Consultora EXX Africa denuncia possível ligação do Presidente angolano, João Lourenço, a empresas ligadas ao escândalo das "dívidas ocultas" em Moçambique. Tudo terá acontecido quando Lourenço era ministro da Defesa.
Um artigo da publicação EXX Africa Business Risk Intelligence, publicado na semana passada, denuncia o possível envolvimento de altos gestores públicos angolanos com empresas ligadas às "dívidas ocultas" moçambicanas: a ProIndicus e a Privinvest. João Lourenço, Presidente de Angola, é o principal nome apontado.
Segundo a consultora, que cita uma "fonte próxima da ProIndicus", Lourenço terá visitado Moçambique "enquanto parte de um esforço da Privinvest, liderada por [Jean] Boustani, para lhe vender" equipamentos e serviços. E, através da Simportex, uma empresa alegadamente ligada ao Ministério da Defesa de Angola, Luanda "fez um contrato de 495 milhões de euros para comprar barcos e capacidade de construção marítima à Privinvest, num contrato aparentemente com notáveis semelhanças com a ProIndicus e MAM (em termos de formulação e conteúdo)".
Além disso, ainda segundo a consultora, a Consultores e Prestação de Serviços (JALC), empresa de João Lourenço, terá estado envolvida nos negócios da Privinvest em Angola.
Suspeitas
O constitucionalista angolano Albano Pedro diz que, "na qualidade de ministro da Defesa e de países até com alguma geminação política e com interesses políticos muito aproximados", não duvida "que se tenha desenhado aqui um tráfico de influências".
"Não deixa de ser tráfico de influência porque se trata de países diferentes, porque se está a facilitar negócios particulares de um país para que também haja facilidades eventuais de gestores públicos desses países invistam cá. Não estou a ver empresas a obterem contratos em Moçambique por via de um mero concurso público. Estou em crer que houve algumas vantagens trocadas com operadores económicos locais para que o negócio fosse viabilizado", acrescenta.
Outro nome: Manuel Vicente
No artigo da consultora EXX Africa é ainda citado o nome de Manuel Vicente. O ex-vice Presidente de Angola teria facilitado a aproximação entre as partes ao apresentar Gabriele Volpi, um empresário italiano ligado ao setor do petróleo autorizado a explorar a base logística do porto de Pemba, segundo o jornal L´Espresso de Itália. Volpi, em conjunto com Boustani, mediador da Privinvest, terão funcionado como pontas de lança para aproximar Lourenço a Privinvest. Essa teia é agora chamada ao "barulho" em Moçambique.
Sobre o imbróglio, o analista moçambicano Severino Ngoenha apresenta uma justificação de ordem estrutural: "A promiscuidade entre a política e o negócio constitui uma das características principais que o neoliberalismo nos trouxe desde o fim do século passado", afirma. "Vimos essa promiscuidade com [Nicolas] Sarkozy em França, com [José] Sócrates em Portugal. Olhamos para o mundo em que vivemos e até pode parecer que estamos na ponta [da frente]. Essa promiscuidade está em todo o lugar, só que talvez se manifeste com mais força em países em que não há contrapoderes e onde essa mesma promiscuidade se encontre a nível político, entre os três poderes."
Presidente angolano, João Lourenço (esq.), e chefe de Estado moçambicano, Filipe Nyusi, encontraram-se em dezembro
Encontro entre Nyusi e Lourenço
Os negócios duvidosos supostamente realizados com os fundos das "dívidas ocultas" moçambicanas aconteceram quando o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, era igualmente ministro da Defesa e com conhecimento do processo.
Entretanto, em meados de dezembro, o Presidente angolano esteve em Moçambique a título privado, numa estância turística.
João Lourenço recebeu a visita informal de Filipe Nyusi, um encontro que antecedeu a detenção do ex-ministro das Finanças de Moçambique. Manuel Chang foi detido a mando da Justiça dos Estados Unidos da América, num processo relacionado às dívidas ilícitas moçambicanas, avaliadas em cerca de 2 mil milhões de dólares.
Sem entrar para o campo da especulação sobre o que terá sido abordado entre os dois estadistas, o analista Severino Ngoenha sublinha que "essas promiscuidades nacionais tornaram-se internacionais, criaram-se bandos de amigos."
"A FRELIMO [Frente de Libertação de Moçambique] e o ANC [Congresso Nacional Africano], MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola] ou o PAIGC [Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde], que no passado lutaram contra um adversário comum, o colonialismo, tornaram-se um grupo de amigos, gente que se frequenta, com interesses comuns ou análogos", diz Ngoenha. "Tudo isso faz com que os grupos de ação coletiva em prol da liberdade ontem possam até se tornar em grupos de máfias, com interesses comuns, só que um bocadinho mais obscuros."
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- Palavras-chave Moçambique, dívidas ocultas, Angola, João Lourenço, ProIndicus, Privinvest
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