01.04.2019 às 10h23
Relatório médico foi elaborado depois de o rei Salman ter dado autorização, alegadamente contra a vontade do príncipe herdeiro, Mohammed bin Salman, para examinar até 60 prisioneiros, na sua maioria mulheres, de um grupo de 200 que foram detidos durante a recente onda de repressão no país
Cortes, feridas, queimaduras e subnutrição. A lista não termina por aqui mas é uma boa síntese de um relatório sobre a detenção de prisioneiros políticos na Arábia Saudita pedido, ao que tudo indica, pelo rei saudita, Salman bin Abdelaziz, para uso interno, mas a que o “Guardian” teve acesso.
Nada disto soa a novidade, mas é a primeira vez que circula internamente um documento onde se prova que os prisioneiros políticos, homens e mulheres, têm sido alvo de inúmeros abusos físicos nas prisões na Arábia Saudita — algo que o regime saudita tem negado veementemente.
O relatório médico será entregue ao rei saudita com uma série de recomendações que vão desde um pedido de perdão a todos os prisioneiros até à libertação daqueles que se encontrem num estado de saúde mais débil, diz o “Guardian”, segundo o qual o documento foi elaborado depois de o rei Salman ter dado autorização, alegadamente contra a vontade do príncipe herdeiro, Mohammed bin Salman, para examinar até 60 prisioneiros, na sua maioria mulheres, de um grupo de 200 que foram detidos durante a recente onda de repressão no país.
Além do pedido de perdão e libertação dos prisioneiros detidos a partir de 2017 ou que tenham problemas de saúde graves, o relatório recomenda que todos aqueles que se encontram em regime de isolamento devem ser transferidos para uma ala médica urgentemente.
O regime saudita já foi questionado sobre as conclusões, mas ainda não se pronunciou sobre o assunto. Ao mesmo tempo, não foram levantadas quaisquer questões sobre a veracidade do documento. O jornal britânico diz ter conseguido cruzar dados sobre um dos exames realizados e confirmar a informação ali contida. Quantos aos restantes, são “consistentes com os relatórios que têm sido divulgados sobre as alegações de tortura”.
A pressão sobre a Arábia Saudita por causa das detenções e tratamento a que são submetidos os prisioneiros políticos tem sido cada vez maior, sobretudo depois do homicídio do jornalista saudita Jamal Khashoggi no consulado do seu país em Istambul, na Turquia, e de ter sido notícia que várias mulheres ativistas tinham sido alvo de choques elétricos e chicotadas em prisões.
ORGANIZAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS PEDE “LIBERTAÇÃO IMEDIATA DE TODOS OS ATIVISTAS”
Em resposta à notícia do “Guardian”, a organização não-governamental Human Rights Watch apelou à “libertação imediata de todos os ativistas de direitos humanos e dissidentes pacíficos”. Também convidou as organizações internacionais de monitorização dos direitos humanos no país a realizar uma investigação “transparente e abrangente”. “Os prisioneiros sauditas, incluindo mulheres ativistas, têm denunciado a crueldade de que têm sido vítimas às mãos das autoridades, que chegam aliás a recorrer a choques elétricos, chicotadas e abuso seuxal”, acrescentou uma porta-voz da organização.
Outro ativista, que não quis partilhar o seu nome com medo de retaliações, afirmou ao jornal britânico que as descrições contidas no relatório “são consistentes com as provas que têm sido obtidas pelos vários grupos de ativistas” que estão particularmente atentos ao tratamento dos detidos nas prisões sauditas.
Principais denúncias contidas no relatório a que o “Guardian” teve acesso:
— “O paciente apresenta uma grave perda de peso, com vómitos de sangue constantes. Foram observados vários ferimentos e cicatrizes em muitas partes do seu corpo. Também tem feridas no peito e nas costas, na zona lombar.”
— “O paciente deve ser transferido da área de isolamento para uma clínica especializada para receber tratamento imediato e realizar mais exames médicos.”
— “O paciente tem dificuldades em andar devido a ferimentos nas pernas. São também visíveis lesões no antebraço e na parte inferior das costas. Está subnutrido e tem problemas na pele, nomeadamente secura.”
— “O paciente tem vários ferimentos ao longo do corpo, sobretudo na zona das costas, abdómen e coxas. Também apresenta vários sinais de desnutrição devido à falta de comida, como palidez facial e fraqueza geral.”
— “O paciente não consegue deslocar-se devido a ferimentos em ambas as pernas e por se sentir muito fraco, resultado da desnutrição e da falta de líquidos.”
— “O paciente apresenta graves queimaduras em todo o seu corpo e tem ferimentos antigos que não foram tratados por completo por negligência médica.”
— “O paciente tem dificuldades em andar por estar gravemente subnutrido e devido à falta de líquidos. Ao longo do corpo, foram observadas feridas e lesões.”
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