O novo “Chiango” dos opinadores
O que antes era um cenário de repressão física, como em Chiango, onde as pernas dos críticos eram quebradas por homens “desconhecidos”, agora assume novas formas no universo digital. Hoje, o mural do Facebook transformou-se num campo de batalha onde a mutilação é simbólica, mas igualmente brutal como a exercida pela PRM. Em minutos, opiniões divergentes das narrativas dominantes são alvo de ataques ferozes, que convertem a timeline num “Chiango virtual”, que trucida o direito de pensar diferente.
Nas redes, a postura de muitos assemelha-se às tácticas repressivas da Unidade de Intervenção Rápida (UIR): ideias são bombardeadas como manifestantes atingidos por gás lacrimogéneo em protestos pacíficos. Os argumentos, por mais ponderados, acabam “entulhados no chão de um Mahindra digital, usados como apoio para as botas de quem veste o manto de moralidade absoluta. Divergir é arriscar-se a acusações de apoiar fraudes, de cumplicidade com o sistema ou de ingenuidade estratégica. O direito de questionar foi sequestrado por uma mentalidade repressiva que confunde crítica com traição e dissenso com desordem.
Nos debates online, as palavras assumem o papel de balas de borracha. Elas ferem, marcam, deslegitimam e, em alguns casos, silenciam. Basta questionar uma estratégia ou apontar inconsistências para ser atingido por disparos de intolerância: “Apoias a fraude?”, “Estás com medo de perder privilégios?”, “És cúmplice do regime?”. Essa pressão é tão intensa quanto a força física que uma viatura da PRM pode exercer sobre um manifestante em fuga. A pressão é implacável: a discussão se desvia do mérito das ideias para se focar em adjectivações gratuitas.
Nas redes, o direito de opinar foi atropelado por este “Chiango digital”. Agora, é obrigatório denunciar fraudes, adoptar discursos moralistas e celebrar qualquer discurso opositor, independentemente das suas falhas. Quem ousa não aderir é arrastado ao tribunal virtual, onde a sentença já vem pronta: “imoral”, “cúmplice” ou “ingénuo”.
Assim como exigimos que as instituições de segurança protejam os direitos dos cidadãos, o debate digital precisa se transformar num espaço de construção colectiva e respeito mútuo. Não podemos aceitar que “balas ideológicas” e “gás lacrimogéneo textual” continuem a sufocar o direito de criticar, questionar e propor alternativas. A mudança real não será fruto de intolerância ou linchamentos virtuais, mas da aceitação de que o pensamento diferente é não só válido, mas essencial para um país verdadeiramente de todos. E aqui temos algo que a UIR não possui: o desejo de ter um país onde direitos são mesmo direitos.
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73Tu, Elisio Macamo e a 71 outras pessoas38 comentários
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Emidio Beula
Texto profundo e ao mesmo tempo hilariante... De facto, o debate público está perigosamente polarizado. Tempos difíceis estes...
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Xiconhoca Mbutti
Infelizmente é a triste realidade
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Zé Martins
Uma vez mais extremamente assertivo, e acertado
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Filho da Patria
Rui Miguel Lamarques. A tua analogia é poderosa, pois demonstra como as boas intenções, quando acompanhadas de intolerância e ausência de autocrítica, podem ser tão ou mais destrutivas quanto o mal deliberado. Como bem exposto, o contrário do bem não é necessariamente o mal, mas sim aquilo que é feito com boas intenções sem reflexão ou abertura para o contraditório, pois isso reprime a diversidade e liberdade de pensamento.
O verdadeiro progresso exige mais do que indignação: requer empatia, escuta e respeito à pluralidade.
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Reginaldo Ernesto Massango
Passa muito tempo e o texto tem poucas reacções se comparado aos anteriores. Isto pode estar a denunciar algo, que ao expor esse lado que muitos convencionaram ignorar, tenha saído do " gostinho" dos maus do bem. Deveras preocupante e perigoso o estágio a que se chegou. Infelizmente, estamos prestes a replicar Hotel Ruanda.
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Edgar Barroso
Boa chamada de atenção. Mas eu ainda acho que os exemplos é que parecem ainda nebulosos. Há várias realidades em Moz, que estão a acontecer de forma concomitante. Uma delas, na vida real, são as manifestações e a contra-resposta governamental (sempre desproporcional e abusiva). Outra, no mundo digital, são as reacções tanto às manifestações como à repressão (e parece ser esta última o objecto de análise deste post). Pelo que li e percebi, o Rui Miguel Lamarques está a usar exemplos de uma realidade (real, passe a redundância) para fundamentar outra realidade (virtual), com autores diferentes: na "realidade real", a brutalidade das forças de defesa e segurança está a ser usada, nesta análise do Rui, para dizer que na "realidade virtual" as opiniões críticas ao "modus fazendus" das manifestações estão a ser brutalmente reprimidas pelos apoiantes das manifestações.
Se o meu entendimento estiver certo, isso é intelectualmente desonesto. Se eu estiver errado, peço que o Rui me elucide.
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Rui Miguel Lamarques
Edgar Barroso, a analogia feita no texto entre a repressão policial e a repressão nas redes sociais não visa equiparar as duas realidades de forma literal. A ideia central é destacar que, em ambos os casos, há uma tentativa de silenciar opiniões divergentes, seja pela violência física (como acontece nas manifestações) ou pela violência simbólica (observada nos debates online, de qualquer dos lados). Em nenhum momento a intenção foi sugerir que os apoiantes das manifestações utilizam as mesmas tácticas de repressão do executivo. Em vez disso, o tento mostrar uma dinâmica mais ampla de intolerância que está presente em diferentes formas de debate e interação (admito que possa ter falhado nisso, se essa for a sua compreensão).
Talvez, pela forma como a metáfora foi construída, tenha ficado a impressão de que estou a comparar directamente as manifestações físicas com as discussões digitais. Contudo, o objectivo era apenas ilustrar como a repressão, de qualquer forma que seja, prejudica o debate saudável. A repressão digital não minimiza a gravidade das manifestações físicas nem a resposta abusiva das forças de defesa e segurança; pelo contrário, apenas destaca uma outra dimensão do problema, que é a repressão ideológica nas plataformas digitais.
Acredito que estejas certo ao observar que Moçambique vive realidades complexas e múltiplas, e talvez o texto precise deixar mais claro que se está a falar de uma questão específica - a repressão no mundo digital. Reconhecer a diferença entre essas realidades é importante para que a análise não se perca em generalizações. A repressão no “mundo real” tem consequências muito mais directas e graves, e não deve ser subestimada. Contudo, a repressão virtual também tem um impacto profundo na qualidade do debate público.
Por fim, talvez eu tenha limitações cognitivas profundas, mas não estou a ser desonesto na minha percepção, pois trata-se do meu entendimento sem nenhuma espécie de benefício.
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Fernando Costa
Rui Miguel Lamarques só que numa realidade no fim restam corpos frios e o silêncio. Na outra realidade ficam apenas opiniões. Nem sequer um arranhão
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Edgar Barroso
Rui Miguel Lamarques thanks. Tanto por explicar como por ilustrar como se está numa sociedade altamente polarizada nos dois mundos. Por mim, eu penso que cada realidade (real e virtual) tem as suas especificidades. No mundo real, estão a morrer pessoas (e outras tantas são feridas). No mundo virtual, trocam-se ideias (ainda sem vítimas, até onde sei). Pelo que dizes no post, no mundo real as maiores vítimas são os manifestantes; no mundo digital, são os opinadores que criticam as manifestações as maiores vítimas. O que eu apontei como desonestidade intelectual é o uso da intolerância letal no mundo real (feita sobretudo pelas forças de defesa e segurança contra os manifestantes) como igual à intolerância verbal no mundo digital (feita pelos que combatem as vozes críticas ao modelo de manifestações em curso).
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Helder Bacar
Rui Miguel Lamarques tens muita razão em relação a parte de ataques desenfreado contra quem não está na "causa". Realmente a maioria está pautar pelo extremismo e isso pode semear o ódio na sociedade. Mas discordo da narrativa comparativa disso em relação às balas de borracha, gás lacrimogéneo e assassinatos. Não podes comparar a perda duma vida com qualquer outra coisa. A vida não tem preço e nem compara com qualquer outra coisa ou situação.
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Rui Miguel Lamarques
Helder Bacar, podes ver a resposta ao Edgar Barroso no comentário acima. Pode ter ficado a impressão da comparação, mas não foi essa a intenção.
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Mukilina Soares
Acertado.
Roubei e partilhei.
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Júlio Mutisse
Há quase dois meses que me auto acantonei depois que percebi este cenário.
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Júlio Mutisse respondeu
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há 2 horas
Zito Ossumane
Vi o seu artigo republicado na MBC TV e julguei correctamente que encontraria aqui também. Queria começar a minha intervenção com desonestidade "mas e malta Dercio e numsequê", não faz sentido como é óbvio. As pessoas não nascem más, tornam-se! O sistema ensinou e bem, acadêmicos, criadores de conteúdos e por ai segue, quem não alinhar será trucidado. O povo apropriou-se do modus operandi do G40
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Rui Miguel Lamarques
Zito Ossumane, bandidinho.
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Zito Ossumane
Rui Miguel Lamarques novamente, tive mestres.
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Bitone Viage
Zito Ossumane o próprio instigador do ódio digital, o Patrono da intolerância digital.
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Rui Miguel Lamarques
Zito Ossumane, viste o que Bitone acaba de escrever? Vais deixar assim mesmo?
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Zito Ossumane
Rui Miguel Lamarques há estudos que comprovam que a senilidade em raras ocasiões atinge jovens da faixa etária do Bitone Viage . Essas alterações mentais só podem encontrar justificação lógica nesse quadro.
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Zito Ossumane
Bitone Viage você fala uma quantidade incrível de NADA!
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Benício Da Cruz Baulo
Infelizmente, estamos a entrar perigosamente em "terreno pantanoso". Os que defendem o actual regime, tentam ao máximo diabolizar os seus opositores, por sua vez, os " revolucionários", se auto intitulam de imaculados, em que nenhuma ação deles deve ser motivo de análise e crítica e deste modo caminhamos perigosamente para uma sociedade polarizada e extremista!
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Arao Lurio Nualane Nualane
Uma escrita genuinamente lamarquiana que traz um debate profundo.
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Mario Fiosse
Isto está mal! Dei minha opinião no mural de alguém bastante envolvido nestas manifestações, no sentido de que os dias fossem reduzidos para permitir para quem vive da rua para se alimentar, ganho algum para seu sustento ou adoptar-se o modelo que Manuel Araújo em que as manifestações acontecem depois das 15 horas. Mas infelizmente recebi uma resposta carregada de tanta intolerância.
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Nanwara Sottala Timiiva
O asfixiamento de opiniões, o emudecimento das vozes como as de Elvino Dias, Paulo Guambe, Cistac, etc., que desapareceram cruelmente com os seus donos e a repressão dos manifestantes à paisana com recurso a armas de fogo constituem uma brutalidade tamanha de homens que nos são conhecidos e têm o escudo da FRELIMO e violam os Direitos Fundamentais consagrados na própria Constituição.
O direito à greve/manifestação é posterior o direito à vida que também é inalienável e se este direito constitucional é reprimido pelos polícias então surge o da resistência e que, no Estado déspota que temos, sempre é desproporcional e a força policial opressora se sobrepõe as liberdades dos cidadãos. Os cidadãos são vistos como escórias, vândalos e que, em todo caso, devem ser eliminados por ameaça a aristocracia frelimista.
A isto, como manifestantes, nos opomos. A Lei e Constituição não podem sujeitar-se às vontades arbitrárias de uma força partidária. É isso que milhares de manifestantes combatem. É uma luta digna e justa.
Quanto à realidade virtual que mencionas torna-se frágil a tua argumentação. O Facebook e os murais de milhares de usuários constituem um ciberespaço de emissão de opiniões sem uma arma apontada sobre a cabeça de ninguém, sem um risco imediato de morte e gás lacrimogéneo não obstante a caçada dos homens contrários ao regime do dia. Isso é que é ditadura, aliás, as mensagens críticas ao teu apoio nunca te farão esconder-se dos esquadrões da morte: os carrascos à banho de sangue que mantêm este Governo de sanguessugas em dia.
O problema não é emitir uma opinião e/ou dialogar reflexivamente mas apoiar um regime ditador e que mata arbitrariamente e rasgou a Constituição merece uma chuva de críticas sim e é um pró regime, e consequentemente, inimigo do povo.
Os privilégios, o desejo de promoção e o medo de perder o pão conduzem aos que negam os outros as liberdades de opinião e manifestação teçam argumentos de vitimização e distorção da causa justa da qual o povo milita. Isso levanta sentimentos de raiva e, por conseguinte, há comentários de DESCRIÇÃO.
DESCRIÇÃO não é uma postura e nem táctica repressiva, mas é a exposição dos pró-regime que trucidam as liberdades e açambarcaram a economia para andarem à farta, gordos e com a família exibindo-se, com uma fotografia de qualidade, nas redes sociais. Que medo de todo esse castelo desmoronar em prol do povo!
Carrascos do povo...!
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Rui Miguel Lamarques
Nanwara Sottala Timiiva, o seu comentário traz à tona pontos cruciais sobre a repressão em Moçambique, quando destaca a brutalidade contra os manifestantes, como as mortes causadas pelos homens do BR e a asfixia das vozes críticas no país. Concordo com a crítica à repressão política, especialmente no que diz respeito ao uso abusivo da força pelas autoridades contra os cidadãos que procuram expressar o seu descontentamento, o que é uma violação directa dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição. É um contraste gritante, uma vez que, como você mesmo sugere, o direito à manifestação e à greve deveria ser reconhecido como um direito inalienável, imediatamente após o direito à vida. A luta pela liberdade de expressão e os direitos dos cidadãos são, sem dúvida, justas e dignas. Em relação à parte que menciona a “realidade virtual”, entendo a sua preocupação e reconheço que a situação online é, de facto, muito menos dramática, já que não envolve a violência física directa, como nas manifestações. Contudo, o ponto que tento destacar é que, embora não existam armas apontadas nas discussões digitais, existe uma forma de repressão simbólica e psicológica nas redes sociais. Essa “repressão digital” pode não ter o mesmo impacto imediato de uma repressão das forças da lei e ordem, mas ainda assim afecta a liberdade de expressão, ao criar um ambiente onde qualquer discordância pode ser atacada de forma feroz e deslegitimada, muitas vezes por meio de linchamentos verbais e “censura social”.
Eu compreendo a sua crítica de que a verdadeira ditadura se reflecte na violência física e nas mortes causadas pelo regime, o que de facto coloca em perspectiva a comparação com os debates online. O que tento questionar é a intolerância e a falta de espaço para o debate honesto em ambos os contextos, o físico e o digital. A luta pela liberdade de opinião, tanto no mundo real quanto no virtual, precisa ser defendida, sem que isso signifique ignorar a gravidade da repressão física, que é, sem dúvida, um problema mais urgente. Por fim, entendo que a crítica ao regime seja uma expressão legítima de indignação diante das violências cometidas, e concordo que o apoio a um regime opressor deve ser amplamente questionado. Porém, acredito que a construção de um diálogo saudável, tanto no mundo real quanto nas redes sociais, exige uma abertura para discutir sem reducionismos. A verdadeira mudança depende da capacidade de ouvir, respeitar e desafiar as opiniões, sem recorrer a acusações e julgamentos precipitados, em qualquer esfera.
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Nanwara Sottala Timiiva
Rui Miguel Lamarques Grato pelo esclarecimento!
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Ernesto Nhanale
Muito bem colocado: é terrivel que as pessoas devem se alinhar de uma certa forma, sob pena de se tornar alvos. Muito mau!
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