segunda-feira, 29 de maio de 2017

O governador do Banco Moçambique (BM) elogiou hoje o Presidente da República

O governador do Banco Moçambique (BM) elogiou hoje o Presidente da República, Filipe Nyusi, argumentando que garante a independência do banco, e lembrou medidas difíceis como a liquidação de um banco e a subida das taxas de juro

Respondendo a perguntas da audiência sobre corrupção durante um debate na conferência Horasis Global Meeting, que decorre até terça-feira, em Cascais, perto de Lisboa, Rogério Zandamela criticou a forte dependência do Governo e o sistema de favorecimento aos empresários com ligações ao poder político, mas sublinhou que no seu caso ocorre o oposto.

“A minha presença no banco foi uma escolha pragmática, perceberam que algo tinha de ser feito. O Presidente da República não interfere no trabalho do Banco Central”, disse Zandamela, exemplificando com o aumento das taxas de juro e a liquidação de um banco com ligações a membros do partido no poder.

“Subimos as taxas para onde tinham de estar e isso nunca foi feito; fechámos um banco, uma coisa inédita, e intervencionámos alguns relacionados com o poder político, que já não eram bancos, mas ou o país caía com eles, ou fechávamos”, argumentou o governador.

Segundo o responsável, “a promiscuidade entre finanças, empresários e políticos está no cerne do sistema de funcionamento do país”.

O problema, no seu entender, “não é o dinheiro, mas a mentalidade”.

Zandamela explicou que “para operar numa determinada área o ambiente empresarial não favorece o negócio nem o crescimento a não ser que o empresário esteja ligado à realidade política do momento”.

Sobre a sua experiência no Banco Central, e pressionado por questões da assistência sobre a independência da instituição, Zandamela declarou: “O Presidente apoiou muito, honestamente; nunca vi nenhuma interferência política e isso mostra a maturidade do Presidente e da sua equipa”.

Com base na sua experiência à frente do Banco Central, disse também que achava que “dantes o que acontecia era que era tomada uma decisão, os empresários ou banqueiros corriam para o Presidente a pedir ajuda, e a decisão não era cumprida”.

Assegurando que, no geral, o sistema financeiro de Moçambique é sólido e estável, Zandamela admitiu algumas dificuldades, mas escusou-se a enumerá-las, argumentando que “o tema é sensível”.

O responsável também não respondeu sobre que trajectória das taxas de juro defendia para o resto do ano.

Ainda assim, criticou os “bancos internacionais que operam na arena global e chegam a Moçambique e não cumprem as regras internacionais”.

Em Moçambique, apontou, “todo o banco tem um presidente que é um político sénior, não pela competência técnica, mas sim para garantir que nada se passa sem o controlo deles; não são presidentes, são lobistas”.

Dívida Pública & investimentos

Sobre a dívida pública de Moçambique Zandamela afirmou que “passou de 40% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2013 para cerca de 120% agora, e isso é assustador”.

Sobre esta material Zandamela acrescentou que “parte dessa dívida é da dívida não divulgada, que é um montante enorme”.

O banqueiro central mostrou-se, no entanto, confiante na capacidade do país em ultrapassar a crise económica, orçamental e financeira em que está mergulhado, mas não escondeu que há muitos desafios pela frente.

“Somos um dos países mais abençoados do mundo [em termos de recursos naturais], mas precisamos de um modelo de desenvolvimento que melhore a vida das pessoas e também os indicadores económicos”, argumentou o governador, considerando que as altas taxas de crescimento, na ordem dos 8% anuais, distorcem a realidade do país.

O responsável sublinhou que “o Investimento Directo Estrangeiro é bom e é uma bênção para o país”, mas tem o problema de “ser concentrado nas minas, no carvão e no gás”, enquanto “no resto dos sectores não se passa nada”.

Como exemplo, apontou a agricultura.

“O sector está dormente, apesar do enorme potencial que tem. A esmagadora maioria da agricultura que se pratica é de subsistência, o sector está completamente subdesenvolvido, há muito pouco para o agronegócio que se vê no Brasil e na América Latina, e parte disso acontece por causa das regras de investimento. A lei favorece os grandes investimentos, mas tenta-se fazer um pequeno negócio e não se vai a lado nenhum”, disse Rogério Zandamela.

O governador, que chegou atrasado à sessão matinal da conferência por causa dos problemas nos aeroportos de Londres, acabou por concentrar as perguntas da assistência, e foi numa dessas respostas que explicou: “O crescimento de 7% ou 8% ao ano faz grandes manchetes na imprensa internacional, mas olhando para o que realmente interessa, que são os cidadãos, nós não estamos bem, e as políticas macroeconómicas também não são saudáveis”.

Moçambique, lembrou, acumula défices orçamentais ano após ano, e respalda-se no Investimento Directo Estrangeiro e nos doadores internacionais.

“Se este é modelo de desenvolvimento que vamos continuar a ter, então vamos ter problemas. Vamos ter muito dinheiro, mas vamos continuar pobres, porque a maioria da população não tem emprego nem há hospitais”, exemplificou o governador, que admitiu que por ter estado 40 anos fora do país se sente como “um ‘outsider’ a viver em casa”.

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