Jihadistas libertaram presos de centro de detenção anti-terrorista e estão a identificar os habitantes da cidade leais ao governo iraquiano.
Dias depois da tomada da cidade iraquiana de Ramadi pelo autoproclamado Estado Islâmico começam a realinhar-se as forças em confronto. As milícias xiitas que apoiam o Governo iraquiano estão a agrupar-se nas imediações da cidade e os jihadistas preparam a defesa do novo bastião e eliminam os focos de oposição que restam.
Nos últimos dias, cerca de 25 mil pessoas fugiram da cidade que é capital da província de Anbar (no centro do país, a pouco mais de cem quilómetros a Oeste de Bagdad), de acordo com dados das Nações Unidas. Ramadi, que chegou a ter 850 mil habitantes, é descrita por correspondentes no terreno como uma cidade fantasma. Abundam agora as ruas desertas e as lojas e as casas de sunitas associados ao Governo de Bagdad foram invadidas e saqueadas.
A tomada de Ramadi é a principal conquista estratégica do Estado Islâmico em vários meses, comparada apenas, segundo alguns analistas, à progressão no Verão do ano passado pelo Norte do país. Depois de combates intensos nos últimos dias, o grupo terrorista passou agora à consolidação do seu poder no novo bastião. Esta terça-feira viam-se já as bandeiras negras do grupo hasteadas na principal mesquita e em edifícios administrativas, segundo várias testemunhas.
Os combatentes do Estado Islâmico iniciaram igualmente uma espécie de purga entre a população da cidade: munidos de listas, têm ido, de porta a porta, identificando os habitantes de tribos pró-governamentais e membros da polícia e das forças armadas. Seguir-se-á um julgamento de acordo com as leis da Sharia – o direito islâmico prescrito pelo Corão, que o Estado Islâmico aplica à letra.
Para tentar cativar o apoio dos habitantes que permanecem em Ramadi, os jihadistas libertaram uma centena de presos de um centro de detenção de anti-terrorismo. “O Estado Islâmico utilizou megafones para apelar às pessoas que têm familiares na prisão para se concentrarem junto da mesquita principal no centro da cidade para os recolher”, disse à Reuters Saed Hammad al-Dulaimi, um professor de 37 anos. O grupo jihadista pretende, desta forma, conseguir apoios entre uma população que se queixa frequentemente das detenções arbitrárias na região.
Um "revés" para os EUA
A perda de Ramadi foi descrita por Washington como um “revés”, mas a Administração de Barack Obama garantiu de imediato que a coligação internacional por si liderada não iria poupar esforços na reconquista. Para além da proximidade à capital iraquiana, a retirada da principal cidade de Anbar significa também que o esforço para remover o Estado Islâmico desta região de maioria sunita está a ser infrutífero.
O sucesso da estratégia seguida pelos Estados Unidos – que combina ataques aéreos com operações especiais limitadas a alvos da hierarquia do grupo – é também posto em causa com a tomada da cidade. “O ISIS [acrónimo do grupo em inglês] tem-se mostrado resistente a estas operações militares e capaz de suportar os danos que lhe são infligidos”, escreve na CNN o coronel na reserva, Peter Mansoor.
A resposta à queda de Ramadi está já a ser preparada. O Governo iraquiano mobilizou cerca de três mil combatentes pertencentes a milícias xiitas que se concentraram na base militar de Habbaniyah, nas imediações da cidade. Na terça-feira, um grande número de forças xiitas posicionou-se em Husaybah, uma localidade ainda mais próxima de Ramadi, segundo o chefe da polícia da região, Khadim al-Fahdawi mas a contra-ofensiva não deverá ser lançada de imediato. “A operação militar para libertar Ramadi e Anbar não irá começar até que todos os requisitos sejam cumpridos”, disse à AFP Al-Fahdawi. Enquanto o grupo continuar a tentar progredir para além dos limites da cidade – ainda esta terça-feira foram travados quando tentavam tomar Khaldiyah, entre Ramadi e Fallujah – a reconquista deverá permanecer em stand-by.
Porém, o protagonismo crescente das forças xiitas – fundamentais nas principais conquistas das forças governamentais, como a da cidade de Tikrit, em Abril – na luta contra o Estado Islâmico, de inspiração sunita, pode contribuir para aumentar a polarização social na região. Anbar é uma província de maioria sunita e a sua população tem sofrido com a exclusão promovida pelo aparelho de Estado iraquiano, quase totalmente controlado por xiitas. A reacção normal é a atracção pelo Estado Islâmico que capitaliza com as clivagens entre os dois ramos do Islão. “Eles dão trabalho aos desempregados e pagam os salários a tempo”, dizia recentemente àEconomist Tarik Alabdullah al-Halbusi, chefe das 13 tribos sunitas de Anbar.
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