Foi recentemente recomendado, numa reunião cúpula em Luanda, a adesão de um país-observador, a Guiné Equatorial, como membro efetivo da organização, a ocorrer na próxima cúpula deste ano em Díli.
A CPLP reúne os países lusófonos, “nações irmanadas por uma herança histórica, pelo idioma comum e por uma visão compartilhada do desenvolvimento e da democracia”, conforme indica o site da organização.
De acordo com os seus estatutos, “a CPLP é regida pelos seguintes princípios: primado da paz, da democracia, do Estado de Direito, do bom governo, dos direitos humanos e da justiça social”.
Se assim fosse, seria muito bom. Ora a adesão a Guiné Equatorial porá em causa estes mesmos princípios.
O semanário português Expresso desta semana escreve: “Aos comandos da Guiné Equatorial está, há 35 anos, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, considerado um dos piores ditadores africanos (…) É um país onde, segundo uma inspeção da ONU, a tortura é o meio normal de investigação, onde mutilações, violações, choques elétricos são prática comum, onde falta justiça, liberdade de expressão e informação e onde sobram execuções extrajudiciais e raptos pelo Governo. Obiang foi, à semelhança dos déspotas Idi Amin e Bokassa, acusado de praticar canibalismo contra inimigos”.
O que de pior se pode apontar aos mais mal governados países africanos (e não só) está presente na Guiné Equatorial: Má governo (78% com habitantes abaixo do limiar de pobreza não obstante o país ser um dos maiores produtores de petróleo de África, metade da população sem acesso a água potável ou eletricidade); corrupção generalizada, (o país foi incluído entre os 12 Estados mais corruptos do mundo); repressão e utilização da tortura; culto da personalidade (o presidente é chamado “Deus do país”); democracia de fachada (delegados eleitorais da oposição tiveram de assinar, com uma arma apontada à cabeça, o relatório da contagem oficial de votos nas últimas eleições).
É este país que os países lusófonos vão aceitar na organização e considerar membro de pleno direito?
Até agora, Portugal tinha uma posição “claramente negativa” sobre a adesão da Guiné-Equatorial à CPLP enquanto não fosse abolida a pena de morte, que existe naquele país. De fato, a Guiné Equatorial está longe de obedecer aos parâmetros democráticos, para além de a língua principal na Guiné Equatorial ser o castelhano e não o português (a língua de Camões foi imposta pelo presidente como segunda língua oficial em 2011, mas ninguém a fala).
Mas, no passado dia 20 de fevereiro, o ministro português dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, parece ter mudado de opinião. Segundo foi informado pelo próprio, a Guiné Equatorial terá aprovado “há três dias um instrumento legal que suspende a pena capital”.
A moratória sobre a pena de morte era uma das condições, para além da promoção do uso da língua portuguesa, para o ingresso da Guiné Equatorial, estabelecidas pela organização lusófona na cúpula de Luanda, em 2010.
O mais caricato é que a Guiné Equatorial não mudou a sua legislação para cumprir os critérios. A prometida democratização é uma miragem. Tudo se limitou, segundo o ministro Rui Machete, a “uma garantia solene feita pelas afirmações do ministro das Relações Exteriores da Guiné Equatorial na reunião de Maputo”, realizada no dia 20 deste mês.
Pelo visto, para aceitar um país despótico, basta a garantia oral de um dos seus ministros.
A questão, no entanto, tem uma explicação mais prosaica.
Uma empresa estatal da Guiné Equatorial vai investir 133 milhões de euros no Banif, um banco português em dificuldades, dirigido pelo ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amado. Pelo visto, a pressão diplomática para a entrada da Guiné Equatorial tem a ver com negócios e petróleo. Daí virá a súbita mudança de opinião do atual ministro português. Não importa a origem do dinheiro, é preciso que seja “injetado”. O governo português parece não ter resistido à força dos interesses económicos.
Aparentemente, os petro-Estados mandam mais hoje na CPLP do que mandavam em 1996.
Muitas vozes em Portugal dizem que a entrada da Guiné Equatorial na CPLP viola claramente as regras da organização em termos de liberdade, democracia e direitos humanos, sendo um desrespeito pelos povos que a organização representa.
O regime ditatorial de Teodoro Obiang precisa da CPLP para ter reconhecimento internacional. Não havendo outros motivos de credibilidade, esta pode ser comprada.
Nós, cidadãos, não nos conformamos com isso. Portugal deve utilizar o seu direito de veto e impedir que a Guiné Equatorial adira à CPLP, porque há princípios que unem os países lusófonos que não queremos que sejam postos à venda.
A opinião do autor pode não coincidir com a opinião da redação.
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