sexta-feira, 19 de abril de 2019

Pais que acorrentaram 13 filhos condenados a prisão perpétua. Podem pedir liberdade condicional daqui a 25 anos


ATUALIZADO
Antes de ler a sentença, o juiz Bernard Schwartz lamentou o "tratamento egoísta, cruel e desumano" do casal Turpin. Alguns dos filhos prestaram declarações e desculparam os pais.
Louise e David Turpin terão de cumprir, no mínimo, 25 anos de prisão e só nessa altura poderão pedir liberdade condicional
É o fim de um dos mais escandalosos casos de abuso dos Estados Unidos da América. Os pais que acorrentaram os 13 filhos na própria casa, no estado da Califórnia, foram condenados esta sexta-feira a uma pena indefinida de 25 anos a prisão perpétua, pelos 14 crimes de que estavam acusados. Isto significa que Louise e David Turpin terão de cumprir, no mínimo, 25 anos de prisão e só nessa altura poderão pedir liberdade condicional — um pedido que poderá ser negado até ao final das suas vidas, cumprindo-se assim a prisão perpétua.
Antes de ler a sentença, o juiz Bernard Schwartz lamentou o “tratamento egoísta, cruel e desumano” que o casal Turpin deu aos filhos. E explicou que a única razão pela qual não aplicou uma pena de prisão perpétua — sem possibilidade de pedir liberdade condicional — foi porque os pais “aceitaram a responsabilidade pelos seus atos a tempo e pouparam os filhos de terem de reviver os danos naquela casa dos horrores“. Isto porque, ao se terem declarado culpados, o julgamento que estava marcado para 3 de setembro foi cancelado — medida prevista na justiça norte-americana e que permite aos arguidos confessarem os crimes, evitando desta forma um julgamento.
Antes de saberem a sua sentença, alguns dos 13 filhos do casal Turpin estiveram no tribunal de Riverside, onde fizeram discursos emotivos que deixaram os pais em lágrimas. Leram cartas em representação de todos os irmãos. A pedido dos mesmos, não puderam ser fotografados, mas as suas declarações foram gravadas em aúdio. Uma das filhas, Jane, foi a primeira a falar.
[Ouça as declarações de Jane, uma das filhas de Louise e David Turpin, em tribunal]
“Os meus pais roubaram-me a vida por completo, mas agora estou a recuperá-la de novo”, começou por dizer. Jane revelou que está a tirar um curso na universidade e “a viver de forma independente”. “Acredito que tudo acontece por uma razão. A vida pode ter sido má, mas tornou-me mais forte. Lutei para ser a pessoa que sou hoje”, disse Jane.
Vi o meu pai a mudar a minha mãe. Ele quase me mudou a mim. Mas eu percebi o que estava a acontecer e fiz o que pude para não me tornar como eles. Sou uma lutadora. Sou forte”, disse ainda.
Outra das filhas, Jessica, escreveu uma carta que foi lida por um dos irmãos. Nela, começa por agradecer aos pais por a terem “ensinado o que é Deus e a fé”. “Espero nunca perder a minha fé“, diz, fazendo uma pausa para segurar as lágrimas. “Rezo muito por eles [os irmãos]. Estou a ir bem. Estou a ir à universidade”, continuou. “Eu amo-vos e quero que saibam isso. Deus é tudo o que precisamos”, terminou.
Louise Turpin ouviu as declarações dos filhos em lágrimas
Outro dos filhos do casal também falou: “Não consigo descrever em palavras o que nós passámos. Às vezes, ainda tenho pesadelos com coisas que aconteceram, como os meus irmãos mais novos acorrentados e espancados”. O filho dos Turpin disse ainda que os amava e os desculpava por tudo o que fizeram. Revelou que aprendeu a andar de bicicleta e está a tirar um curso de engenharia informática. “Depois, vou arranjar um trabalho e estudar em part-time para turar um mestrado”, disse ainda.
Uma das filhas escreveu outra carta que foi lida em tribunal, onde defendia que 25 anos de prisão era “muito tempo”. “Eu acredito que os meus pais tentaram o máximo que conseguiram para nos dar uma boa vida”, disse, recordando as viagens à Disneyland, os Natais e aniversários. A filha fez ainda um apelo ao tribunal: que os colocassem num estabelecimento prisional perto deles para que os pudesse visitar.
David Turpin também ouviu as declarações dos filhos em tribunal (Foto: WILL_LESTER/AFP/Getty Images)
David Turpin tentou ler uma carta que tinha escrito, mas acabou por pedir à advogada que a lesse uma vez que estava muito emocionado. “Nunca tive intenções em causar danos aos meus filhos”, escreveu na carta onde lhes pede desculpa. “Peço desculpa por tudo o que fiz e por ter magoado os meus filhos. Amo tanto os meus filhos”, disse Louise Turpin no tribunal, lendo uma carta dirigida aos filhos, que também escreveu.
Uma das irmãs de Louise Turpin, Elizabeth Flores, esteve presente na sessão. “Não quero saber quantos anos eles apanham. Merecem o que apanharem. Quero é justiça para os meus sobrinhos e sobrinhas“, disse aos jornalistas à entrada. Flores foi quem escreveu o livro “Sisters of Secrets“, onde denuncia os anos de abuso que as três irmãs sofreram, por parte do avô, e as suspeitas em relação ao casal Turpin que foi acumulando ao longo dos anos.
O caso foi descoberto no início do ano de 2018 quando a filha de 17 anos, Jordan Turpin, salvou os outros 12 irmãos. Na madrugada de 14 de janeiro, a jovem conseguiu fugir e alcançar um telemóvel que encontrou em casa, através do qual ligou para a polícia.
Quando a polícia chegou à casa, foi este o cenário que encontrou: “Várias crianças acorrentadas às suas camas com correntes e cadeados, na escuridão e num ambiente com cheiros nauseabundos“, lia-se no comunicado emitido no dia seguinte. Todos os filhos, à exceção da menina mais nova, de 2 anos, estavam subnutridos. A vítima de 29 anos pesava 37 quilos. Uma das crianças de 12 anos tinha o peso de uma de 7.

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