domingo, 27 de agosto de 2017

Sobre as eleições em Angola


Fui convidado pela stv, pra no jornal matutino logo as 7h00, de quinta-feira dia 24.08.2017 tecer considerações sobre eleições angolanas.
Apresentadora pergunta: "As eleições angolanas foram livres e/ou justas?"
Vi muita inocência nos olhos da apresentadora, Adelaide que foi uma das minhas melhores alunas, que na verdade eram olhos de milhões de africanos.
Eleições justas ou injustas eis a questão:
Os países africanos continuam a resistir e preferem ter as piores conotações do exercício de democracia. Começo pela:
1. A figura do chefe de Estado. A figura do chefe de um Estado é uma figura, por excelência, apartidária. Um presidente é o mais alto magistrado de uma nação e logo presidente de todos.
Pela lógica não se pode ser presidente da República e presidente de um dos partidos. Ou é presidente de um todo ou é de uma parte.
A política na era moderna passou a ser tanto racional quanto científica quebrando as arbitrariedades e o despotismo do "anciens regime" dos séculos XV, XVI e XVII.
As asserrações filosóficas modernas desde os ingleses Thomas Hobbes, john Locke, do alemão Immanuel Kant, e do filósofo francês jeans Jacques Rousseau quebraram o passado e mostram origens da legitimidade racional do poder politico contra o dispotismo formulando o Contrato Social.
Um presidente é um árbitro, como na lógica futebolistica, não se pode pretender neutralidade, imparcialidade, honestidade quando ele é parte de uma equipa em competição. Não precisa ser muitp inteligente pra chegar a esta ínfima conclusão.
Em conflitos eleitorais não existirá um árbitro enquanto alto magistrado a estabelecer justiça entre os concorrentes. Por outras palavras é como se não existisse chefe de Estado. Um árbitro.
Na logica actual das estruturas dos paises africanos o presidente da República que devia ser a solução do problema é ele mesmo parte do problema. É árbitro e jogador. E como se não bastasse tem o direito de nomeiar todos representantes do poder de justiça. Desde o presidente do Tribunal constitucional até...
Em países civilizados abandonaram está lógica africana a século. Falo da logica do presidencialismo atípico.
O facto de um Presidente da República ser também presidente do seu partido legitima conflitos pós-eleitorais africanos sobretudo onde as instituições do Estado são fracos e dependem da nomeação do presidente da República até aos representantes do poder jurídico.
Nunca se ouviu que a Itália ou Inglaterra ou ainda Espanha etc. um partido resolveu problema pela suas próprias mãos preferindo conflito armado. Existe a confiança das instituições pela estrutura montada.
Toda solução de "fazer a justiça pelas próprias maos" tipo um partido recorrer à guerra segundo John Locke denota ausência do Estado civi. Ou seja não existe um poder acima dos contendentes em poucas palavras nao existe o Estado. Não existe entidade ou instituição que possa com imparcialidade impor a justiça. Vou usar as palavras de Thomas Hobbes ou locke:"Estamos num Estado da Natureza" por outras palavras "selvagem" onde vigora a lei do mais forte.
2. O poder judiciário está totalmente engolido pelo partido no poder. Um partido é uma formação política e onde entra a política a justiça desaparece. Lá onde entra a política todo poder real cessa. O direito e a justiça funcionam na ausência do poder político. Solução: Os representantes do poder judiciário devem ser eleitos pelos seus pares. Não devem ser nomeados pelo presidente da República tanto menos pela indicacao de um partido.
A única forma encontrada e recomendada por Montesquieu foi de que os tres importantes poderes de uma nação devem funcionar com autonomia e independência. Nenhum poder, diz o filósofo francês, pode funcionar adequadamente se não é independente. A teoria de separação de poderes era pra dar autonomia e funcionamento justo e imparcial das instituições do Estado.
3. José Eduardo dos Santos dominando o governo mudou a constituição. O povo angolano já não tem bem o direito de eleger directamente o presisento da República. Que lástima. Aberrante antedemocracia. Já não há 
o direito do cidadão de escolher o seu presidente. Um modelo copiado da África do Sul. Muito raro no mundo moderno.Uma versão que representa regressão democrática africana.
4. MPLA institucionalmente é um partido muito enfraquecido. Já que ao longo dos anos, e sem alternância ao poder foi dominado por um só homem.
O senhor João Lourenço foi indicado por José Eduardo dos Santos. Este prestará vassalagem a quem o colocou no poder. Esta fórmula tornará José Eduardo dos Santos verdadeiro presidente da República. Desde modo não poderá haver mudanças profundas pra uma nova era angolana.
5. Com a queda do muro de Berlim em 1989 os países africanos aceitaram a lógica imposta pelo Ocidente vencedor pra implantarem as democracias pluralistas. Aceitaram por causa da lei do mercado sem no entanto houvesse uma cultura do pluralismo nem da democria. Os partidos únicos continuaram e continuam a comportar-se como partidos únicos ou seja procurando na medida do possível eliminar a oposição política e o pluralismo.
6. Não tendo a cultura democrática e sendo ainda Partido-Estado (partidos únicos) poderes em África continuam a serem legitimados pela história.
As instituições do Estado obedecem a lógica da legitimação baseada na história. O poder não encontra a sua fundamentação última no povo, nem deste é emanado. O exercício das eleições são uma forma pra justificar folcloricamente o selo feito pela história.
7. Tendo o partido no poder, o poder supremo este mata a democracia. Segundo Karl Popper numa sociedade nenhuma entidade deve ser detentora do poder supremo. A limitação do poder de qualquer entidade ou órgão visa travar os abusos de poder. Montesquieu o teórico da divisão e separação dos poderes arremata:"Todo poder absoluto corrompe absolutamente".
8. Os partidos de oposição em África deviam concorrer depois de verificadas condições de possibilidades da justiça eleitoral pra não estarem a chorar depois das eleições.
9. As eleições são justas? Oh Deus. A justiça implica a existência de órgãos e instituições imparciais, autônomas e independentes que ainda não existem em África dadas as condições históricas.
O MPLA respondeu com um apelo aos angolanos para que condenem "tentativas de provocar distúrbios e instabilidade".
RTP.PT
Adoro
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5 comentários
Comentários
Rui Vicente Mhata Mhata
Rui Vicente Mhata Mhata A democracia africana. O que está falhar
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1
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Ergimino Mucale
Ergimino Mucale Não há incompatibilidade entre África e democracia. Deve ser a ambição que estraga tudo.
 · Responder · 6 h
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Josué Tambara
Josué Tambara É assim mesmo e daqui a um ano irão esquecer e estarão a preparar pra próximas eleições
 · Responder · 3 h
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Lazaro Bamo
Lazaro Bamo Será que ser líder de um partido que concorre a eleição presidencial e ganha deve necessariamente renunciar a direção do partido?Olhemos para a origem destes partidos e a abordagem que eles têm sobre a liderança. Um dos dirigentes mais adorados do mundo, foi Fidel que era presidente do partido e do país. A questão da justiça e incompatibilidade muita das vezes depende da conveniência ou não da análise e da conclusão. Os grandes ídolos políticos, os grandes discursos, eleições consensuais etc., passaram para história não só em África. Temos o exemplo dos EUA e de Portugal. Por um lado temos Trump a ser contestado e a Hilary a reclamar sobre o processo. Os americanos estão fragilizados depois de um escrutínio cheio de polêmica. Não falo do estado quase-democrático que se chama Portugal que é governado por pessoas que chegaram ao poder administrativamente. Quis falar fora de África. Creio que o primeiro passo para a credibilidade dos processos políticos sociais e económicos africanos é não aborda los numa perspectiva de comparação pois esta leva nos a pensar fora da própria realidade africana. Nas nossas copeiras canta apenas um galo e se tivermos dois vamos gerir confusão ou um vai ter que abandonar. Não há nenhum processo de legitimação que não tem em conta a história como a justificação em nenhuma parte do mundo. Angola e Moçambique vão continuar a ser vistos como são na opinião do ocidente devido à opção política dos dois logo a seguir a independência. O ocidente nunca esqueceu e jamais irá perdoar estes dois "comunistas". A vitória do MPLA não só atropelou severamente Chivukuvuku e Samakuva como parte da imprensa portuguesa que claramente estava a apoiar a oposição basta ver a forma como as notícias são escritas. Professor, acho eu que o crescimento da democracia verifica se também quando os partidos da oposição começam a ter maior representatividade e claramente os que estão no poder vão perder mas isto tem uma explicação, quem vota olha muito para quem está no poder daí que a possibilidade de apostar na oposição é maior, mesmo para tentar mudar o status. Mas há quem prefere não arriscar mesmo reclamando mas porque nunca viu o outro prefere ficar ali. Mas democracia é acima de tudo aceitar que o MPLA ganhou e é sobretudo respeitar o direito da maioria do povo angolano que apostou no MPLA. Por mais que se considere que as instituições não foram justas, as pessoas foram lá exercer o seu direito e os resultados estão ali. Ninguém foi coagido.
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