto e destruição noutras sociedades. Os países de origem destas "drogas ilícitas" protegem com unhas e garras os seus produtores. Outrossim, algumas ideias originárias e propaladas a partir dos Estados Unidos e da Europa Ocidental têm efeitos semelhantes aos das substâncias por eles definidas como "drogas ilícitas" noutras partes deste nosso mundo, mas eles protegem os autores dessas ideias. Um exemplo típico de tais ideias está patente no livro 'Versículos satânicos', que foi considerado "uma droga verbal letal" contra o Islão, facto este que fez com que o líder espiritual islâmico do Irão, Aiatolá Ruhollah Khomeini, proferisse a 'fatwa' contra o autor deste livro, Salman Rushdie, em 1989. Para escapar a execução decretada contra si pelo Islão, Salman Rushdie, que pode ser considerado um "barão de droga" do seu tipo (o livro que blasfema o Islão foi traduzido em muitos idiomas e vendido em muitas partes do mundo!), mudou-se da Inglaterra e radicou-se nos Estados Unidos, onde ele beneficia da protecção do Estado federal norte-americano. Deve haver razões que levam o Estado norte-americano a proteger Salman Rushdie para que não seja fisgado pelos países defensores da Sharia (a lei Islâmica), a quem ele ofendeu. Por que, no nosso caso, o Estado moçambicano não pode ter suas próprias razões para proteger o MBS, de facto um cidadão que tem sido muito útil ao país, só para poder cooperar com os interesses megalómanos de uma potência estrangeira? Onde está a nossa auto-estima neste caso, e noutros casos, em que nos colocamos a colaborar com interesses alheios aos nossos próprios? Enfim, a condenação que nós moçambicanos fazemos ao MBS e à pretensiosa protecção que ele recebe do Estado moçambicano não passa de um tiro dado ao nosso próprio pé. Tal condenação não ajuda a nós, mas sim aos que querem que a África, em geral, e Moçambique, em particular, continuem sendo apenas consumidores de produtos patenteados nos seus países. Vista no prisma mais realístico de Moçambique, a nossa condenação ao MBS—um concidadão que nunca nos fez nenhum mal, pelo contrário ele tem vindo a fazer mais o bem do que o mal—é antipatriótica. Vamos lá revermo-nos! |
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