quarta-feira, 22 de abril de 2015

É Possível Erradicar a Palhota, como habitação, em Moçambique. Mas Como?

Por: Raúl Chambote, 16 Março 2015 

Num tom provocador, escrevi e postei no meu perfil do facebook no dia 28 de Setembro de 2014 o seguinte: “Oh, candidatos às Eleições Presidenciais de 15 de Outubro de 2014, peço para que cada um de vós os três (o da Frelimo, o da Renamo e o do MDM), coloque o seguinte nos vossos futuros planos de governação, em caso de vitória eleitoral, uma meta: erradicar a palhota como habitação nos distritos onde existem operações mineiras. Por exemplo em Tete, os distritos de Moatize e Marara deviam ser declarados livre de palhotas até 2019; em Inhambane, os de Pande e Inhassoro deviam ser declarados livres de palhotas até 2019; em Nampula, os distritos de Moma e Nacala deviam ser declarados livres de palhota e finalmente, em Cabo Delgado, Palma devia ser declarada livre de palhota até 2020. Será isso muito dificil de cumprir, oh meus candidatos da Patria Amada?”. O fundamento da minha provocação basea-se no facto de que a palhota, quer como habitação ou mero conceito, não consta nem no lêxico político moçambicano como símbolo da nossa auto-estima e o Plano Quinquenal de Governo 2015-2019, embora mencione a palavra habitação, ignora a questão da erradicação da palhota como habitação. Porque me interessa a questão da palhota, os dados na imagem extraídos do Instituto Nacional de Estatísticas (INE) ajudam-nos a compreender a dimensão do problema se tivermos que comparar o número total da população na totalidade da extensão do Distrito de Moatize e os que ainda tem a palhota como residência. Cfr. INE (2013)


Estatistica do Distrito de Moatize, Novembro 2013, nos Quadros 2.7 e 3.1. 
MOATIZE EM 2014 População 327.437 
Casas com parede de capim 2.524 
Casas com parede maticada 28.559 
Casas com cobertura de capim 40.738 
Fonte: INE. III Recenseamento Geral da População e Habitação 2007 

Logo que postei o texto, tive pelo menos, duas importantes contribuições. Primeira, do Silvestre Baessa que propõe que os planos estratégicos provinciais e distritais deveriam incluir a erradicação da palhota. Nesse ponto acrescento, erradicação gradual da palhota em toda extensão duma província ou dum distrito. Mas como? Iniciemos primeiro com a planificação e depois precisamos ter a vontade e firmeza de assim fazer, pois não consta em nenhuma política de habitação de Moçambique manifesta vontade de erradicar as palhotas em Moçambique. Ouso afirmar que palhota não é nenhum símbolo de auto-estima dos Moçambicanos, quer dos que vivem nas zonas rurais quer das urbanas. E mais, já na 8ª Sessão do Comité Central da FRELIMO realizada em Fevereiro de 1976 e a campanha de planificação no âmbito das Aldeias Comunais lançada após o Seminário de Marrupa, nos remete a importância de planificação para melhor respondermos o desafio milenar: erradicar a palhota como habitação em Moçambique. Segunda, do Sérgio Padeiro, que questiona porque erradicar palhotas numas zonas enquanto se exclui as outras. Interessante interpelação mas peca, por estar inserida numa justeza   descontextualizado de principios de equidade, pelas seguintes razôes: (i) Moatize e Marara, Pande e Inhassoro, Moma e Nacala; finalmente Palma, são os distritos onde operam algumas das maiores companhias mineiras do mundo. Excluindo a lacuna de legislação nacional em muitos aspectos em relação as comunidades hospedeiras dessas empresas, a inexperiência do Estado em lidar com aquelas nesses assuntos, os interesses dos indivíduos que lidam com processos de interação empresa-comunidade, reconfiguraram relações de poder viradas para gestão de expectativas: impostos para o Estado, compensações para as comunidades. Quanto a mim, essa é mera discussão fugidia sobre o papel e responsabilidade do Estado versus a finalidade e o papel dessas empresas enquanto segmentos produtivos da economia. Há necessidade de abordar, de forma pragmática a questão habitacional da população por ser estrutural para que gradualmente se ajuste a dinâmica da presença dessas mineradoras. Portanto, habitação diferente da palhota pode ser enquadrada de forma selectiva e gradual. Vozes se levantarão defendendo que não se pode mudar os modos de vida das pessoas sem consentimento daqueles. Seja como for, consultemo-los se é mesmo de livre vontade que as pessoas vivem em palhotas. Presumir que o Estado pode fazer tudo para a população e ao mesmo tempo é pura miragem. (ii) È momento oportuno para lembrar ao Governo da Frelimo que foi essa a sua visão de transformação rumo ao desenvolvimento das zonas rurais desde que assumiu a direcção do Estado Moçambique. Desenvolvimento e transformação é discurso oficial da Frelimo desde os primórdios da sua existência. Por exemplo, as Aldeias Comunais foram propostas nesses moldes. As fracassadas Aldeias do Milênio de Chibuto, Lionde, Cahora Bassa e outras, apesar de terem sido colocados de lado as lições das Aldeias Comunais tinham, pelo menos na visão política nacional, e não do Prof. Jefrey Sachs, essa visão de transformação. Agora que estamos em paz e presença de poderosas empresas, da qual o Estado extrai rendimentos por via de impostos, é chegado o momento de pensar seriamente sobre como se pretende transformar a estrutura habitacional das pessoas nas zonas rurais. (iii) Uma coisa é iniciar a discussão da ideia, mas a outra é tomar uma decisão sobre ela, que neste caso é da soberana responsabilidade do Estado assim fazer em cumprimento do contrato social. Portanto, responsabilidade do Estado não deve em nenhum momento ser confundida com a vontade das empresas no quadro de responsabilidade social corporativa e/ ou plano de desenvolvimento social para o caso das mineradoras com responsabilidade legal de fazer o reassentamento e restauração de modos de vida das pessoas afectadas pelas operações mineiras. Portanto, não se trata de exclusão mas sim trata-se de definir o ponto de partida de uma acção de longo prazo. Numa insistência minha sobre o post, uma antiga estudante minha sugeria que seria melhor ensinar as pessoas a aprender a construir as palhotas e que são boas para viver. Respeito o comentário mas achei-o frágil por estar descontextualizado, pois a tal estudante nunca experimentou em toda a vida dela o que significa ter palhota como residência. Por isso, mesmo melhorada, uma palhota será sempre palhota. Ou engajamo-nos em transformação deveras ou ficamos em insinuamos de que a população “sente-se melhor naquele meio ambiente” como alguns tentam fazer passar a mensagem, remetendo a maioria no subdesenvolvimento quando o discurso é pro-desenvolvimento. Para terminar, tendo o novo Governo de Moçambique já sido formado, hoje reitero que gostava de ver incluido no Plano Quinquenal do Governo 2015-19 a questão da erradicação da palhota como habitação em Moçambique e não simplesmente a demarcação de 200.500 talhões e construção de apenas 35.000 casas até 2019 (PQG, p. 20). O Governo de Moçambique pode fazer mais. Ou pelo menos, que fossem declarados livres de palhotas como habitação os distritos de Pande em Inhambane; Moatize em Tete; Moma em Nampula e Palma em Cabo Delgado em 2019. Só assim podemos testar nossa vontade e determinação de desenvolver Moçambique transformando a vida das pessoas nas zonas rurais.

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