O presidente do Iêmen, Abd Rabbo Mansour Hadi, e os milicianos xiitas, que ocuparam o seu palácio, concluíram, na noite desta quarta-feira (hora local) um acordo para encerrar a crise que se instalou no país, após vários dias de violência na capital, Sanaa, noticiou a agência Saba.
Segundo o acordo, os milicianos vão deixar o palácio presidencial e libertar o chefe de gabinete de Hadi, sequestrado no sábado. Em troca, o projecto de Constituição, ao qual se opõem, poderá sofrer emendas, acrescentou a agência.
Em Washington, o secretário de Estado americano, John Kerry, disse a jornalistas que o governo iemenita vai "aceitar, se não todas, a maioria das objecções que os huthis tinham" a fim de encerrar a crise, após vários dias de violência na capital que causaram pelo menos 35 mortos e 94 feridos.
"Os huthis rejeitaram de forma violenta a recusa do governo de Abd Rabo Mansur Hadi em aceitar todas as suas demandas relativas ao acordo de paz e cooperação", disse Kerry após conversar com Federica Mogherini, chefe política externa da União Europeia.
Isto levou à violência e "algumas das instituições foram afectadas e estão em problemas", acrescentou Kerry.
O chefe da diplomacia americana destacou que a poderosa milícia rebelde declarou que Abd Rabo Mansur Hadi ainda é presidente e que os funcionários americanos estavam a espera para celebrar outra reunião com o cercado líder iemenita.
Isto poderia "determinar, da sua perspectiva, qual é a actual situação (no Iêmen)", explicou Kerry, após ser consultado sobre a confusa sucessão de eventos na capital iemenita, onde a milícia enfrentou as forças do governo esta semana. "A situação estava calma no Iêmen há algum tempo. O nosso pessoal está bem protegido", acrescentou.
Kerry disse, ainda, que irá à Casa Branca para discutir a crise que afectou o aliado americano, uma peça-chave no combate de Washington contra a Al-Qaeda.
Crise no Iêmen afeta aliado americano
Nos últimos dias, o agravamento da situação no país africano, aliado dos Estados Unidos na luta contra a Al-Qaeda, preocupava cada vez mais a comunidade internacional. Em Washington, um alto funcionário do governo tinha dito mais cedo à AFP que os Estados Unidos estão a acompanhar de perto a crise no país africano.
O presidente, Barack Obama, "está sendo informado (sobre a rebelião) pela sua equipa de segurança", afirmou o funcionário.
"Condenamos energicamente a violência e aqueles que a usam num esforço de impedir a transição política no Iêmen", prosseguiu, pedindo para ter sua identidade preservada.
"Continuaremos a apoiar todos os esforços para se chegar a uma solução pacífica", acrescentou.
Nesta quarta, autoridades do Pentágono também anunciaram que o exército americano estava pronto para retirar o pessoal da embaixada dos Estados Unidos, caso necessário, mas por enquanto nenhuma decisão tinha sido tomada neste sentido. Os combates pararam nesta quarta-feira na capital do Iêmen, Sanaa, onde o "golpe" dos milicianos xiitas enfraqueceu consideravelmente o presidente que, no entanto, recebeu o apoio do sul do país e das monarquias do Golfo. Os huthis entraram na terça-feira no complexo presidencial e cercaram a residência do primeiro-ministro.
Condenação internacional
Após o Conselho de Segurança das Nações Unidas fazê-lo na terça-feira, os países árabes do Golfo, vizinhos do Iêmen, acusaram nesta quarta a milícia xiita Ansaruallah de dar "um golpe contra o poder legítimo" com a tomada do palácio presidencial. Os países do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) expressaram seu apoio ao presidente Abd Rabbo Mansur Hadi, no cargo há três anos, desde a saída, sob pressão popular, do antecessor Ali Abdallah Saleh.
Apesar do novo revés, Hadi se disse disposto a reunir todas as forças políticas, inclusive a milícia Ansaruallah, para encontrar uma saída pacífica para a crise. Esta reunião deve acontecer após a chegada a Sanaa do emissário da ONU para o Iêmen, Jamal Benomar, segundo uma fonte presidencial.
Aeroporto e porto fechados no sul
Em apoio ao presidente, as autoridades no sul do país fecharam nesta quarta-feira o aeroporto internacional e o porto de Áden, depois da tomada pelas milícias xiitas do palácio presidencial.
O Comité de Segurança da província de Áden, leal ao presidente, anunciou o fecho do aeroporto e do porto em protesto contra "o ataque ao símbolo da soberania nacional e da legalidade constitucional que é o presidente".
Em Sanaa, a situação parecia calma nesta quarta, após os confrontos violentos entre os milicianos xiitas, conhecidos como huthis, e a guarda presidencial, segunda e terça-feiras.
O líder miliciano Abdel Malek al-Huthi criticou num discurso televisionado as autoridades e ameaçou o presidente Hadi, que estava na sua residência a oeste de Sanaa, de acordo com um dos seus assessores.
"Todas as opções estão abertas", declarou o líder xiita, segurando uma faca sobre o ombro. "Ninguém, seja ele presidente ou não, pode escapar das nossas medidas caso conspire contra nós", insistiu.
Huthi disse que o seu movimento estava disposto a enfrentar "qualquer acção" adoptada pelo Conselho de Segurança da ONU.
Por sua vez, o primeiro-ministro, Khaled Bahah, deixou a sua residência no centro de Sanaa depois de permanecer cercado por dois dias.
Bahah pôde deixar num veículo a sua residência para um destino seguro após uma saída negociada com os milicianos, segundo o porta-voz do governo, Rajeh Badi.
Os milicianos huthis apoderaram-se de grandes quantidades de armas que estavam no palácio presidencial, tomado na terça-feira após dois dias de combates com a guarda presidencial, que causaram 18 mortos.
No seu discurso, Abdel Malek al-Huthi acusou o presidente de amparar a "corrupção" vigente no país.
Este ressurgimento da violência no Iêmen, a crise mais grave nos últimos quatro meses, foi deflagrado pela rejeição dos huthis ao projecto de Constituição que divide o país em seis regiões e os priva do acesso ao mar.
A milícia Ansaruallah, que tenta há meses ampliar a sua influência no Iêmen, assumiu o controle de grande parte de Sanaa a partir de setembro passado.
No entanto, oficiais militares leais ao presidente do Iêmen acusam o ex-presidente Ali Abdullah Saleh de apoiar activamente as milícias huthis desde que entraram na capital.
Saleh foi deposto numa revolta popular em 2011, mas mantém uma influência considerável e relações no exército e nas tribos.
O Iêmen, um país que faz fronteira com a Arábia Saudita, é estratégico no trânsito do petróleo que é exportado do Golfo e sofre há meses uma onda de violência, o que aumenta os temores de se tornar um Estado falido.
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