domingo, 29 de novembro de 2015

Independência editorial e pluralismo de opinião

Em Moçambique há fartas evidências empíricas demonstrando que as ameaças à independência editorial, também determinantes para a limitação do pluralismo de opinião, podem vir tanto da interferência política, como da acção do poder económico (das empresas) e igualmente, do crime organizado. Não obstante esta combinação de factores não ter necessariamente as mesmas causas, interesses e fi- nalidades, eles se coligem para desestabilizar a identidade jornalística (linhas editoriais) e a missão da profissão. Ademais, importa real- çar que cada um dos componentes do triângulo condicionador dos media tem maior ou menor grau de incidência quanto se trate do sector privado ou do Sector Público da Comunicação Social. O sector público da Comunicação Social Há muito que tenho defendido a asserção segundo a qual uma direcção editorial e um corpo redactorial têm maior probabilidade de cumprir e seguir uma linha editorial com profissionalismo, credibilidade e fazer com que um determinando Órgão de Imprensa responda ao preceituado na lei de imprensa, quanto maior for a sua condição de liberdade política de gestão editorial. Parto do pressuposto de que, por exemplo, a Rádio Moçambique e a Televisão de Moçambique devem desempenhar a função primordial de trazer ao plano prático e pragmático toda a teorização, princípios legais e constitucionais democráticos resumidos no seguinte: as instituições públicas são os polos gregários dos interesses manifestados por opiniões de todos os moçambicanos individuais ou colectivamente. Dito de outro modo: quando evocamos a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa espera-se destes órgãos que sejam a referência da inclusão política que, felizmente, tem sido um dos grandes apanágios da governação do Presidente Nyusi que deixa antever “uma luz no fundo do túnel”. Lamentavelmente, a nossa histó- ria de relacionamento político- -comunicacional gerou uma falsa percepção, quase que generalizada, de que, por analogia, vivemos uma espécie dum mau enredo tirado dum péssimo filme de Hollywood, no qual o capturado, ou seja o raptado, depois de vários anos de sevícias e de longo período no cativeiro, acabou se apaixonando pelo raptor, explicando isso, em parte, por que razão foi ” rasgado por determinados editores” o artigo 2 serviço prestado pelas empresas, contra a mentira da publicidade enganosa, contra a fuga ao fisco. A corrupção passa a ter apenas uma face: a do corrompido. O corruptor está na sombra, fusco, portanto invisí- vel. t /P FYUSFNP RVBOEP P DBQJUBM está associado a interesses políticos, os media transformam- -se numa arma de arremesso contra as instituições ou empresas rivais e concorrentes, porque a abordagem jornalística descura intencionalmente o seu lado mais profissional: a objectividade e a diversidade de opinião. A este ponto, o jornal, a televisão, a estação da rádio, já foram capturados. *antigo director editorial do jornal “Notícias”. Excerto editado pelo SAVANA da intervenção na conferência promovida pelo CSCS a 23.11.15. Referências Bibliográficas “Barómetro Africano da Media”. Friedrich-Stifung (FES). ISBN.2014 De LIMA,Venício. Existe jornalismo independente? Disponível em http:// observatoriodaimprensa.com.br/interesse-publico/existe_jornalismo_independente/. Acesso em 9.11.2015 FRIEDBERG, Erhard. “O Poder e a Regra”. Sociedade Astória: Lisboa.1003 FORQUILHA, Salvador, e ORRE, Aslak. “ Transformações sem Mudanças, in: Luís de Brito et al (Org.), Desafios para Moçambique”. Maputo: IESE. 2011. HACKETT, Robert. “Declínio de um paradigma? A parcialidade e a objectividade nos estudos dos media noticiosos”. In: Traquina, Nelson et al (Org.), Jornalismo: “questões, Teorias e Estórias”: Vega. Lisboa.1999. TRAQUINA, Nelson (Org.). Jornalismo: “questões, Teorias e Estórias”: Vega. Lisboa.1999 WOLTON, Dominique. “Pensar a Comunicação”. Difusão Editorial:Portugal.1997. Independência editorial e pluralismo de opinião Por Rogério Sitoe* grande interesse com que o crime organizado segue as dinâmicas da imprensa, basta recordarmo-nos do bárbaro assassinato do editor Carlos Cardoso. Duplo constrangimento A primeira ilação que tiramos da interferência do poder económico e do crime organizado é de que ela gera um duplo constrangimento nos media. Regra geral coloca em dependência os proprietários das empresas jornalísticas e, em segundo lugar, esta dependência, pode condicionar a independência editorial, tendo em conta a respectiva linha editorial. No reverso da história e no que respeita aos jornalistas, esta rela- ção promíscua, gera nas Redacções uma onda de desordem, onde os menos éticos vão cobrando e recebendo dinheiro a troco de favores “editoriais” até ficarem completamente capturados pelo Capital. Portanto, este fenómeno, que é igualmente extensivo à relação com diversas organizações, deixa vulnerável o órgão de informação que, gradualmente, vê os seus jornalistas a agirem por conta própria, “abrindo as suas próprias “bancas” de chantagem e extorsão às empresas e instituições, trocando a publicação de histórias jornalísticas ou, sob forma de publicidade redigida ou, a não publicação de histórias aparentemente comprometedoras em troca de dinheiro e outros favores. É evidente que este cenário se afi- gura numa verdadeira via repleta de armadilhas: t 5SBOTmHVSB B JOEFQFOEÐODJB FEJtorial. Ela esvai-se e deixa os gestores editoriais e os jornalistas a mercê de quem paga e quem financia e das redes a eles inerentes. Torna perversa a profissão e corrompe o jornalismo e o jornalista. t 3JTDP B JOGPSNBÎÍP EFJYB EF simbolizar a luta contra o mau da Lei de Imprensa sobre” o princípio da independência editorial. (síndrome de Estocolmo, NdR) Não creio, aliás tenho a certeza que é apenas uma percepção negativa, produto de um processo histórico de gestão comunicacional também negativa, porque produto de uma violenta interferência política que quase sequestra o sector público da comunicação. Não vejo simples “paixão do capturado”, mas sim vários imperativos condicionadores. Refiro-me a situações históricos em que a pirâmide fica de facto invertida, gerando-se um contra- -senso comunicacional, uma desmoralização do editor, do jornalista e uma frustração de parte considerável de ouvintes e telespectadores e, quiçá, leitores. Que condições objectivas favorecem este fenómeno? t 2VBOEP PT DFOUSPT EF EFDJTÍP editorial não estão nas Redac- ções. Quando estes estão em nichos exteriores liderados por pessoas que não sendo jornalistas operam, portanto, a base de paradigmas não jornalísticos; t /FTUBT DPOEJÎÜFT B QPMÓUJDB transgride as normas jornalísticas e somente vê a eficácia dos meios de comunicação social, normalmente como ve- ículo das perspectivas oficiais ou de grupos restritos de interesse político; t A primeira consequência é que no lugar de se fazer jornalismo com uma pequena dose de propaganda, por vezes mais tolerável, se produz propaganda com uma pequena dose de jornalismo; t &N TFHVOEP MVHBS FTUÈ P QPtencial de geração de uma cadeia de conflitos entre quem de fora interfere com múltiplas “ordens superiores ou ordens de cima”, para quem as recebe (editores) e quem as deve cumprir (o jornalista); t &N UFSDFJSP MVHBS WJPMFOUB TF o profissionalismo, as regras deontológicas da profissão e instala-se nas Redacções o laissez faire et laisser passer; t &N RVBSUP MVHBS PT media sujeitos a esta condição perdem a credibilidade e vêem reduzidas substancialmente as audiências, os ouvintes e leitores. t /FTUF QFSDVSTP TJOVPTP F USBVmático, por fim, os programas públicos do governo, portanto de interesse comum sobre a Educação, Sociedade, Saú- de, Democracia, Agricultura, Desporto etc., etc., perdem audiência e impacto massificador desejado, em decorrência da perda da audiência dos media. Com efeito, a ruptura com estes modelos compressores é um imperativo democrático e do profissionalismo no jornalismo moçambicano, visando: t 1SPNPWFS NBJPS QSPmTTJPOBMJTmo e credibilidade jornalística, do editor e do jornalista;Maior abrangência da mensagem de interesse público; t 1FSNJUJS RVF PT media públicos assegurem melhor a sua tripla função democrática: como elo sócio-político, como impulsionador da identidade nacional e como vigilante dos poderes públicos. O sector privado da Comunicação Social Referi-me anteriormente que os jornalistas, regra geral, esgrimem- -se na luta pela liberdade política, tanto como se esta fosse o único condicionalismo da independência editorial, quando a lógica económica emergente em Moçambique e o crime organizado podem ser tão condicionantes quanto à interferência política. Por isso, a análise política que enfatiza os meios públicos não nos deve fazer descurar a problemática dos meios privados da comunica- ção social. Antes e pelo contrário, nos últimos anos têm havido evidências de como este componente tende a agravar-se, em parte por culpa da fraca sustentabilidade económica dos meios de comunicação social privados e do declínio de valores sócio-profissionais. Neste contexto, o problema não é tanto a liberdade política, mas mais o peso económico e do crime organizado e os seus efeitos sobre a liberdade de informação. Os condicionalismos económicos e do crime organizado Em Moçambique, temos a probabilidade de assistir a um crescendo deste fenómeno, à medida que o capital se for implantando mais, gerando a clássica situação de empresas disputando influenciar e capturar os media. Os meios usados são indubitavelmente a publicidade, a disponibilização do capital para os donos das empresas jornalísticas, a fim de cobrirem salários e outras necessidades inerentes ao funcionamento do medium e encobrirem o mau desempenho de empresas públicas, por exemplo. Noutro extremo situa-se o crime organizado, que impõe o silêncio sobre actos criminais e corruptos, por um lado, e, por outro, que conquista espaços nos media para disputar decisões judiciais ou antecipar tais decisões. Para ilustrar o OPINIÃO O triângulo condicionador dos Media

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