quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Aprender do Brasil

Aprender do Brasil
Estou feliz com a soltura de Lula. Ele fez um tipo de política que prometia corrigir os desequilíbrios estruturais e históricos que impediam o país de realizar o seu potencial. Entendeu melhor que nenhum outro político brasileiro que a igualdade de oportunidades era a chave para isso.
Não previu, nem podia saber, que o sucesso dessa campanha iria depender do cultivo duma postura política cívica que comprometesse aqueles cuja vida ficava melhor com o ideal da igualdade de oportunidades.
Nāo previu, nem podia saber, que o sucesso dessa campanha iria depender do cultivo duma postura política crítica que não reduzisse problemas complexos à simples equação da corrupção.
Nāo previu, nem podia saber, que o sucesso dessa campanha iria depender do cultivo duma postura intelectual hostil à complacência.
Lula está livre (por enquanto), mas não está inocente. Não está inocente (embora seja) porque existe um grande equívoco na política brasileira. Esse equívoco é a ideia de que a corrupção explica os problemas do país. É esse equívoco que viabilizou - e vai continuar a viabilizar e legitimar - a perversão da justiça naquele país.
Historicamente, a luta contra a corrupção foi sempre usada por políticos oportunistas, cidadãos perplexos e pseudo-intelectuais como argumento para resistir à mudança, proteger o privilégio e dissimular dificuldades na abordagem de problemas complexos. Não existe regime autoritário no mundo que não tenha justificado a tomada de poder, ou o apego ao poder, pela necessidade de combater a corrupção.
Nāo existe nenhuma democracia liberal que se tenha legitimado pela luta contra a corrupção. E isso não é por não haver corrupção nessas democracias. É porque lá se sabe que o moralismo não constitui boa base para construir uma sociedade. Muita moral só produz autocracias religiosas ao estilo do Irão.
A Pérola do Índico está cheia de pequenos Ayatolahs que usam o discurso da luta contra a corrupção para atolar o País num moralismo que vai comprometer seriamente a nossa liberdade. A justiça será um expediente político que vai ser usado para criminalizar a vida. A indignação vai paralisar a iniciativa, sufocar a criatividade, premiar a incompetência e promover o vazio de ideias como virtudes dignas de crédito. Enquanto os outros vão caminhar rumo ao progresso, nós vamos ficar reféns de moralistas que não fazem absolutamente nenhuma ideia dos problemas que o País enfrenta, mas estão convencidos do contrário.
Se você é moze e festeja a soltura de Lula porque acha que justiça foi feita, você muito provavelmente não entende o que está em jogo. A perversão da justiça é funcional à luta contra a corrupção. O problema é esta última, não é a justiça. Ou você é incoerente, ou você não entende muita coisa. Prender Lula sem provas não foi um excesso. É o desfecho lógico da luta contra a corrupção.
A luta contra a corrupção é a versão moderna da caça às bruxas. Se você quer o bem de Moz, pense nisso e deixe de repetir slogans.
Comentários
  • Tony Bambo Caro Professor,
    O grande problema de Mpz. Situa-se na visao qie se tem sobre temss transversais qie a grande e complexa média sempre traz e que sem as necessárias e devidas ferramentas, todo mundo acha que pode pronunciar-se
    Ê facil e de pronto s
    e aponta p corrupto. Mas quem ê o corruptor e o que pretendia ao aliciar o corrompido. Este e e será sempre o cerne da questão. A corrupção e um instrumento perverso instalado para criar incertezas e usar a desconfiança como arma politica. As escutas e demais meios de obtenc de provas, nao serão uma violação da privacidade dos visados. E qiase tudo manipulação.
  • Pedro Comissario Muito ousado, intelectualmente!
  • Luzia Moniz A luta contra a corrupção como a moderna caça às bruxas. Aqui cabe tanta coisa de Angola a África do Sul, passando por todo o lado. Ah! Ngana Nzambi...
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  • Adulai Baldé Mestre, acho que não se combate à corrupção violando a constituição. É preciso muito cuidado nessas horas.
    • Elisio Macamo Adulai Baldé, o problema está aí. é inevitável. as irregularidades processuais nāo são um excesso. fazem parte dessa luta. é por isso que muita gente diz “bom, se violando a constituição a gente mete os ladrões na cadeia, então que seja”. é tudo parte dessa lógica dos fins que justificam os meios.
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    • Adulai Baldé Elisio Macamo por esse ângulo, faz sentido Mestre.
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  • Dioclécio Ricardo David Professor Elisio, assumo o risco e as inerentes consequências de (se calhar) não perceber muito bem o sentido e o alcance da sua reiterada chamada de atenção ao empolamento do discurso da luta contra a corrupção como pretensa fórmula mágica para viabilização do desenvolvimento de um país. Nesse sentido, permita-me, se faz favor, umas questões: (i) a corrupção no sector público e privado é ou não um empecilho para a viabilização do potencial de um Estado?
    (ii) a corrupção deve ou não ser implacavelmente combatida com o recurso a todos os meios formais e materiais à disposição das instituições competentes?
    (iii) qual seria a melhor abordagem pública, seja dos políticos ou mesmo da sociedade civil, do fenómeno corrupção?
    (iv) a corrupção não será um dos piores crimes que um servidor público pode cometer no exercício das suas funções?
    Muito obrigado.
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    • Elisio Macamo Dioclécio Ricardo David, nāo sei o que lhe responder. tenho vários textos que abordam este assunto, alguns até com propostas claras de como lidar com o problema. aconselho-o a investir algum tempo a ler esses textos. de qualquer maneira, o meu principal objectivo não é convencer, mas sim encorajar a reflectir melhor sobre o assunto. o meu ponto de partida básico é que a corrupção é um sintoma, não é a causa da ausência de desenvolvimento. é como a tosse. não é a causa da tuberculose e até pode ter uma outra causa e, em certas circunstâncias, ser boa coisa. por exemplo, quando você está para ter um avc tossir ajuda... agora, directamente às questões: (i) acho que não é, ou melhor depende; (ii) acho que não, isso é o mesmo que combater implacavelmente a tosse; (iii) não existe melhor abordagem para um problema fictício; o desafio em moz é trabalhar no sentido dum aparelho de estado cada vez mais funcional; isso faz-se reforçando-se a cidadania, não criminalizando a vida; (iv) não, não é. esse termo é demasiado vago . conforme disse, há vários tipos de tosse. não se esqueça: a luta contra a corrupção é típica de regimes autoritários. um dos poucos regimes democráticos que fez isso, a itália (mais contra a influência do crime organizado na política), lixou-se e está hoje de rastos e a braços com demagogos de toda a espécie.
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    • Dioclécio Ricardo David Professor Elisio, muito obrigado.
      Cpts.
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  • Augusto Ferdinando Só para lembrar que o LULA NÃO ESTÁ LIVRE, MAS SIM, ESTÁ SOLTO.
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    • Elisio Macamo Augusto Ferdinando, receio que esteja a confundir os termos. ele está livre porque foi solto. não foi inocentado, mas pelas graves irregularidades processuais isso é o que devia ser feito. penso que ele pode andar de cabeça erguida se tomarmos em conta que existe muita gente, incluindo o presidente actual do brasil e seus filhos, mas também o ministro da justiça que já deviam também ter sido processados por vários crimes de que são acusados ou são suspeitos. aqui onde vivo, na suíça, seria impensável que um ministro da justiça que claramente perverteu a justiça continuasse no cargo. demitir-se era o mínimo que ele podia fazer para salvaguardar a reputação do judiciário brasileiro. mas parece claro que ele não entende muito de decência, pois o facto de ter julgado um potencial candidato presidencial impedia-o, pelo respeito ao judiciário, de se juntar ao governo que “beneficiou” desse julgamento.
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    • Augusto Ferdinando Sr Professor, concordo que pode haver confusão dos termos. Homem livre não tem nenhum impedimento e limitações.
      Quanto ao quisito de decência, gostaria de convidar ao professor Elisio Macamo a reflectir no nosso sistema e a postura dos dirigentes que a
      pesar da distância nos une. Voltando ao Lula, ele foi condenado por crimes de lesar a economia brasileira e provado em sede do tribunal. Uma coincidência (Moro e Augusto Paulino) todos partiram dum ponto e terminaram no outro. Por tanto, a vida continua, as pessoas são as mesmas desde que não haja impedimento legal.
    • Elisio Macamo Augusto Ferdinando, não percebi a alusão ao juiz paulino. de qualquer maneira, a condenação de lula está em questão. não sou jurista, por isso não posso dizer se é ou não inocente. mas o processo não foi justo. isso torna a condenação problemática. acho que o Augusto Ferdinando tem a obrigação de suspender o juízo sobre a matéria.
    • Augusto Ferdinando Elisio Macamo professor, me rendo, 😀😃😄mas termino por dizer que o Lula teve 7 processos no inicio dos quais alguns concluidos e sentenciados, outros ainda na fase conclusiva só para constar que todos têm provas e ainda por juntar as provas. São o caso de Odebrecht, Petrobras, sítio de Atibaia, triplex de Guarujá e muito dinheiro drenado através de BNDS onde muitos países amigos comunistas se beneficiaram e tirado desonestamente ao povo brasileiro.
    • Elisio Macamo Augusto Ferdinando, que eu saiba, ele foi condenado por um caso apenas, o mesmo que está ferido de irregularidades. portanto, respeite a presunção de inocência.
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    • Augusto Ferdinando Elisio Macamo sim já foram julgados 2 processos dos quais 1 condenado à 12 anos e 1 mês e outro 12 anos e alguns meses e foi anulado anulado mais tarde. Ainda faltam 5 por serem concluidos.
    • Elisio Macamo Augusto Ferdinando, pois, um anulado. portanto, só um caso ferido de irregularidades e que, portanto, não permite ainda falar de culpado. mais uma vez, presunção de inocência, o estado de direito agradece.
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    • Augusto Ferdinando Elisio Macamo dos 2 processos julgado em ambos houve condenação, apenas um foi anulado mais tarde. Portanto no outro ainda continua réu provado em sede do tribunal.
    • Elisio Macamo Augusto Ferdinando, continua a gozar da presunção de inocência até a instância maior confirmar. o estado de direito é um conceito simples de entender. nem precisa de esforço.
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  • Pavel Mondlane Perfeito
  • Mário Maria Bobo Chartony Consegui ler...
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  • Pedro Guiliche Prender Lula sem provas pode também ser visto como demonstração da judicialização da política. Uma das últimas reflexões de Wanderley dos Santos, inspirada neste episódio deu origem a uma obra interessante que, à quem interessar o assunto, valerá a pena ler: “Democracia Impedida no Sec. XXI”.
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  • Celso Malavoloneke Professor Elisio Macamo. Magistral como sempre!...
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  • Libertação de Lula exige estratégia, não festa
    MIDIANINJA.ORG
    Libertação de Lula exige estratégia, não festa
    Libertação de Lula exige estratégia, não festa
  • Denise Dias Barros Mas estou em festa, nestes tempo todo sinal de esperança, mesmo que mortal, afasta a apatia, ascende chances de reação mais profunda e organizada... Estamos muito mortos-vivos
  • Antonio Gundana Jr. Li ontem um texto que circula no WhatsApp que faz uma analogia a caça do porco selvagem com a actuação dos governantes.

    Em suma, a ideia geral do texto era que do mesmo jeito que a caça ao porco selvagem vai sendo aos poucos e criam-se condições para 
    que se entregue por si mesmo ao matadouro, os governantes fazem o mesmo. Isto é, aos poucos vão criando condições para que o próprio povo se entregue ao "matadouro", principalmente pela democracia.

    A meu ver, textos assim não permitem uma reflexão profunda acerca do que consiste a democracia. Não permitem reflectir acerca da participação do cidadão no processo democrático. Coloca os governantes como sempre os "maus" da fita e as pessoas que os "criticam" como os "puritanos".

    Vamos cantando da "corrupção" e outros "males" enquanto não reflectimos sobre o país, a nossa política e nossa actuação nela. . .
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