domingo, 30 de abril de 2017

O direito à indignação


Todos temos esse direito. Indignação mostra o quanto o nosso País significa para cada um de nós. Sem a capacidade de indignação pela forma como o País é gerido é difícil provarmos o nosso compromisso com o que é nosso. Mas só indignação, ainda para mais, uma indignação feita de slógans, lugares-comum e do conforto da opinião e do sentimento da maioria não nos vai levar muito longe. A cidadania mede-se também pelo contributo que podemos dar à reflexão crítica – e séria – dos problemas que fazem de nós uma comunidade. Tenho vindo a criticar a forma como abordamos o País pelo desabafo e pela denúncia, mas raramente pela crítica séria. Crítica séria, para mim, é aquela que não se limita apenas a dizer o que está mal, mas preocupa-se também em saber o que torna mal o que está mal, que substância ética existe na sociedade que legitima o que está mal e, acima de tudo, como podemos formular questões a partir dessas constatações que nos permitam falar do que está mal para além de fronteiras éticas, ideológicas e normativas que, de certeza, existem na nossa sociedade. Muitas vezes, a indignação sugere uma comunhão de ideias é apenas aparente. Quando olhamos mais de perto para as coisas constatamos que, afinal, não estamos a falar da mesma coisa.
Verifiquei isso por várias vezes aqui no Facebook. Nos últimos dias publiquei dois textos – um sobre a redistribuição da riqueza e outro sobre as regalias do deputado – em que tentei fazer o papel de advogado do diabo. O meu sentimento é de que todos os moçambicanos têm que usufruir das riquezas da sua terra. Penso também que as regalias que os deputados e os ex-presidentes vão receber são exorbitantes e completamente desfasadas da realidade. Mas isso é mais fácil dito do que justificado. Confesso que não consigo formular nenhum argumento que me convença a mim da justeza da minha posição. Faço apenas carícias à minha moral bombástica que se conforta na sensação de não ser o único que se sente assim. Isso é muito pouco para abordar o País com utilidade. Ao fazer de cardeal de diabo estava a tentar encontrar melhores argumentos do que os daqueles com os quais não concordo. Fi-lo de forma parasitária jogando as perguntas para os meus amigos do Facebook, mas amigos da onça que são, não me foram de grande ajuda. Antes pelo contrário, muitos – ou melhor, alguns – revelaram o tipo de atitudes que não nos ajudam a fazer do nosso País melhor.
Há os que enveredaram pelo ataque pessoal. Há os que repetiram apenas slógans. Há os que tentaram formular um argumento – num esforço louvável e até melhor do que eu próprio, promotor do debate, consegui fazer para mim próprio – mas tudo isso encalhou num problema que me parece particularmente sério entre nós: as nossas posições, com raras excepções, carecem de fundamento. Não abordamos os assuntos a partir dum princípio, por muito pobre que seja, que estrutura a forma como vemos um problema. Gritamos indignados apenas. É difícil. Mas são esses princípios que são tão importantes para a constituição dum espaço público realmente útil. Com a excepção de quem foi socializado no marxismo que reinou entre nós são poucas as posições defendidas em público com alguma ancoragem em princípios. Na maior parte dos casos o que há é uma espécie de comunismo primitivo, senão mesmo cafrial, que nos serve de escudo no embate político. Parece-me singularmente pouco.
Repito: sou pela redistribuição da riqueza e sou contra as regalias dos deputados. Mas não sei porquê. E se houver mais gente nas minhas circunstâncias, então teremos de reconhecer que o problema é mesmo sério. Esse, na verdade, é que é o problema. Não a redistribuição da riqueza, nem as regalias. É o desconhecimento do princípio que enforma a nossa indignação.




Gervasioa Absolone Chambo Penso ser importante apontar o erro sem propor a solucao viavel. Afinal pode ser um erro que resulta da incoerencia da logica ou da fragilidade da moral e da etica. Portanto estao de parabens os identificadores dos erros sem solucao pois alertam aos demais sobre a precariedade do erro. Os que tem a habilidade reflexiva e "solucionaria" terao o campo para investigar sobre a logica do erro e propor uma solucao viavel. Tanto os primeiros como os segundo realizam a reflexao mas, uma reflexao que apresenta resultados diferentes (uns identificam o erro e outros propoem a solucao).
Manuel J. P. Sumbana
Manuel J. P. Sumbana Nâo seja mal educado. É hora do jantar e dos telejornais. Salàrios minimos e 'stay of execution' da candidatura do Dlakas como potencial candidato por 10 dias.
Paulo Goque
Paulo Goque Para um pais como o nosso, o deputado ja aufere um salário bom se comparado com o salário mínimo e o custo de vida. Sou do mundo privado aonde as leis que servem são da procura e da oferta.
Nao consigo perceber, como é que alguém que serviu dois mandatos no parlamento pode passar a vida toda sem fazer nada e a viver as custas dos impostos que pagamos. Os impostos servem para serem aplicados nas prioridades deste pais, mas a meu ver as prioridades estão trocadas! O meu sentimento de revolta é quando chego a conclusão de que posso entrar no parlamento aos 22 anos e se fizer dois mandatos entro na reforma aos 32! Grande festa! A meu ver, essa pessoa nao contribuiu com o pagamento de impostos para beneficiar no futuro, fez sim um corta mato para relaxar a vida toda! Afinal o que é servir ao estado? É ser deputado? E o professor? O medico? O motorista? O estafeta? Estamos num pais ao contrário! Estou indignado com a nossa forma de pensar, só o umbigo serve. Que vergonha!
Olivia Mondlane
Olivia Mondlane Obrigada Dr, quanto ao primeiro texto, de facto surpreendeu me bastante (nao sei se pela negativa ou positiva), nao comentei pelas razoes seguintes: 1) Nao tive argumentos suficientes para afrontar um academico admiro muito e que me inspira; 2) Nao sabia se o fez como Cidadao comum ou Sociologo; 3) As lentes usadas para a leitura do fenomeno.
Agora ja estou esclarecida, ate os Drs bem haja Dr!
Rildo Rafael
Rildo Rafael "Crítica séria, para mim, é aquela que não se limita apenas a dizer o que está mal, mas preocupa-se também em saber o que torna mal o que está mal, que substância ética existe na sociedade que legitima o que está mal e, acima de tudo, como podemos formular questões a partir dessas constatações que nos permitam falar do que está mal para além de fronteiras éticas, ideológicas e normativas que, de certeza, existem na nossa sociedade. Muitas vezes, a indignação sugere uma comunhão de ideias é apenas aparente. Quando olhamos mais de perto para as coisas constatamos que, afinal, não estamos a falar da mesma coisa". (Elísio Macamo)...Professor, penso que estamos diante da faca de dois gumes, se por um lado temos esta indignação pouco fundamentada, por outro lado temos a exortação estratégica da clarividência da decisão também piuco fundamentada! É um ciclo vicioso! Os perigos dos confrontos ideológicos enformam a grelha de leitura da realidade social"
Juma Aiuba
Juma Aiuba Eu não entrei no SIM nem no NÃO no debate sobre as regalias dos deputados. Não entrei, exactamente, porque não encontrei chão para sobre ela colocar as minhas inquietações. Na verdade, estou tão indignado quanto a maior parte da população. Aliás, se pudesse escrever a quantidade da minha indignação seria, de longe, confundida com boçalismo.
Clelio Clelio
Clelio Clelio Depois deste esclarecimento volto a morrer de amores pr ti Dr...alias por teus posts,como um indivíduo de pouca instrução tenho nos teus posts uma bússola na qual oriento as minhas opiniões com relação ao meu pais,e confesso ter ficado atordoado com o posts das regalias dos deputados...da próxima pega leve Dr.
Junior M Nkanone
Junior M Nkanone Afinal de contas eu não estava errado...Que alívio!!! Minha opiniäo: näo ter capacidade argumentativa, näo nos tira o direito à indignaçäo. o facto de näo sermos Sociólogos, Juristas, näo nos torna cegos perante as injustiças da sociedade...e penso que näo nos deve impedir de lamentar e reclamar.
Adérito Mariano
Adérito Mariano Aqui ao lado não somos tão diferentes em termos de debate
Natércia Lichuge
Natércia Lichuge É um paradoxo muito grande na governação do país.Como aprovar uma lei desta natureza, se há bem pouco tempo não houve condições para responder as preocupações dos profissionais de saúde???!!! Donde virão as receitas para cobrir estas despesas, sabendo que o Orçamento do Estado continua deficitário??!!! Este assunto me leva a repensar a necessidade de se rever os critérios de eleição dos nossos parlamentares, no sentido de que prestem contas aos que lhes elegeram e sejam dignos representantes dos cidadãos.
Elisio Macamo
Elisio Macamo Olivia Mondlane, Junior M Nkanone e Clelio Clelio, essa é a saída mais fácil. ninguém é detentor da verdade. qualquer que seja o argumento apresentado, não importa por quem, merece ser analisado de acordo com os seus méritos. quem quer participar no debate público não pode depender da "clarividência" dos outros sem o seu próprio julgamento. e o sentimento de injustiça (que eu não nego) é importante, só que extremamente insuficiente como contributo útil à compreensão dos problemas que enfrentamos. por isso, Juma Aiuba e Gervasioa Absolone Chambo a reflexão critica se impõe para além da indignação. Rildo, a questão é: como é que sabemos que a decisão tomada também é má? o facto de estarmos contra ela não é suficiente. mas, se calhar, ao analisarmos friamente porque estamos contra essa decisão saberemos se ela é mesmo má ou não. portanto, a qualidade da decisão tomada não pode ser o ponto de partida. o ponto de partida é a nossa análise. que argumentos sólidos temos, Natércia e Paulo Goque, para além da nossa indignação? esta questão é importantíssima. eu estou contra a decisão, mas conforme já confessei no post, não consegui ainda formular um argumento que me convença a mim próprio. e se calhar é desse argumento que preciso para também fazer ver a quem tomou esta decisão que nunca a devia ter tomado. a perplexidade pode ser dos dois lados.
Rui Cabral
Rui Cabral Entao talvez a solução seja tomar-mos como ponto de partida as motivações e argumentações daqueles que em primeiro lugar avançaram com a proposta. Quais sao estas?
Alvaro Simao Cossa
Alvaro Simao Cossa REGRESSO PARA MOÇAMBIQUE

Deixa-me regressar para casa...Ver mais
Elisio Macamo
Elisio Macamo caro Rui Cabral, algumas estão mencionadas no post. outras fazem parte do exercício crítico que temos de fazer.
Rui Cabral
Rui Cabral Mas diga-me uma coisa caro Elisio Macamo, quando se refere a nos, refere-se a quem exatamente? A humanidade? kekekeke….
Elisio Macamo
Rui Cabral
Rui Cabral …and in the mean while mozambicans are killing mozambicans!Ver Tradução
Elisio Macamo
Elisio Macamo such is life. it happens everywhere and at all times...Ver Tradução
Rui Cabral
Elisio Macamo
Rui Cabral
Elisio Macamo
Elisio Macamo não, a condição humana. a história.
Rui Cabral
Rui Cabral entao descartamos as ciências biológicas, e depois construímos o contracto social baseado em que exatamente? Na historia? Ou naqueles que fazem a historia?
Elisio Macamo
Elisio Macamo na história feita por nós. mas a ideia de contracto social arrepia-me. não existe nenhum. existe apenas um acordo de cavalheiros que consiste em partirmos do princípio segundo o qual teríamos assinado um contracto social. política é discutir os termos dessa ilusão.
Rui Cabral
Rui Cabral mas estamos a falar de que exatamente (a tal pergunta de sempre)? Macanismo? kekekek…. I like that!!! Avance senhor PROFESSOR!
Rui Cabral
Rui Cabral descontructivismo em arquitectura ou é so talk?
Reginaldo Mutemba
Reginaldo Mutemba As regalias de deputados além de representar uma distribuição irregular da riqueza, podem significar uma inconstitucionalidade laborar pelo menos para o contexto de Moçambique. De acordo com EGFAE, documento normativo aplicado aos funcionários do Estado, pela idade cronológica e pelo numero de anos de serviços no Estado. portanto, são 55anos para indivíduos de sexo feminino e 60 anos para homem.
Reginaldo Mutemba
Reginaldo Mutemba As regalias dos deputados além de representar uma distribuição irregular da riqueza, pode representar também uma inconstitucionalidade laboral em Moçambique! De acordo com EGFE, documento normativo aplicado aos funcionários do Estado, o indivíduo pode reformar pela idade cronológica (60anos para homens e 55para mulheres) e pelo numero de anos de prestação de serviço ao Estado, (35anos para homem e 30anos ara mulher). Neste sentido, suponhamos que um INDIVÍDUO consiga ser Deputado aos 35 anos ou menos ou pouco mais, fica dez anos, então sai para reforma com 45anos ou menos ou pouco mais. não atinge a idade para a reforma que são 60anos, ou 55anos. se este Deputado viver mais 55anos, possa perder a vida com cem anos. ele ficara cinco décadas e meia sem trabalhar mas, a beneficiar de vantagens econômicas, que tanto escasseiam ate a um professor primário, secundário, universitário, ao medico, aos enfermeiros, etc. portanto, este deputado e outros fica mais tempo a beneficiar-se de recursos, sem pagar direitos aduaneiros na importação de qualquer que seja artigo, durante este período? se for uma regra de quase todos os deputados chegarem a cem ou noventa anos de idade, o Estado ficara a pagar durante esse tempo!? Com a lei de probidade já não pode trabalhar num outro lugar no Estado, apenas assaltar os recursos do Estado! além de muito tempo que o Estado poderá ficar a custear despesas de deputados, outro problema que merece realce tem a ver com o aumento da despesa publica com o andar de tempo, exemplo, daqui a 50anos o Estado terá aproximadamente 1750 deputados, a custear despesas. sem contar com outros dirigentes do executivo. (considerando o resto constante). O Estado corre risco de cair na banca rota, vai orçamentar a contar com os consumistas e "não produtivos". Daqui a pouco corremos ter o risco de ter três chefes de Estado, com as mesmas regalias, num paiis, como nosso, onde a taxa de desemprego esta galgar limites da tolerância aceitável!! Se os dirigentes públicos são espelho de outros cidadãos, que imagem, que charme estarão mostrar?

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