sábado, 15 de abril de 2017

Defeso especial no sector de madeiras é para “salvar a floresta” no Centro e Norte de Moçambique


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Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 13 Abril 2017
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Foto de Adérito CaldeiraA “Operação Tronco”, quiçá a primeira campanha de fiscalização florestal em Moçambique “deveria ser rotina”, afirmou o ministro da Terra e Desenvolvimento Rural durante a 3ª reunião com os Operadores Florestais Madeireiros acrescentando que a mesma mostrou “um cenário desolador, lastimável e inaceitável de delapidação dos nossos recursos florestais”. Sobre o defeso especial de 90 dias que o Governo decretou na exploração florestal no Centro e Norte do País, Celso Correia explicou que é para “salvar a floresta”. Os industriais do sector declararam não ter “capacidade para aguentar 3 meses sem produção” enquanto os madeireiros moçambicanos questionaram as quantidades de madeira apreendidas, “não conferem com a realidade”, e pediram o fim da parceria com os chineses, “não há china bom para madeiras e florestas”.
Todos sabíamos que as nossas florestas estavam a ser serrada e que a madeira levada, principalmente para a China, quase sem receitas para o Estado moçambicano. Porém a Operação de fiscalização lançada a 1 de Março pelo Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural(MITADER), envolvendo quadros do sector de fiscalização florestal a nível provincial, a Polícia de Protecção dos Recursos Naturais e Meio Ambiente, a Procuradoria Geral da República, as Alfândegas de Moçambique e os Serviços de Informação e Segurança do Estado revelou “um cenário desolador, lastimável e inaceitável de delapidação dos nossos recursos florestas”.
Em 87 dos 123 principais estaleiros e parques de toros visitados nas províncias de Cabo Delgado, Nampula, Zambézia, Tete, Manica e Sofala foram detectadas várias irregularidade, que resultaram em aplicação de multas no valor de 157.423.710 meticais, com destaque para o armazenamento, transporte ou comercialização de recursos florestais ou faunísticos sem autorização, ou em desacordo com as condições legalmente estabelecidas; e a recepção de recursos florestais ou faunísticos sem que se tenha documento comprovativo da autorização do vendedor ou do transportador.
Durante a Operação que está em fase de balanço, e incluiu a fiscalização nos Portos da Beira, Quelimane, Nacala e Cabo Delgado, foram apreendidos 150.982 metros cúbicos de madeira das espécies Umbila, Chanfuta, Pau-ferro, Mondzo, Pau preto, Metonha, Metil, Chanato, Messassa, Nkula e Chacate Preto, sendo que 135.159 metros cúbicos está toros e 15.823 metros cúbicos são de madeira processada e semi-processada.
Junto do MITADER o @Verdade apurou que entre a madeira apreendida 1.917 metros cúbicos corresponde a madeira preciosa, 139.491 metros cúbicos são de madeira de primeira classe, 44 metros cúbicos são de madeira de segunda classe e 9.529 metros cúbicos correspondem a madeira de 3a classe.
“Só não decretamos defeso especial nas outras províncias porque essas já não tem florestas e já não têm madeira”
Foto do MITADERDiscursando no passado dia 6 em Maputo, na 3ª reunião com os Operadores Florestais Madeireiros, o ministro Celso Correia declarou que a forma de exploração que tem sido realizada é um “processo em que o valor sai e fica a pobreza para os moçambicanos, um processo que poderá nos levar dentro de dois a três anos a extinção daquilo que é um recurso que podia resultados para futuras gerações e ser renovável”.
“Estas apreensões dão-nos a responsabilidade de continuar a implementar a reforma e acelerar medidas de forma para salvar a floresta o que impôs que o Governo decretasse um defeso especial na exploração florestal nas províncias de Cabo Delgado, Niassa, Nampula, Zambézia, Tete, Sofala e Manica, por um período de 90 dias. Só não decretamos defeso especial nas outras províncias porque essas já não tem florestas e já não têm madeira”, disse.
De acordo com o governante foi também suspenso o início da campanha anual de corte, que habitualmente inicia a 1 de Abril, “é uma decisão lógica que surge da primeira, queremos reavaliar os processo de licenças de exportação de recursos florestais”.
O ministro da ministro da Terra e Desenvolvimento Rural deixou claro que a Operação Tronco vai prosseguir durante o “tempo necessário para garantir o controlo efectivo da exploração florestal” e que “a nível interno, com base na informação recolhida, iremos abrir processo disciplinares e encaminhamento a Procuradoria da República para funcionários que indiciam suspeita de envolvimento na facilitação das infrações florestais”.
“Não somos ladrões, existem ladrões sim senhor mas há operadores aqui honestos”
Relativamente ao destino da madeira apreendida Correia disse que “a decisão da Nação” é que “com tanta madeira não faz sentido que as crianças moçambicanas continuem sentadas no chão” e desafiou as indústrias presentes na reunião a envolverem-se na produção de carteiras escolares durante o período do defeso. Alguns representantes da indústria de madeira chamaram atenção para o facto das carteiras escolares não serem feitas apenas de madeira, “é preciso ferro, parafusos etc”, todavia o ministro disse em entrevista ao @Verdade que a ideia é vender a madeira preciosa para daí obter os recursos financeiros para pagar as 750 mil carteiras que se pretendem produzir até 2018.
“Quanto tempo vai demorar até nos chegar a madeira, quando tempo vai demorar a organizar as tais hastas públicas, nós estamos em Abril, dessa madeira quanta é adequada para produzir carteiras escolares”, questionou declarou José Cardoso, representante da Moflor que ainda alertou “que a madeira que fica a secar guardada em estaleiro perde qualidade, entra bicho, e se muito rapidamente não for resolvido o problema da madeira que foi arrestada mais de metade da madeira é para o bicho”.
Sobre o período de defeso especial este representante da Moflor referiu que “por causa da conjuntura já estávamos confrontados com plano de negócios negativo e agora o Estado vem dizer-nos que não há receita durante 3 meses”.
“Quando nos é dito no início de Abril vocês não podem comprar madeira ficamos sem stock” declarou Cardoso apelando “não nos tratem a todos como bandidos, encontrem uma forma de nos proteger(...) Compreendendo a necessidade do País por este defeso acho que estão a arrumar com toda a indústria séria deste País. Nós na Moflor não temos capacidade para aguentar 3 meses sem produção. Peço ajudem-nos porque nós possivelmente fechamos a empresa”.
Um representante do grupo Chantel, que tem uma concessão na província de Manica e opera uma indústria em Maputo, revelou que desde o “mês de Setembro para cá não existe nenhum camião que veio para Maputo, as indústrias do Maputo estão paradas. Em relação ao defeso especial já está decidido, só condeno esta questão de decidir sem aviso prévio(...) nós temos as nossas despesas como concessionários, com exploradores, como indústria”.
Tal como o orador que o antecedeu o operador do ramo de madeiras sublinhou que “não somos ladrões, existem ladrões sim senhor mas há operadores aqui honestos. Então não podemos levar pela mesma tabela, há pessoas que investiram rios de dinheiro estamos a pedir a reflexão do defeso especial. Querem arrumar a casa, as nossas casas estão arrumadas, cabe ao MITADER pegar a partir do técnico, fiscal, chefe de serviço, todos corruptos e separar. Mas vou garantir excelência vai ser uma tarefa muito difícil na República de Moçambique”, prognosticou.
“Não há china bom, isso pode ter a certeza”
“Eu sou de uma serração que tem uma capacidade de processamento de 10 metros cúbicos por dia, significa que por semana processo 50 metros cúbicos. Na cidade e província de Maputo existem acima de dez indústrias iguais a minha, então precisam-se acima de 500 metros cúbicos de madeira. Mas neste momento a madeira não está a chegar, estas indústrias todas estão paradas”, lamentou Marcos Simbine, da fábrica de móveis Simbine.
Foto do MITADERNarciso explicou que “o nosso maior problema é que a forma tradicional como se fazia o negócio de madeira mudou drasticamente, a madeira passou a ser tratada como um produto de dumba-nengue. Os exportadores de madeira metem dinheiro no País pelas vias que metem e andam com sacos de dinheiro pela floresta a comprar”.
O operador florestal na província de Cabo Delgado sugeriu que uma vez que as madeiras de segunda classe “estão menos pressionadas deveria ser autorizado a explorar, paramos com a outra e provavelmente será a forma de introduzir essas madeiras no mercado e reduzir a pressão sobre as outras todas”.
“Nós ainda não trabalhamos para acumular, trabalhamos para pagar dívidas(...) quando o Senhor ministro diz que não se pode avisar estão a tratar-nos a todos como bandidos e não é justo. Não se pode penalizar a todos por uma situação com a qual todos concordamos, nós vamos colaborar, todos nós sabemos onde está o problema e sabemos qual é a solução”, concluiu.
Por seu turno Erasmo Valente, operador florestal na Zambézia há cerca de 20 anos, destapou um dos cancros o grande número de cidadãos de nacionalidade chinesa que não se limitam a comprar a madeira dos operadores mas estimulam os furtivos e a exploração ilegal. “(...)O casamento entre nós e os chineses tinha que terminar. Eles que fiquem lá, nós vamos cortar e vamos exportar (…) Nestes 3 meses que vamos ficar a sofrer, eles que também tirem o que é deles”.
“Não há china bom, isso pode ter a certeza, em 20 anos que estou no sector não há china bom, se há não é para madeiras e florestas” disse Erasmo Valente que sugeriu ao ministro Correia que a madeira apreendidas na Operação Tronco “deveria ser devolvida aos exploradores(nacionais) é nossa, foi invadida nas nossas áreas”.
“Qual o critério que usaram para poder contar e calcular o volume da madeira que estava lá”
Falando em nome da Associação Moçambicana dos Madeireiros(AMOMA) Vitória da Silva Coelho deixou claro que os operadores concordam com a acção de fiscalização que o Governo está a realizar mas pediu a “inclusão da AMOMA nas equipas multi-sectoriais”. Vitória da Silva Coelho disse que a Associação as quantidades anunciadas de madeira apreendidas “não conferem a realidade”.
Uma operadora florestal na província de Nampula, Felicidade Elisa, corroborou a posição da AMOMA sobre os 150.982 metros cúbicos de madeira propalados pelo MITADER. “(...) Os técnicos envolvidos não tiveram tempo suficiente para fazer o levantamento que se esperava que fizessem. Chegavam a um estaleiro não ficavam nem 2 horas de tempo, na sua maioria, e diziam neste estaleiro encontramos 20 mil toros. Eu pergunto como é possível e qual o critério que usaram para poder contar e calcular o volume da madeira que estava lá”.
“Vem aqui na Lei que a multa por falta de mapa de especificação são 20 mil meticais e os técnicos que trabalhavam na Operação Tronco aplicavam 150 mil meticais por falta de ficha de especificação. A falta de sigla a multa é de 20 mil meticais mas eles diziam que a multa são 150 mil e a madeira está apreendida e fica à favor do Estado, mas a Lei diz que a madeira aguarda pela regularização da documentação”, indagou Felicidade Elisa mostrando ao ministro a cópia da Lei.
“Os bons estão a ficar poucos no sector das madeiras”
Foto de Adérito CaldeiraO ministro da ministro da Terra e Desenvolvimento Rural reiterou que “toda a Operação Tronco foi feita com transparência, essas constatações de que a madeira é a menos havemos de chegar lá, mas que não seja margem para fazer o que tem sido feito no passado. Sempre que há uma apreensão evapora a madeira, desaparecem contentores e provavelmente agora no terreno está a acontecer uma operação parecida para depois virem dizer que o Estado contou mal, que aquela madeira que a Nação toda viu não existe” .
“Continuaremos firmes neste processo de por os recursos naturais ao serviço dos moçambicanos”, acrescentou o ministro Celso Correia e desfez dúvidas “o mercado chinês interessa-nos, existem chineses sérios (…) não vamos entrar neste jogo que são os chineses, é o mercado amanhã podem ser outros, nós também temos a nossa quota parte neste processo, não vamos entrar em actos de xenofobia”.
O governante reconheceu que os operadores honestos estão a ser prejudicados por um ambiente adverso mas deixou claro que “se não tomarmos estas medidas, daqui a dois anos não temos florestas.
Sobre o modus operandi da Operação Tronco o ministro aclarou que “os bons estão a ficar poucos no sector das madeiras, aqui nesta sala estão cem mas existem mais de mil concessões(...) como é que avisamos ao bandido que queremos prender-te, o que acontece é que sempre que queremos tomar alguma medida vão as matas e parece que é o última ceia, rapam tudo, não somos ingénuos(...) o que está em causa é muito superior a interesses particulares ”.
“Nós não vamos deixar a indústria cair, mas a situação é delicada, se nós não tomarmos as medidas que estamos a tomar daqui a dois anos vamos ter de fazer a mesma coisa que fizeram na Tanzania que é suspender o corte definitivamente”, explicou Celso Correia pedindo aos participantes do encontro para apresentarem propostas concretas sobre como “o Governo pode proteger os que são sérios”.
Relativamente a exportação Correia disse que o Governo tem “de definir um novo modelo de exportação da madeira, é o mercado que está a pressionar”.
O ministro afirmou ainda que a 3ª reunião com os Operadores Florestais Madeireiros foi também uma forma de “auscultar como podemos construir um melhor defeso” e frisou que “a parte mais difícil do trabalho começa agora, a Operação Tronco deveria ser rotina, não deveríamos celebrar uma acção de fiscalização”.

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