Em Moçambique há fartas
evidências empíricas
demonstrando que as
ameaças à independência
editorial, também determinantes
para a limitação do pluralismo de
opinião, podem vir tanto da interferência
política, como da acção do
poder económico (das empresas) e
igualmente, do crime organizado.
Não obstante esta combinação de
factores não ter necessariamente
as mesmas causas, interesses e fi-
nalidades, eles se coligem para desestabilizar
a identidade jornalística
(linhas editoriais) e a missão da
profissão. Ademais, importa real-
çar que cada um dos componentes
do triângulo condicionador dos
media tem maior ou menor grau
de incidência quanto se trate do
sector privado ou do Sector Público
da Comunicação Social.
O sector público da
Comunicação Social
Há muito que tenho defendido
a asserção segundo a qual uma
direcção editorial e um corpo redactorial
têm maior probabilidade
de cumprir e seguir uma linha
editorial com profissionalismo,
credibilidade e fazer com que um
determinando Órgão de Imprensa
responda ao preceituado na lei de
imprensa, quanto maior for a sua
condição de liberdade política de
gestão editorial.
Parto do pressuposto de que, por
exemplo, a Rádio Moçambique e
a Televisão de Moçambique devem
desempenhar a função primordial
de trazer ao plano prático
e pragmático toda a teorização,
princípios legais e constitucionais
democráticos resumidos no seguinte:
as instituições públicas são
os polos gregários dos interesses
manifestados por opiniões de todos
os moçambicanos individuais
ou colectivamente.
Dito de outro modo: quando evocamos
a liberdade de expressão e
a liberdade de imprensa espera-se
destes órgãos que sejam a referência
da inclusão política que, felizmente,
tem sido um dos grandes
apanágios da governação do Presidente
Nyusi que deixa antever
“uma luz no fundo do túnel”.
Lamentavelmente, a nossa histó-
ria de relacionamento político-
-comunicacional gerou uma falsa
percepção, quase que generalizada,
de que, por analogia, vivemos uma
espécie dum mau enredo tirado
dum péssimo filme de Hollywood,
no qual o capturado, ou seja o raptado,
depois de vários anos de sevícias
e de longo período no cativeiro,
acabou se apaixonando pelo
raptor, explicando isso, em parte,
por que razão foi ” rasgado por
determinados editores” o artigo 2
serviço prestado pelas empresas,
contra a mentira da publicidade
enganosa, contra a fuga
ao fisco. A corrupção passa a
ter apenas uma face: a do corrompido.
O corruptor está na
sombra, fusco, portanto invisí-
vel.
t /P FYUSFNP
RVBOEP P DBQJUBM
está associado a interesses políticos,
os media transformam-
-se numa arma de arremesso
contra as instituições ou empresas
rivais e concorrentes,
porque a abordagem jornalística
descura intencionalmente
o seu lado mais profissional:
a objectividade e a diversidade
de opinião. A este ponto, o
jornal, a televisão, a estação da
rádio, já foram capturados.
*antigo director editorial
do jornal “Notícias”. Excerto
editado pelo SAVANA
da intervenção na
conferência promovida
pelo CSCS a 23.11.15.
Referências Bibliográficas
“Barómetro Africano da Media”. Friedrich-Stifung
(FES). ISBN.2014
De LIMA,Venício. Existe jornalismo
independente? Disponível em http://
observatoriodaimprensa.com.br/interesse-publico/existe_jornalismo_independente/.
Acesso em 9.11.2015
FRIEDBERG, Erhard. “O Poder e a
Regra”. Sociedade Astória: Lisboa.1003
FORQUILHA, Salvador, e ORRE, Aslak.
“ Transformações sem Mudanças, in:
Luís de Brito et al (Org.), Desafios para
Moçambique”. Maputo: IESE. 2011.
HACKETT, Robert. “Declínio de um
paradigma? A parcialidade e a objectividade
nos estudos dos media noticiosos”.
In: Traquina, Nelson et al (Org.), Jornalismo:
“questões, Teorias e Estórias”:
Vega. Lisboa.1999.
TRAQUINA, Nelson (Org.). Jornalismo:
“questões, Teorias e Estórias”: Vega.
Lisboa.1999
WOLTON, Dominique. “Pensar
a Comunicação”. Difusão
Editorial:Portugal.1997.
Independência editorial e pluralismo
de opinião
Por Rogério Sitoe*
grande interesse com que o crime
organizado segue as dinâmicas da
imprensa, basta recordarmo-nos
do bárbaro assassinato do editor
Carlos Cardoso.
Duplo constrangimento
A primeira ilação que tiramos da
interferência do poder económico
e do crime organizado é de que ela
gera um duplo constrangimento
nos media. Regra geral coloca
em dependência os proprietários
das empresas jornalísticas e, em
segundo lugar, esta dependência,
pode condicionar a independência
editorial, tendo em conta a respectiva
linha editorial.
No reverso da história e no que
respeita aos jornalistas, esta rela-
ção promíscua, gera nas Redacções
uma onda de desordem, onde os
menos éticos vão cobrando e recebendo
dinheiro a troco de favores
“editoriais” até ficarem completamente
capturados pelo Capital.
Portanto, este fenómeno, que é
igualmente extensivo à relação
com diversas organizações, deixa
vulnerável o órgão de informação
que, gradualmente, vê os seus jornalistas
a agirem por conta própria,
“abrindo as suas próprias “bancas”
de chantagem e extorsão às empresas
e instituições, trocando a
publicação de histórias jornalísticas
ou, sob forma de publicidade
redigida ou, a não publicação de
histórias aparentemente comprometedoras
em troca de dinheiro e
outros favores.
É evidente que este cenário se afi-
gura numa verdadeira via repleta
de armadilhas:
t 5SBOTmHVSB B JOEFQFOEÐODJB FEJtorial.
Ela esvai-se e deixa os
gestores editoriais e os jornalistas
a mercê de quem paga
e quem financia e das redes a
eles inerentes. Torna perversa
a profissão e corrompe o jornalismo
e o jornalista.
t 3JTDP B JOGPSNBÎÍP EFJYB EF
simbolizar a luta contra o mau
da Lei de Imprensa sobre” o princípio
da independência editorial.
(síndrome de Estocolmo, NdR)
Não creio, aliás tenho a certeza
que é apenas uma percepção negativa,
produto de um processo histórico
de gestão comunicacional
também negativa, porque produto
de uma violenta interferência política
que quase sequestra o sector
público da comunicação. Não vejo
simples “paixão do capturado”,
mas sim vários imperativos condicionadores.
Refiro-me a situações históricos
em que a pirâmide fica de facto
invertida, gerando-se um contra-
-senso comunicacional, uma desmoralização
do editor, do jornalista
e uma frustração de parte
considerável de ouvintes e telespectadores
e, quiçá, leitores.
Que condições objectivas favorecem
este fenómeno?
t 2VBOEP PT DFOUSPT EF EFDJTÍP
editorial não estão nas Redac-
ções. Quando estes estão em
nichos exteriores liderados por
pessoas que não sendo jornalistas
operam, portanto, a base
de paradigmas não jornalísticos;
t /FTUBT DPOEJÎÜFT
B QPMÓUJDB
transgride as normas jornalísticas
e somente vê a eficácia
dos meios de comunicação
social, normalmente como ve-
ículo das perspectivas oficiais
ou de grupos restritos de interesse
político;
t A primeira consequência é
que no lugar de se fazer jornalismo
com uma pequena
dose de propaganda, por vezes
mais tolerável, se produz
propaganda com uma pequena
dose de jornalismo;
t &N TFHVOEP MVHBS FTUÈ P QPtencial
de geração de uma cadeia
de conflitos entre quem
de fora interfere com múltiplas
“ordens superiores ou ordens
de cima”, para quem as recebe
(editores) e quem as deve
cumprir (o jornalista);
t &N UFSDFJSP MVHBS
WJPMFOUB TF
o profissionalismo, as regras
deontológicas da profissão e
instala-se nas Redacções o
laissez faire et laisser passer;
t &N RVBSUP MVHBS
PT media sujeitos
a esta condição perdem a
credibilidade e vêem reduzidas
substancialmente as audiências,
os ouvintes e leitores.
t /FTUF QFSDVSTP TJOVPTP F USBVmático,
por fim, os programas
públicos do governo, portanto
de interesse comum sobre a
Educação, Sociedade, Saú-
de, Democracia, Agricultura,
Desporto etc., etc., perdem audiência
e impacto massificador
desejado, em decorrência da
perda da audiência dos media.
Com efeito, a ruptura com estes
modelos compressores é um imperativo
democrático e do profissionalismo
no jornalismo moçambicano,
visando:
t 1SPNPWFS NBJPS QSPmTTJPOBMJTmo
e credibilidade jornalística,
do editor e do jornalista;Maior
abrangência da mensagem de
interesse público;
t 1FSNJUJS RVF PT media públicos
assegurem melhor a sua tripla
função democrática: como elo
sócio-político, como impulsionador
da identidade nacional
e como vigilante dos poderes
públicos.
O sector privado da
Comunicação Social
Referi-me anteriormente que os
jornalistas, regra geral, esgrimem-
-se na luta pela liberdade política,
tanto como se esta fosse o único
condicionalismo da independência
editorial, quando a lógica económica
emergente em Moçambique
e o crime organizado podem
ser tão condicionantes quanto à
interferência política.
Por isso, a análise política que enfatiza
os meios públicos não nos
deve fazer descurar a problemática
dos meios privados da comunica-
ção social. Antes e pelo contrário,
nos últimos anos têm havido evidências
de como este componente
tende a agravar-se, em parte por
culpa da fraca sustentabilidade
económica dos meios de comunicação
social privados e do declínio
de valores sócio-profissionais.
Neste contexto, o problema não
é tanto a liberdade política, mas
mais o peso económico e do crime
organizado e os seus efeitos sobre
a liberdade de informação.
Os condicionalismos
económicos e do crime
organizado
Em Moçambique, temos a probabilidade
de assistir a um crescendo
deste fenómeno, à medida
que o capital se for implantando
mais, gerando a clássica situação
de empresas disputando influenciar
e capturar os media. Os meios
usados são indubitavelmente a
publicidade, a disponibilização do
capital para os donos das empresas
jornalísticas, a fim de cobrirem
salários e outras necessidades
inerentes ao funcionamento do
medium e encobrirem o mau desempenho
de empresas públicas,
por exemplo.
Noutro extremo situa-se o crime
organizado, que impõe o silêncio
sobre actos criminais e corruptos,
por um lado, e, por outro, que conquista
espaços nos media para disputar
decisões judiciais ou antecipar
tais decisões. Para ilustrar o
OPINIÃO
O triângulo condicionador dos Media
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