29.09.2012 - 11:47 Por Ana Gomes Ferreira
Cartazes da campanha do Chamomile Tea Party, criado pelo artista plástico e designer gráfico Jeff Gates para promover a civilidade do debate político nos EUA (DR)
Não disse. Nem poderia dizer. Os eleitores poriam em causa a sua sanidade mental. Mas já houve um tempo em que, nos Estados Unidos, valia tudo para deitar abaixo um opositor político, sobretudo nas campanhas para as presidenciais.
Não disse. Nem poderia dizer. Os eleitores poriam em causa a sua sanidade mental. Mas já houve um tempo em que, nos Estados Unidos, valia tudo para deitar abaixo um opositor político, sobretudo nas campanhas para as presidenciais. Em 1828, Andrew Jackson disse que o adversário, o general John Q. Adams, tinha comido 16 soldados e o episódio cheio de pormenores até foi publicado num jornal de Filadélfia.
A história ilustra uma evidência. As campanhas presidenciais americanas foram sempre sujas. Estão repletas de ataques à personalidade dos candidatos, à sua religião, à sua sexualidade, aos seus valores morais... Mesmo assim, de quatro em quatro anos, os media redigem textos, mais opinativos ou mais analíticos, sobre quão baixo desceu a campanha desse ano.
No dia 6 de Novembro, o actual residente da Casa Branca, Barack Obama (democrata), e Mitt Romney (republicano) vão a votos e um deles será Presidente. Na Fox News, uma estação de TV claramente pró-republicana, Bernard Goldberg perguntava "Esta é a campanha mais suja?", e respondia que sim por culpa de Obama. "É uma campanha onde a decência não é virtude e a atrocidade moral não é um vício. Não, se ajudarem Obama a ganhar a eleição."
No Detroit News, a pergunta é diferente: "Será esta a campanha mais malévola de sempre?". Os candidatos do passado, respondia o jornal, colocaram a fasquia tão baixa que já é difícil de perceber; aconselhava os eleitores a fecharem o nariz, especialmente no mês de Outubro, que é quando emerge o pior, sobretudo em anos como este, em que não é claro quem será o vencedor.
O mal já vem de trás, como explica o delicioso livro Anything for a Vote: Dirty Tricks, Cheap Shots, October Surprises in US Presidential Campaign, de Joseph Cummins. A capa mostra cartazes de propaganda política com frases como "Reagan é muito velho", "Dewey odeia-te e aos teus filhos", "Van Buren usa roupas de mulher", "Clinton aprendiz de embusteiro".
De George Washington a Obama, estão lá todos. Nem Abraham Lincoln (campanha de 1864) foi poupado, ouvindo do seu adversário George McClellan que não passava de um "babuíno bem intencionado".
John Adams disse aos eleitores que Thomas Jefferson iria queimar todas as Bíblias e legalizar a prostituição se fosse eleito. Em 1834, James Blaine popularizou um slogan sobre um suposto filho ilegítimo de Grover Cleveland ("Ma, Ma, where's my Pa"). Em 1928, Herbert Hoover lançou o medo ao dizer aos americanos que Al Smith, um católico, tinha um túnel ligando os EUA ao Vaticano para que o Papa pudesse governar o país. Já em 1936 David Crockett disse que Martin Van Buren usava lingerie feminina, em concreto corpetes rendados.
Jefferson versus Adams
"As campanhas negativas nos Estados Unidos já podem ser detectadas na disputa entre John Adams e Thomas Jefferson. Em 1776, este duo dinâmico juntou forças para produzir cartazes que exigiam a independência da América, e tinham respeito e amizade um pelo outro. Em 1800, as políticas partidárias tinham-nos afastado tanto que, pela primeira vez na História dos EUA, um Presidente deu consigo a concorrer contra o seu vice-presidente", escreveu na revista online mental_floss Kerwin Swint, professor de Ciência Política e autor do livro Mudslingers: The 25 Dirtiest Political Campaigns of All Time.
"Rapidamente, as coisas ficaram feias. O campo de Jefferson acusou o Presidente Adams de ter um 'odioso carácter hermafrodítico, alguém que não tem a força e a firmeza de um homem, nem a gentileza e a sensibilidade de uma mulher'", explicava Swint. Adams respondeu que o ex-amigo era um "mesquinho, o filho de uma mãe meio índia e de um pai mulato".
O que se passou agora, no ano de 2012, foi diferente. O lado de Obama acusou Romney de não ter pago impostos durante dez anos. O lado de Romney tentou reavivar a polémica do nascimento do Presidente (se nasceu no Quénia, então não pode ser chefe de Estado). O mundo mudou e os Estados Unidos evoluíram, e seria inaceitável, para os eleitores, que Romney fosse atacado por ser de religião mórmon ou que houvesse referências raciais sobre o democrata. Não havendo pecadilhos extramatrimoniais (como aconteceu a Bill Clinton e Michael Dukakis), ou problemas ligados ao envelhecimento (Bob Dole sofria de disfunção sexual devido a cancro na próstata) para esborratar a imagem do adversário, os estrategas das campanhas voltaram-se, com grande ferocidade, para outro lado: vincar de forma inequívoca que Obama e Romney pertencem a dois mundos diferentes.A polarização política, que começou assim que Obama - eleito no ideal do Yes we can, querendo isto dizer governar em comunhão com os dois pólos políticos para bem do povo - tomou posse e os democratas perderam a maioria no Congresso, radicalizou-se ainda mais na campanha, soltando toda a raiva.
O ódio motiva
Dizem os dicionários políticos que a "campanha negativa" se aplica quando um candidato ataca e critica o adversário. Por oposição, "campanha positiva" é aquela em que o candidato centra a sua propaganda política - na forma de cartazes, de intervenções públicas ou de anúncios televisivos ou na rádio, um costume americano - nas suas próprias qualidades. Usar a negatividade, explicou Dean Michael, da Universidade Católica DePaul (em Chicago), ao New York Times, tornou-se quase uma inevitabilidade quando os estrategas perceberam que ela excita os apoiantes, transformando-os em eleitores de facto. Ou seja, um apoiante galvanizado pelo podre do "inimigo" está comprometido em fazer eleger o seu candidato. Os indiferentes, esses, ficam em casa, não votam. "O objectivo é, pois, mobilizar a maior parte dos apoiantes e garantir que são esses que vão às urnas", defende Dean Michaels.
Quem começou primeiro? Cada campo acusa o outro. Um anúncio televisivo de Obama ficava a uma curta distância de dizer que Romney foge aos impostos - "Ficamos a pensar se ele alguma vez os pagou". A equipa Romney arrasou todas as políticas de Obama: não criou emprego, foi fraco com os aliados tradicionais da América, centralizou e expandiu o Governo ao ponto de os EUA começarem a parecer a Suécia. "Se nos ficássemos perante o massacre a que estávamos a ser sujeitos, a nossa gente não ficaria satisfeita. São muito poucos os que dizem que devíamos ignorar os ataques", disse ao Times David Axelrod, um dos mais conhecidos estrategas democratas.
Desde Abril, Obama emitiu anúncios negativos sobre Romney mais de 120 mil vezes; Romney emitiu mais de 52 mil. Os dois dizem que o outro está a fazer uma campanha impensável. Obama: "A campanha está imersa em negatividade". Romney: "O Presidente está a fazer isto bater muito fundo".
Que lugar terá esta campanha no top das mais sujas da História política americana? Há que deixar passar o tempo, mas dificilmente destronará a que é unanimemente considerada a pior de todas pelos historiadores e que opôs, em 1970, dois democratas em luta pelo lugar de candidatos a governador do Alabama. No livro Mudslingers: The Top 25 Negative Political Campaigns of All Time (1800-2004), Kerwin C. Swint também lhe dá o primeiro lugar e classifica-a como "a última campanha racista" do país. George Wallace combateu Albert Brewer com racismo, manipulação de fotografias, traição e suspeitas familiares. O populista e segregacionista Wallace ganhou.
A história ilustra uma evidência. As campanhas presidenciais americanas foram sempre sujas. Estão repletas de ataques à personalidade dos candidatos, à sua religião, à sua sexualidade, aos seus valores morais... Mesmo assim, de quatro em quatro anos, os media redigem textos, mais opinativos ou mais analíticos, sobre quão baixo desceu a campanha desse ano.
No dia 6 de Novembro, o actual residente da Casa Branca, Barack Obama (democrata), e Mitt Romney (republicano) vão a votos e um deles será Presidente. Na Fox News, uma estação de TV claramente pró-republicana, Bernard Goldberg perguntava "Esta é a campanha mais suja?", e respondia que sim por culpa de Obama. "É uma campanha onde a decência não é virtude e a atrocidade moral não é um vício. Não, se ajudarem Obama a ganhar a eleição."
No Detroit News, a pergunta é diferente: "Será esta a campanha mais malévola de sempre?". Os candidatos do passado, respondia o jornal, colocaram a fasquia tão baixa que já é difícil de perceber; aconselhava os eleitores a fecharem o nariz, especialmente no mês de Outubro, que é quando emerge o pior, sobretudo em anos como este, em que não é claro quem será o vencedor.
O mal já vem de trás, como explica o delicioso livro Anything for a Vote: Dirty Tricks, Cheap Shots, October Surprises in US Presidential Campaign, de Joseph Cummins. A capa mostra cartazes de propaganda política com frases como "Reagan é muito velho", "Dewey odeia-te e aos teus filhos", "Van Buren usa roupas de mulher", "Clinton aprendiz de embusteiro".
De George Washington a Obama, estão lá todos. Nem Abraham Lincoln (campanha de 1864) foi poupado, ouvindo do seu adversário George McClellan que não passava de um "babuíno bem intencionado".
John Adams disse aos eleitores que Thomas Jefferson iria queimar todas as Bíblias e legalizar a prostituição se fosse eleito. Em 1834, James Blaine popularizou um slogan sobre um suposto filho ilegítimo de Grover Cleveland ("Ma, Ma, where's my Pa"). Em 1928, Herbert Hoover lançou o medo ao dizer aos americanos que Al Smith, um católico, tinha um túnel ligando os EUA ao Vaticano para que o Papa pudesse governar o país. Já em 1936 David Crockett disse que Martin Van Buren usava lingerie feminina, em concreto corpetes rendados.
Jefferson versus Adams
"As campanhas negativas nos Estados Unidos já podem ser detectadas na disputa entre John Adams e Thomas Jefferson. Em 1776, este duo dinâmico juntou forças para produzir cartazes que exigiam a independência da América, e tinham respeito e amizade um pelo outro. Em 1800, as políticas partidárias tinham-nos afastado tanto que, pela primeira vez na História dos EUA, um Presidente deu consigo a concorrer contra o seu vice-presidente", escreveu na revista online mental_floss Kerwin Swint, professor de Ciência Política e autor do livro Mudslingers: The 25 Dirtiest Political Campaigns of All Time.
"Rapidamente, as coisas ficaram feias. O campo de Jefferson acusou o Presidente Adams de ter um 'odioso carácter hermafrodítico, alguém que não tem a força e a firmeza de um homem, nem a gentileza e a sensibilidade de uma mulher'", explicava Swint. Adams respondeu que o ex-amigo era um "mesquinho, o filho de uma mãe meio índia e de um pai mulato".
O que se passou agora, no ano de 2012, foi diferente. O lado de Obama acusou Romney de não ter pago impostos durante dez anos. O lado de Romney tentou reavivar a polémica do nascimento do Presidente (se nasceu no Quénia, então não pode ser chefe de Estado). O mundo mudou e os Estados Unidos evoluíram, e seria inaceitável, para os eleitores, que Romney fosse atacado por ser de religião mórmon ou que houvesse referências raciais sobre o democrata. Não havendo pecadilhos extramatrimoniais (como aconteceu a Bill Clinton e Michael Dukakis), ou problemas ligados ao envelhecimento (Bob Dole sofria de disfunção sexual devido a cancro na próstata) para esborratar a imagem do adversário, os estrategas das campanhas voltaram-se, com grande ferocidade, para outro lado: vincar de forma inequívoca que Obama e Romney pertencem a dois mundos diferentes.A polarização política, que começou assim que Obama - eleito no ideal do Yes we can, querendo isto dizer governar em comunhão com os dois pólos políticos para bem do povo - tomou posse e os democratas perderam a maioria no Congresso, radicalizou-se ainda mais na campanha, soltando toda a raiva.
O ódio motiva
Dizem os dicionários políticos que a "campanha negativa" se aplica quando um candidato ataca e critica o adversário. Por oposição, "campanha positiva" é aquela em que o candidato centra a sua propaganda política - na forma de cartazes, de intervenções públicas ou de anúncios televisivos ou na rádio, um costume americano - nas suas próprias qualidades. Usar a negatividade, explicou Dean Michael, da Universidade Católica DePaul (em Chicago), ao New York Times, tornou-se quase uma inevitabilidade quando os estrategas perceberam que ela excita os apoiantes, transformando-os em eleitores de facto. Ou seja, um apoiante galvanizado pelo podre do "inimigo" está comprometido em fazer eleger o seu candidato. Os indiferentes, esses, ficam em casa, não votam. "O objectivo é, pois, mobilizar a maior parte dos apoiantes e garantir que são esses que vão às urnas", defende Dean Michaels.
Quem começou primeiro? Cada campo acusa o outro. Um anúncio televisivo de Obama ficava a uma curta distância de dizer que Romney foge aos impostos - "Ficamos a pensar se ele alguma vez os pagou". A equipa Romney arrasou todas as políticas de Obama: não criou emprego, foi fraco com os aliados tradicionais da América, centralizou e expandiu o Governo ao ponto de os EUA começarem a parecer a Suécia. "Se nos ficássemos perante o massacre a que estávamos a ser sujeitos, a nossa gente não ficaria satisfeita. São muito poucos os que dizem que devíamos ignorar os ataques", disse ao Times David Axelrod, um dos mais conhecidos estrategas democratas.
Desde Abril, Obama emitiu anúncios negativos sobre Romney mais de 120 mil vezes; Romney emitiu mais de 52 mil. Os dois dizem que o outro está a fazer uma campanha impensável. Obama: "A campanha está imersa em negatividade". Romney: "O Presidente está a fazer isto bater muito fundo".
Que lugar terá esta campanha no top das mais sujas da História política americana? Há que deixar passar o tempo, mas dificilmente destronará a que é unanimemente considerada a pior de todas pelos historiadores e que opôs, em 1970, dois democratas em luta pelo lugar de candidatos a governador do Alabama. No livro Mudslingers: The Top 25 Negative Political Campaigns of All Time (1800-2004), Kerwin C. Swint também lhe dá o primeiro lugar e classifica-a como "a última campanha racista" do país. George Wallace combateu Albert Brewer com racismo, manipulação de fotografias, traição e suspeitas familiares. O populista e segregacionista Wallace ganhou.
The 1999 edition of the Encyclopaedia Britannica quoted some fascinating
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