sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Morreu Carmen Franco, a filha do antigo ditador espanhol


Duquesa de Franco, título nobiliárquico que o rei Juan Carlos lhe atribui em 1975 em memória do pai, tinha 91 anos.


Carmen Franco em 1995, na missa do 20.º aniversário da morte do pai
Foto
Carmen Franco em 1995, na missa do 20.º aniversário da morte do pai DESMOND BOYLAN/REUTERS

A filha única de Francisco Franco, o ditador que governou Espanha entre 1936 e 1975, morreu aos 91 anos, avança o El Mundo. Carmen Franco sabia desde Outubro que estava a morrer, segundo o mesmo jornal.


Em Novembro, contava numa biografia autorizada que estava "disposta a receber aquilo que está para vir: sem lágrimas". "Não tenho medo de nada, nem mesmo da morte. Vi-a muitas vezes e conheço-a perfeitamente."
Carmen Franco morreu em casa no número oito da rua Hermanos Bécquer, em Madrid, um dos bairros mais caros da capital espanhola. Recusava hospitais por a recordarem dos últimos meses de vida do pai, conta o jornal. Francisco Franco morreu em 1975 depois de ter estado internado no hospital de La Paz em Madrid. "O meu pai queria morrer em casa", dizia. "Deviam deixar as pessoas para morrer em paz", argumentou à data, quando o ditador espanhol foi transferido de casa e internado. Terá sempre culpado o seu marido, o marquês de Villaverde Cristóbal Martínez-Bordiú, pela decisão de "ter prolongado inveitável" em relação à morte do pai.
"A menina queria um marido, a mamã queria um marquês, o marquês queria dinheiro, e estão contentes os três", era uma frase que corria Madrid nos finais de Março de 1950, a poucos dias de Carmen, à data com 20 anos, com o marquês Cristóbal Martínez-Bordiú, lembram os jornais espanhóis como o La Vanguardia e El Español. 
Com Martínez-Bordiú, cardiologista, teve sete filhos: Carmen, Francis, Mariola, Merry, José Cristóbal, Jaime e Arancha. O casamento por interesse, que contou com mais de 800 convidados, seria reconhecido mais tarde por um dos seus filhos, José Cristóbal.
Carmen herdeu o nome da mãe e cresceu moldada aos desígnios fascistas do pai,com o objectivo de liderar a propaganda do seu regime. A "Nenuca" - como era tratada pelo seu pai - dizia na sua biografia que “as mulheres não têm opinião”. Reconhecia que tinha sido criada como uma boneca de cristal, mas considerava que isso era o “normal” para os meados do século XX.
A matriarca, já viúva, é titular da maior parte das propriedades e dos negócios e alguns estiam que tem uma fortuna superior a 500 milhões de euros, escreve o El País. Mas Carmen sempre negou que possuísse uma fortuna tão grande e queixava-se mesmo de que manter algumas das propriedades tinha custos muito elevados.
Um dos seus netos, Luis Alfonso de Barbón, partilhou uma mensagem de despedida que legenda a sua mais recente publicação na rede social Instagram. "Uma segunda mãe, um dos meus pilares" e uma "grande cristã", que gostava de "viajar e conhecer outros lugares", é recordada pelo neto como uma pessoa como culta e informada e fã da selecção espanhola e do Real Madrid.

Numa conversa agora recuperada pelo El Mundo, Carmen partilhava a relação que tinha com os netos. "Dou sempre o primeiro carro a todos os netos. Como não tenho muitas despoesas e não faço muitas viagens gosto de estender a mão aos meus netos quando têm problemas."
Fez sempre tudo o que lhe mandaram e nunca questionava ou se revoltava contra as indicações que lhe eram dadas. Chegou a apaixonar-se por civil da marinha que conhecer em casa de uma tia, mas os pais não a deixaram prosseguir com a relação.
Na vida, "não fez outra coisa a não ser cuidar da casa e viver do seu negócio imobiliário", recorda o La Vanguardia.
Dizia que não queria ser julgada pela vida dos outros, quer pela vida dos seus pais, do seu marido ou dos seus filhos. "Sou a Carmen Franco e nada mais", cita o El Español.

Morreu Carmen Franco, a única filha do ditador Francisco Franco

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Carmen Franco morreu aos 91 anos, em Madrid. Viveu à sombra do seu pai, cujo legado defendia apesar de dizer que ele tinha sido "machista". Tinha o bilhete de identidade número 3.
Getty Images
Carmen Franco y Polo, a única filha do ditador que governou Espanha entre 1939 e 1975, morreu na madrugada desta sexta-feira aos 91 anos na sua casa, em Madrid. Tinha um cancro há 15 anos. A morte foi confirmada pela jornalista Nieves Herrero, que recentemente terminou de escrever uma biografia de Carmen Franco, publicada há pouco mais de um mês.
Filha de Francisco Franco e de Carmen Polo, nasceu em 1926, durante a ditadura de Miguel Primo de Rivera. Quando era jovem, a sua família era uma das mais bem cotadas do regime — Francisco Franco, além de ter sido diretor da Academia Geral Militar, em Saragoça, entre 1928 e 1931, era também um protegido do rei Afonso XIII. Depois da proclamação da república, em 1931, tinha Carmen Franco cinco anos, a família mudou-se para a cidade galega da Corunha, onde Francisco Franco foi governador militar.
Carmen Franco, que naquela altura era conhecida em casa como “Nenuca” ou “Moirita”, viveu uma infância resguardada e austera — “sem beijos nem abraços, para não suavizar as crianças, como era crença na época”, escreve Nieves Herrero. Teve sempre aulas privadas — antes, durante e depois da Guerra Civil espanhola que as tropas comandadas pelo seu pai venceram em 1939. Segundo conta a sua biógrafa no El Mundo, teve uma professor de que lhe dava aulas particulares de francês, a mademoiselle Labord — uma professora que foi despedida por haver suspeitas de que era uma espia francesa.
Carmen era a única filha do ditador e general Francisco Franco e de Carmen Polo, a mulher que o acompanha nesta foto em Burgos (Keystone/Getty Images)
O domínio do francês, que era também característica da sua mãe, levava Francisco Franco a perguntar em casa: “Quando é que aqui se vai falar espanhol?”. No início a Guerra Civil, fugiu de Espanha com a mãe num navio alemão que as levou às Canárias e depois a França. Naquele país vizinho, foi por um dia à escola, um colégio interno. Tinha 10 anos e dormiu ali uma noite — após a qual a sua mãe a foi buscar, para devolvê-la ao ensino particular. Em 1937, ainda durante a Guerra Civil, regressaram as duas a Espanha.

“Reconhece que o meu pai foi muito autoritário e até machista comigo”

Tal como a infância, a adolescência foi marcada pelo tom austero, quase militar, durante a qual foram proibidos namoros. “Não o renego, mas reconheço que o meu pai foi muito autoritário e até machista comigo e com a minha mãe, como eram os homens naquela época. Gostava de mandar sempre em tudo. A minha opinião nunca contava, mas desde 10 de abril de 1950 comecei a tomar as minhas próprias decisões”, disse a Nieves Herrero.
Aquela data marca o dia em que se casou com o Marquês de Villaverde, Cristóbal Martínez-Bordiú, um empresário com quem foi casada até 1998, ano em que este morreu. Tiveram sete filhos, e apesar dos rumores de adultério do marido, eram à época apontados como um família-modelo da Espanha franquista, católica e conservadora.
Retrato de Carmen Franco, filha do General Franco, posando com o vestido com que casou com o Marquês de Villaverde, em Madrid, a 10 de abril de 1950 (Keystone/Hulton Archive/Getty Images)
Porém, com a morte de Francisco Franco e com a transição da ditadura para a democracia em 1976, essa ideia viria a dissipar-se. Da discrição e recato que a ditadura permitia àquela família, passou-se para o extremo oposto em que a imprensa cor-de-rosa passou a pôr os holofotes nos ascendentes de Francisco Franco.
Embora Carmen Franco resistisse a estas andanças — “Sempre fez o mais correto. Nunca deu um escândalo. Obedeceu aos seus pais e depois submeteu-se à vontade do seu marido”, escreveu Nieves Herrero —, o mesmo não pode ser dito da sua filha mais velha, Carmen Martínez-Bordiú, cujo divórcio de Afonso de Bourbon (membro da família real espanhola, com quem a neta de franco foi casada entre 1972 e 1982) foi alvo de intensa cobertura pela imprensa espanhola.
Carmen foi casada com o aristocrata e cirurgião, Marquês Cristobel de Villaverde (atrás) com quem teve sete filhos – cinco deles estão nesta foto (da esquerda para a direita): Maria del Carmen, Maria della O Mariola, Francisco Franco, Maria del Mary and Jose Cristobal. (Keystone Features/Hulton Archive/Getty Images)
Ao longo da sua vida, viveu sob a sombra do seu pai, cujo legado procurou proteger — sendo recorrentes a defesa de que o corpo de Francisco Franco, que permanece numa basílica no Vale dos Caídos, monumento franquista construído por prisioneiros políticos da Guerra Civil, ali permanecesse. Até perto dos seus últimos dias, manteve os seus hobbies — como era viajar, como fez pela última vez este verão, num cruzeiro no Reno — e os seus hábitos — entre os quais se incluía a leitura de jornais à noite.
Morreu em casa, aos 91 anos. Tinha o DNI — equivalente ao Cartão de Cidadão — número 3. O número 2 era o da sua mãe, Carmen Polo; o número 1 era do seu pai, Francisco Franco.

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