quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Cinco testemunhos das eleições em Angola, desde um estudante até a um ex-primeiro-ministro


Em dia de eleições, ouvimos os testemunhos de cinco angolanos que foram às urnas: desde um estudante até a um ex-primeiro-ministro. Leia o que cada um tem para contar, na primeira pessoa.
Esta é a quarta vez que Angola vai a eleições, depois de ter ido a votos em 1992, em 2008 e em 2012
MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Domingos da Cruz, jornalista e ativista


Durante o dia, recebemos 231 denúncias, vindo de várias zonas urbanas de Angola. Benguela, Malanje, Kwanza Norte, Kuando Kubango, Luanda, Huambo e Huíla. Os eleitores vão votar mas depois não constam nos cadernos. Dizem-lhes que têm de votar noutros sítios, que são a 10, 20 ou até 100 quilómetros. Além disso, os partidos da oposição não estão a conseguir entrar em muitas mesas em Luanda, Huíla e no Huambo. Do lado positivo, há o facto de o povo estar calmo e de não ter havido confusão. Nós fizemos esta aplicação, a Zuela, para denunciar a fraude eleitoral em Angola. Os resultados excederam as nossas expectativas. É verdade que somos 28 milhões de pessoas, mas, com a qualidade da internet, isto já é bom. As pessoas vão tentando forçar a sua cidadania no espaço virtual. Mas eu não fui votar. Não descarto a possibilidade de uma imprevisibilidade política, mas acho que estas eleições são uma brincadeira.

Manuel Borges (Nery), 21 anos, músico e estudante


Foi um dia de eleições solene. Dou os parabéns ao Ministério da Administração pelo registo eleitoral, cada cidadão conseguiu escolher a sua assembleia de voto. Parabéns também ao CNE pelo trabalho neste grande dia de eleições. Foi tudo pacífico, sem enchentes nas assembleias de voto. O meu voto é certo: votei pela paz e pela democracia. Votei no MPLA.

Ricardo S., 31 anos, engenheiro informático

Foi um dia especial, com muito expectativa e vontade de fazer diferente desta vez. Votei em Luanda, numa das assembleias de voto da Cidade do Kilamba. Fui uma das primeiras pessoas e cheguei lá quando eram 7h00, havia uma fila básica de talvez 30 pessoas e mais foram aparecendo. Votei na CASA-CE, por querer algo diferente. Nas minhas últimas eleições votei no MPLA, mas pouco me importava pela política em geral. Há coisa de um ano, ou mais, fui vendo vídeos do Abel Chivukuvuku e fez-me despertar e interessar-me por política. Finalmente apercebi-me que havia havia alternativa e uma solução para este país desgovernado. Os governantes do MPLA estão muito à vontade, são arrogantes. Temos todos passado muitas dificuldades e tudo por culpa deles. O país está parado, parece que só agora que o pós-independência só chegou agora. Temos de mudar muita coisa, para isso precisamos de pequenos passos. Votar na oposição é um deles.

Marcolino Moco, 64 anos, ex-primeiro-ministro e militante (crítico) do MPLA


Foi um dia morno, em Luanda, o que é provavelmente o indício de uma abstenção alta. No interior da assembleia de voto, havia uma relativa afluência. Entretanto, o MPLA anuncia vitória sem entusiasmo, mesmo sem dados oficias. Não digo em quem votei. Quanto às irregularidades, conheço amigos que foram indicados para votar a mais de 300 quilómetros de onde vivem. Mas para mim as grandes irregularidades vêm de longe: comunicação controlada e disparatadamente manipuladora, etc…

José Efreme, 29 anos, gestor financeiro desempregado


Saí de casa apanhei um moto-táxi até à Assembleia de voto. Eram 7h45. Às 8h20, já tinha votado. As assembleias de voto estavam cheias e o ambiente era normal, sem problemas. Votei no MPLA. Revejo-me no programa eleitoral, porque ele deu conta dos profundos problemas vivido no país. Dizem que nestes anos todos não fizeram nada, mas eu acredito que o MPLA vai mudar o percurso do país. Não acho que os outros partidos consigam mudar o país. Seria apenas uma tentativa e as coisas não podem ser assim.

Sizaltina Cutaia, ativista feminista


Fui votar logo às 7h10 da manhã, no Cazenga, em Luanda, perto de onde eu moro. Cada assembleia de voto tinha 6 mesas, quando cheguei havia para aí umas 40 ou 50 pessoas nas filas. Algumas semanas antes das eleições, começou a circular uma mensagem por Whatsapp a dizer que as canetas nas assembleias de voto tinham uma tinta que dava para apagar. E hoje vi muitas pessoas que levavam a própria caneta. Especialmente os homens, e depois as mulheres pediam-lhes a caneta emprestada. Senti que havia preocupação das pessoas, que temiam pela integridade do seu voto. Depois houve uma altura em que pediram para fazer uma fila para mulheres e outra para homens. Os funcionários das mesas disseram que os homens não tinham que trabalhar, que não iam fazer nada, só beber cerveja. E as mulheres tinham de ir limpar a casa, tratar das crianças, e então tinham de se despachar mais depressa. Mas não vi nada a correr mal. Agora, acho que o João Lourenço vai ganhar. Eu não votei no MPLA, mas não digo em quem votei. Só digo que foi na oposição, para depois os amigos não se chatearem comigo.

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