Concursos Opacos de Acesso aos Tribunais Superiores
Nos últimos dias as atenções têm estado voltadas para os concursos de acesso ao Tribunal Supremo e ao Tribunal de Contas.
O resultado final destes concursos revela uma magistratura dependente dos jogos de bastidores, sendo notória uma enorme promiscuidade entre os políticos e os magistrados dos tribunais superiores.
Devido a essa promiscuidade, os concursos foram meros episódios de “faz-de-conta”, com lugares pré-seleccionados e candidatos indicados à partida, sem a observância das regras mínimas de acesso aos cargos. Os membros do júri ignoraram os critérios de acesso de magistrados ao Tribunal Supremo, e não consideraram a antiguidade, a classificação ou as avaliações de desempenho. Estes critérios foram substituídos pelo compadrio, pela militância, pela simpatia e pela troca de favores futuros.
O compadrio e a influência política do MPLA são fenómenos recorrentes nos processos de concurso às magistraturas, e as vagas preenchidas foram-no por critérios obscuros e subjectivos, sem que até agora ninguém tenha fundamentado as decisões tomadas.
Veja-se o caso de João Fuantoni, actual juiz presidente do Tribunal Provincial de Luanda. Este magistrado teve uma ascensão meteórica, pois era juiz presidente no Kuando Kubango, e veio no elenco de Higino Carneiro, que exigira fazer-se acompanhar pelo seu homem de confiança, no caso, o juiz Fuantoni. Na altura, a questão foi levada ao Conselho Superior da Magistratura Judicial, e aí discutida. O então presidente do Conselho Superior, Manuel Aragão, de forma musculada impôs a vontade de Higino Carneiro, e os membros do Conselho acobardaram-se e a tudo aquiesceram. Basta ler a ficha de avaliação e a antiguidade de Fuantoni para se perceber que ele se situa abaixo da maior parte dos excluídos, que têm avaliações positivas e são mais antigos.
Outro caso é o de Norberto Capessa, que pediu uma licença ilimitada por dez anos, desde que se zangou com o anterior procurador-geral da República, João Maria de Sousa. Agora, para espanto de todos, sem requerer a suspensão da licença e readmissão nas funções de procurador, e sem a prática de actos jurisdicionais há seis anos, candidatou-se. Contrariamente ao que foi exigido aos juízes para além da antiguidade, das avaliações e de peças processuais, a Norberto Capessa não foi exigido nada, e o critério adoptado foram as obras publicadas. De acordo com esse único critério, saiu classificado em primeiro lugar. Isso seria um espanto, não fosse o caso de se saber que nos últimos tempos ele era o “assessor” de Joaquina do Nascimento, dispondo justamente no gabinete desta a sua mesa de trabalho. Estranhamente, o mesmo júri que considerou as publicações de obras relativamente ao procurador Capessa ignorou este critério para avaliação da professora Elisa Rangel.
Pode-se constatar que os admitidos ao Tribunal Supremo nos termos do Despacho n.º 395/13, de 10 de Setembro, do Conselho Superior da Magistratura Judicial têm menos antiguidade em relação aos excluídos.
O júri terá de apresentar as avaliações, as peças processuais e a valoração que sobre elas recaiu, para se aferirem os critérios que levaram ao afastamento de candidatos com maior antiguidade e capacidade objectiva que João Fuantoni, Aurélio Simba ou Anabela Vidinhas.
Os funcionários do Conselho Superior da Magistratura Judicial descrevem o concurso como inédito. Foi rodeado de secretismos, sendo que algumas vezes as deliberações foram tomadas à porta fechada. Afirmam que os membros eleitos do CSMJ foram compelidos a assinar de cruz.
Molares de Abril, ciente de que está ali por mero acidente, é uma lâmpada apagada. Na verdade, quem continua a comandar o Conselho é Manuel Aragão, em parceria com Joaquina do Nascimento e restantes influências políticas associadas. Quem não se enquadra no perfil do “lambebotismo” e bajulação ficou excluído do acesso.
Tal como no Tribunal Supremo, e porque o júri é o mesmo, no Tribunal de Contas foram preteridas pessoas competentes, e admitidas as que passam a vida a fazer cópias ou que estavam a ser descartadas por ineficiência dos lugares que ocupavam. Antigos alunos medíocres, depois magistrados fracos estão, agora, num Tribunal tão importante em tempos de disciplina e moralização do Estado.
O teste útil para se combater a impunidade, a corrupção e o tráfico de influências em Angola é a abertura de um inquérito aos bastidores destes concursos, cruzando informações sobre os conflitos de interesses latentes e a podridão na Magistratura.
Não surpreende que os nossos pares suspeitem da boa administração da justiça, já que no Conselho Superior da Magistratura Judicial o ambiente que reina é pútrido.
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