sábado, 23 de setembro de 2017

Trata-se de Mishell Larya, de nacionalidade ganesa

Um dos mais bem presenteados durante o saque no FDA foi o então namorado de Setina Titosse, com o qual mantinham uma relação amorosa que tinha apenas três semanas e que três meses depois casaram-se. Trata-se de Mishell Larya, de nacionalidade ganesa de 51 anos, que começou o relacionamento com a então PCA e numa dessas viagens para casa, a PCA ficou a saber que o carro do namorado (Toyota Camry) tinha problemas de suspensão e resolveu presenteá-lo com uma apetecível viatura novinha em folha da Marca Mazda modelo BT-50, adquirida a 1.360 mil meticais. Larya disse que apenas recebeu uma chamada da empresa Ronil Auto que lhe chamava para receber a viatura oferecida pela então PCA. Não acreditou. Resolveu esperar Setina que estava fora de Maputo para que viesse confirmar. O réu que é alfaiate de profissão, conta ainda que quando recebeu o presente da sua namorada, não desconfiou que tivesse sido comprado com dinheiro do Estado ou ilegal, pois reparou que Setina andava de um carro de alta cilindrada, da marca Land Rover, modelo Discovery 3. Mas lembrou que à primeira rejeitou a viatura, porém depois aceitou quando Setina Titosse desatou em lágrimas por sentir-se humilhada, uma vez que nunca um homem recusou um presente seu. 

Cada vez que o julgamento do “caso FDA” corre, vêm à superfície episódios rocambolescos que vão de hilariantes à preocupantes, dando claras indicações de que o rombo nas contas do Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA), supostamente encabeçado pela então Presidente do Conselho de Administração (PCA), Setina Titosse, poderá ser acima dos 170 milhões de meticais, despoletados pelo Gabinete Central do Combate à Corrupção (GCCC). Depois do juiz Alexandre Samuel, da Sétima Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo (TJCM), terminar a audição dos réus, esta semana ouviu os declarantes e foi nesse estatuto que ouviu, na manhã desta quarta-feira, 20, Abdul Cé- sar Mussuale, director-adjunto do FDA. Mussuale contou que, quando o seu elenco chegou à direcção do FDA, em Fevereiro de 2016, recebeu, de Setina Titosse, como parte do património da instituição, três imóveis domiciliados no luxuoso condomínio localizado no bairro Triunfo, um dos bairros nobres da capital do país. O referido condomínio denomina-se Joss Village. Porém, com o início das investiga- ções do Ministério Público (MP), o FDA foi notificado sobre o paradeiro de seis imóveis adquiridos pela instituição no mesmo condomínio. Segundo Abdul Mussuale, espantado com o despacho do MP, a sua direcção contactou os responsáveis pelos sectores de UGEA e Património do FDA. Foram estes que falaram da existência de mais três imóveis adquiridos pelo FDA, mas que ainda não estavam em nome da instituição, alegadamente porque ainda estavam em obras. Essa situação obrigou a direcção do FDA a deslocar-se a Joss Village, ande estabeleceu contactos com a imobiliária para mais esclarecimentos e das razões que impediam a entrega dos imóveis. Mussuale contou que foi nessa averiguação que se descobriu que não eram três, mas seis apartamentos fora da alçada da direcção do FDA. “Meritíssimo, quando chegámos ao condomínio Joss Village encontrámos seis imóveis, três prontos e três na fase de acabamentos. Depois soubemos que havia mais três ainda em construção. No entanto, no nosso património, apenas tinha o registo de três apartamentos. Os restantes estavam em nome de particulares, incluindo a própria imobiliária”, disparou. Sublinhou que, dos três apartamentos sob o registo do FDA, um servia como residência da arguida Neide Xerinda, então directora- -adjunta do FDA, o outro estava arrendado a um valor mensal de 60 mil meticais a um particular, mas que o valor da renda nunca chegou às contas do FDA e outro estava desocupado. Frise-se que o valor médio de renda de apartamentos no Condomínio Joss Village é de 110 mil meticais mensais. Mussuale referiu que a justificação da imobiliária sobre a não entrega de imóveis foi de que os mesmos ainda estavam em obras. Para além dos três imóveis descobertos no Joss Village, Abdul Mussuale falou da compra de uma vivenda na cidade da Matola, pelo FDA, mas que continuava em nome da anterior proprietária. Na mesma linha, a direcção de Setina Titosse adquiriu mais um complexo de armazéns para o FDA, no bairro Tchumene, município da Matola. No entanto, o seu elenco só tomou conhecimento da existência deste património, quando o MP iniciou com as suas incursões. José Pacheco na berlinda? Para aquisição de nove apartamentos no Joss Village, a um custo de 20 milhões de meticais cada, a direcção de Setina Titosse recorreu ao financiamento bancário e a fundos do FDA. Na semana passada, Setina Titosse disse ao Tribunal que o FDA tinha apenas a autonomia administrativa e financeira. Não tinha autonomia patrimonial, pelo que a aquisição do património só podia ser mediante a autorização do ministério de tutela, neste caso o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar, liderado por José Pacheco. Segundo Titosse, todas as aquisi- ções patrimoniais feitas pelo FDA foram comunicadas ao ministério de tutela. Questionado sobre o facto, Abdul Mussuale optou pelo silêncio. Setina Titosse disse ainda que, anualmente, as contas do FDA eram auditadas pela inspecção interna do ministério da Agricultura, Finanças, Tribunal Administrativo bem como pela KPMG e nunca detectaram nenhuma anomalia. No entanto, a KPMG já veio a público, através de um comunicado, negar que alguma vez tenha auditado contas do FDA. Esses pronunciamentos inquietaram o MP, que requereu ao juiz a presença dos auditores-chefes das Inspecções dos ministério das Finanças, Agricultura e dos auditores independentes que realizaram trabalho inspectivo no FDA no momento em que eram drenados 170 milhões de meticais. O MP entende que há necessidade de se explicar diante daquele Tribunal, como foi possível que passassem em revista cada exercício económico naquela instituição e não detectar anomalias. Réus e declarantes “enterram” Titosse Naquele que é conhecido como um dos maiores casos de saque das finanças públicas, ainda nesta quarta-feira, o Tribunal ouviu quatro declarantes, dos quais três são irmãos da arguida Milda Cossa, arrolada no processo como a pessoa de confiança de Titosse e responsável pela angariação de mutuários para a drenagem dos fundos do FDA. Trata-se de Gerson, Dércio e Binaia Manganhe que contaram ao Tribunal que, entre finais de 2013 e princípios de 2014, foram contactatos pela irmã, Milda Cossa, a informá-los que havia uma oportunidade de financiamento para a criação de gado bovino. Para tal, deviam juntar a cópia de bilhete de identidade, abrir uma conta no Banco Comercial de Investimentos (BCI) juntar o cartão de NUIT e mandar para Setina Titosse. O trio obedeceu as orientações da irmã, de tal forma que o dinheiro estava nas suas contas, em poucos dias, mas que por ordens da Milda Cossa não deviam mexer. Por questões de segurança, Milda Cossa recolheu seus cartões e deu ordens para transferir os valores recebidos para várias contas, incluindo a dela e de Setina. Disseram ao Tribunal que nunca submeteram projectos ao FDA, nunca assinaram contratos, não conhecem a sede do FDA e jámais tiveram gado. Das contas abertas pelos irmãos Manganhe foram drenados perto de 17 milhões de meticais. Na última sexta-feira, 15, o Tribunal ouviu Abdul Rassul, sobrinho de Setina Titosse, que disse nunca ter chegado ao FDA para receber fundos, tendo feito tudo a partir da casa de Setina Titosse e na sua conta foram depositados seis milhões de meticais de onde teve uma gratificação de 400 mil meticais. Natália Matuca, cabeleireira da então PCA, surpreendeu a audiência quando disse que recebeu mais de três milhões de meticais de Titosse, a título de empréstimo, sem garantia, com a finalidade de pagar uma casa no projecto Intaka. Frisou que mais tarde teve um fi- nanciamento de quatro milhões de meticais, tendo comprado gado junto a Setina Titosse. Entretanto, porque ficou grávida, não conseguiu fazer gestão do negócio e não sabe se ainda existem as tais cabe- ças de gado. Brasilino Salvador, então funcioná- rio do FDA, onde era responsável por avaliar projectos submetidos à instituição refutou as acusações de que forjava pareceres e disse que os projectos eram viáveis e reuniam requisitos. Tribunal chumba defesa de Setina Titosse Na tentativa de limitar o direito à informação, o advogado da arguida Setina Titosse, Jaime Sunda, em representação do escritório de Teodoro Waty, tentou impedir que os jornalistas acedessem à sala de audiências, alegando que a publicitação dos actos processuais violava os princípios de presunção de inocência bem como o direito a bom nome, à honra e à imagem dos arguidos. Em resposta ao requerimento da defesa de Titosse, o juiz Alexandre Samuel indeferiu o pedido alegando que o mesmo violava o preceituado nos artigos 48, número 3 da Constituição da República e 407 do Código do Processo Penal. A

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