28.06.2018 às 22h41
A acusação original era de pedofilia, mas a sua aparente falta de fundamento fez com que acabasse por ser condenado por um crime menor. As razões de fundo das autoridades serão outras
Um historiador russo que trabalha há décadas para descobrir e expor os locais onde a polícia secreta de Estaline realizava execuções voltou a ser preso, escassos meses depois de ser absolvido de acusações de pedofilia por um tribunal.
Yuri Dmitriev, atualmente com 62 anos, é um ativista de direitos humanos que faz parte da Memorial, uma organização dedicada a manter viva a memória das vítimas do estalinismo. Entre as suas descobertas conta-se a de um campo da morte onde mais de 9 mil pessoas terão sido assassinadas. No atual clima de revisionismo histórico promovido pelo governo russo, essa atividade não é bem vista, e quem se envolve nela sofre assédio e intimidação por parte das autoridades.
Em 2016, Dmitriev foi preso sob acusações de pedofilia, com base em fotografias tiradas a Natasha, a filha que ele e a sua mulher adotaram em pequena. Embora houvesse indicações de que as imagens tinham sido feitas para mostrar aos serviços sociais como essa criança originalmente frágil e subnutrida estava a recuperar bem (as fotos vinham acompanhadas por observações de vários tipos sobre a evolução de Natasha), a acusação pedia nove anos de cadeia.
Era bastante assustador, considerando que na Rússia quase todos os julgamentos criminais resultam em condenação. Para mais, num processo em que a influência dos serviços secretos parecia evidente - foi o KGB, onde Putin fez a sua carreira, que realizou muitas das execuções investigadas por Dmitriev - poucos esperavam uma absolvição.
O historiador acabou mesmo por ser condenado em abril. Mas não por pedófilia, e sim pelo crime relativamente leve de posse ilegal de arma. Na altura, Dmitriev respondeu a quem o congratulou dizendo: "Não é correto aceitar parabéns. Eu sabia que não era um pedófilo". A sentença não o devolveu à prisão, onde ele já tinha passado um ano enquanto esperava julgamento, mas impôs-lhe restrições de movimento durante três meses.
São essas restrições que ele é agora acusado de violar. As autoridades tornavam a prendê-lo, alegando que ele se preparava para fugir para Polónia. Dmitriev diz que ia sair da sua cidade, Petrozavodsk, apenas para visitar a campa de um amigo, mas os seus incómodos não devem terminar tão cedo.
Segundo parece, mesmo práticas típicas da antiga URSS como a utilização de exames psiquiátricos para desacreditar dissidentes estão de volta. Aconteceu com Dmitriev e com mais três dezenas de pessoas que, tal como ele, contestam a versão oficialmente sancionada do patriotismo russo.
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