Elisio Macamo
O tempo fugiu-me. os debates das questões continuam acesos e eu não disponho de tempo para participar. Aproveito o intervalo de provas (provas interessantes sobre a noção de estetica em Kant; eu sou apenas chefe de bancada) para postar um texto com uma reflexão sobre a experiência de discussão destas dez questões. Agradeço a todos que participaram. Foram intervenções muito instrutivas. Não vou pod...er comentar grande coisa porque a intensa presença dos últimos dias custou-me caro. O texto, para variar, volta a ser longo.
Um País de porcos
Calma, não se chateiem, mais adiante explico o título!
Nos últimos dois dias discuti várias perguntas que coloquei aos meus amigos do Facebook. A intenção era de saber um pouco mais sobre a ideia do político que os meus amigos têm. O político é coisa muita complicada. A geração a que pertenço foi moldada pela cultura marxista do pós-independência que, em minha opinião, enfatizou muito a supremacia dos fins sobre os meios partindo do sólido princípio segundo o qual a realização dos objectivos revolucionários justificava os meios. Os excessos que todos nós conhecemos não foram, portanto, necessariamente uma expressão da maldade das pessoas que desenharam esse projecto revolucionário. Foram uma consequência das convicções políticas sobre as quais assentava o projecto, o que, naturalmente, não diminui a responsabilidade individual e colectiva pelo que aconteceu. De qualquer maneira, o projecto tinha uma forte coerência, o que nos permitia tornar o mundo intelegível de forma muito fácil.
Entretanto as coisas mudaram muito. Esse projecto pertence ao passado. Os pressupostos filosóficos sobre os quais ele assentava foram abandonados por alguns dos que o forçaram sobre todos nós. Existem outras referências, muitas vezes dispersas e fragmentadas que se insinuam na esfera pública por meio de noções normativas (direitos humanos, transparência, participação, boa governação, integridade, governação inclusiva, etc.). Trata-se, na verdade, de armas de arremesso que têm na mira os adversários políticos, sobretudo na sua forma negativa (violação dos direitos humanos, falta de transferência, corrupção, etc.), e que sugerem uma falsa coerência política porque os discursos dentro dos quais essas noções são integradas são baseados em narrativas simples que contam uma única estória, nomeadamente a estória dos bons e dos maus, do preto e do branco.
Curiosamente, há fortes elementos da cultura política do projecto revoluccionário, que se manifestam sobretudo na insistência doentia no povo como o objecto de tudo quanto a gente faz, mas também na expectativa de que o Estado resolva todos os problemas. A coisa atinge proporções ridículas quando, no êxtase da indignação em relação ao que vai mal, se evoca uma imagem sanitizada de Samora Machel (alguns até chegam a dizer que no tempo de Samora os dirigentes eram os primeiros em sacrifícios e últimos em benefícios... esqueceram-se das lojas dos dirigentes...), curiosamente até por gente com simpatias pela Renamo, em plena ignorância das razões pretensas da chamada guerra pela democracia. Sempre suspeitei que houvesse uma certa desorientação política por parte das novas gerações, uma desorientação própria dos tempos actuais, tempos sem projecto político, sem convicções políticas fundamentadas, enfim, tempos marcados por contextos de debates em que a repetição dos slógans da indústria do desenvolvimento, dos gritos de guerra duma sociedade civil global e, naturalmente, de conceitos políticos rapidamente consultados no Wikipedia conferem profundidade a intervenções ocas.
As dez perguntas que coloquei para discussão não confirmam, nem infirmam as minhas suspeitas. Houve excelentes intervenções que revelaram uma forte vontade de se ir para além do superficial na análise do País, mas houve também manifestações incríveis de incoerência reveladoras de indícios da desorientação política de que falava. Houve também, como não podia deixar de ser, manifestações de graves insuficiências em matéria de cultura de debate, sobretudo patentes na incapacidade de abordar as questões colocadas e insistir apenas na transmissão duma mensagem, nomeadamente a mensagem segundo a qual o governo ou a oposição não prestariam. Esta parte constitui um enorme desafio que dificulta um tratamento útil dos problemas que se discutem na esfera pública. É sintomático de fanatismo e fanatismo, por regra, só permite discussões emocionais dentro das quais o que o outro diz é apenas mais uma oportunidade para eu reforçar o meu ponto de vista que só muda ao sabor do que sinto pelo meu clube. Os méritos dum argumento são periféricos, senão mesmo um impecilho.
Há duas coisas que se insinuaram com muita força nas discussões das dez questões. A primeira foi que a ideia do político que algumas pessoas têm se funda essencialmente na sua atitude em relação ao governo, isto é se são a favor ou contra. Fora disso, não há nenhuma instância normativa que enforma a sua intervenção pública. Procuram na indignação ou no apoio incondicional a âncora que dá coerência ao que dizem. Com isto não quero dizer que toda a gente que se preocupa com a sorte do País devia começar por ler Marx, Mill, Smith, Locke, Rousseau ou Kant. Só que sem um mínimo de conhecimento do pensamento que produziu as noções que usamos para construir o nosso País vai ser muito complicado ganharmos coerência, sobretudo quando nas nossas intervenções queremos fazer mais do que exprimir indignação. Neste aspecto a minha geração até pode dar graças à Frelimo revoluccionária que nos deu esquemas coerentes de avaliação da realidade. É verdade que alguns de nós abandonaram os pressupostos filosóficos desses esquemas, mas o hábito de comentar os fenómenos políticos a partir duma ideia coerente do político ficou. Valeram à pena aquelas sessões de estudo político e aquelas aulas de educação política.
A segunda coisa é que o debate político em Moçambique (pelo menos no Facebook) se faz sob o falso pressuposto duma unidade de propósitos. Os que criticam o governo pensam que formam um grupo coerente e os que defendem o governo pensam também o mesmo. Pelo posicionamento de algumas pessoas nos debates suscitados pelas dez questões deu para ver que o xadrez é bem complicado, que os do contra podem ter muito em comum com alguns do está tudo bem até ao ponto de fazer mais sentido formarem o seu próprio grupo e jogarem pedras aos outros. A importância desta constatação explica o título que escolhi para este texto. O leitor atento deve ter pensado logo em George Orwell e seu livro com o título (moçambicanamente falando) “a machamba dos animais”. Os porcos lideraram a revolução contra os humanos para mais tarde descobrirem que só a hostilidade aos humanos não era suficiente como programa político e que na ausência dum fundamento normativo comum as vaidades individuais acabariam por anular todos os ganhos.
Algumas pessoas perguntaram-me se depois da discussão das questões iria dar a matriz das respostas. Expliquei-lhes que não tenho essa matriz porque não há resposta certa ou errada para essas perguntas. Bom, na verdade há, só que isso é função da ideia do político que cada um de nós tem. Essa ideia não é necessariamente original porque estas questões são objecto de discussão intelectual há séculos. O conhecimento mínimo dessa discussão é fundamental para nos orientar na intervenção pública. Perguntaram-me também se há método e eu disse que quando muito o método é a vontade de aprender pelo debate. Neste aspecto, por acaso, há muita coisa que falha entre nós, sobretudo entre os jovens. Há uma incrível falta de humildade que não permite a muitos verem que antes de tirarem uma conclusão precisam de ter certeza sobre os méritos da questão em apreço. É verdade que isto é muito influenciado pela facilidade com que podemos constatar o que está mal. Não há coisa mais fácil no nosso País hoje em dia, quer no que diz respeito ao que o governo faz mal, quer em relação ao que os críticos não entendem. Tamanha facilidade embala, funciona um pouco como estupefaciente, só que o efeito é também de entorpecer a mente.
Era tão bom se pudéssimos transformar os nossos debates políticos no Facebook em momentos de aprendizagem. Era tão bom se quem ainda não leu “A machamba dos animais” de Orwell o fizesse o mais rápido possível, pelo menos antes da queda do governo em resultado da subida do povo ao poder, pois repetir erros é ser burro. E nós somos porcos. Haja auto-estima.See more
Um País de porcos
Calma, não se chateiem, mais adiante explico o título!
Nos últimos dois dias discuti várias perguntas que coloquei aos meus amigos do Facebook. A intenção era de saber um pouco mais sobre a ideia do político que os meus amigos têm. O político é coisa muita complicada. A geração a que pertenço foi moldada pela cultura marxista do pós-independência que, em minha opinião, enfatizou muito a supremacia dos fins sobre os meios partindo do sólido princípio segundo o qual a realização dos objectivos revolucionários justificava os meios. Os excessos que todos nós conhecemos não foram, portanto, necessariamente uma expressão da maldade das pessoas que desenharam esse projecto revolucionário. Foram uma consequência das convicções políticas sobre as quais assentava o projecto, o que, naturalmente, não diminui a responsabilidade individual e colectiva pelo que aconteceu. De qualquer maneira, o projecto tinha uma forte coerência, o que nos permitia tornar o mundo intelegível de forma muito fácil.
Entretanto as coisas mudaram muito. Esse projecto pertence ao passado. Os pressupostos filosóficos sobre os quais ele assentava foram abandonados por alguns dos que o forçaram sobre todos nós. Existem outras referências, muitas vezes dispersas e fragmentadas que se insinuam na esfera pública por meio de noções normativas (direitos humanos, transparência, participação, boa governação, integridade, governação inclusiva, etc.). Trata-se, na verdade, de armas de arremesso que têm na mira os adversários políticos, sobretudo na sua forma negativa (violação dos direitos humanos, falta de transferência, corrupção, etc.), e que sugerem uma falsa coerência política porque os discursos dentro dos quais essas noções são integradas são baseados em narrativas simples que contam uma única estória, nomeadamente a estória dos bons e dos maus, do preto e do branco.
Curiosamente, há fortes elementos da cultura política do projecto revoluccionário, que se manifestam sobretudo na insistência doentia no povo como o objecto de tudo quanto a gente faz, mas também na expectativa de que o Estado resolva todos os problemas. A coisa atinge proporções ridículas quando, no êxtase da indignação em relação ao que vai mal, se evoca uma imagem sanitizada de Samora Machel (alguns até chegam a dizer que no tempo de Samora os dirigentes eram os primeiros em sacrifícios e últimos em benefícios... esqueceram-se das lojas dos dirigentes...), curiosamente até por gente com simpatias pela Renamo, em plena ignorância das razões pretensas da chamada guerra pela democracia. Sempre suspeitei que houvesse uma certa desorientação política por parte das novas gerações, uma desorientação própria dos tempos actuais, tempos sem projecto político, sem convicções políticas fundamentadas, enfim, tempos marcados por contextos de debates em que a repetição dos slógans da indústria do desenvolvimento, dos gritos de guerra duma sociedade civil global e, naturalmente, de conceitos políticos rapidamente consultados no Wikipedia conferem profundidade a intervenções ocas.
As dez perguntas que coloquei para discussão não confirmam, nem infirmam as minhas suspeitas. Houve excelentes intervenções que revelaram uma forte vontade de se ir para além do superficial na análise do País, mas houve também manifestações incríveis de incoerência reveladoras de indícios da desorientação política de que falava. Houve também, como não podia deixar de ser, manifestações de graves insuficiências em matéria de cultura de debate, sobretudo patentes na incapacidade de abordar as questões colocadas e insistir apenas na transmissão duma mensagem, nomeadamente a mensagem segundo a qual o governo ou a oposição não prestariam. Esta parte constitui um enorme desafio que dificulta um tratamento útil dos problemas que se discutem na esfera pública. É sintomático de fanatismo e fanatismo, por regra, só permite discussões emocionais dentro das quais o que o outro diz é apenas mais uma oportunidade para eu reforçar o meu ponto de vista que só muda ao sabor do que sinto pelo meu clube. Os méritos dum argumento são periféricos, senão mesmo um impecilho.
Há duas coisas que se insinuaram com muita força nas discussões das dez questões. A primeira foi que a ideia do político que algumas pessoas têm se funda essencialmente na sua atitude em relação ao governo, isto é se são a favor ou contra. Fora disso, não há nenhuma instância normativa que enforma a sua intervenção pública. Procuram na indignação ou no apoio incondicional a âncora que dá coerência ao que dizem. Com isto não quero dizer que toda a gente que se preocupa com a sorte do País devia começar por ler Marx, Mill, Smith, Locke, Rousseau ou Kant. Só que sem um mínimo de conhecimento do pensamento que produziu as noções que usamos para construir o nosso País vai ser muito complicado ganharmos coerência, sobretudo quando nas nossas intervenções queremos fazer mais do que exprimir indignação. Neste aspecto a minha geração até pode dar graças à Frelimo revoluccionária que nos deu esquemas coerentes de avaliação da realidade. É verdade que alguns de nós abandonaram os pressupostos filosóficos desses esquemas, mas o hábito de comentar os fenómenos políticos a partir duma ideia coerente do político ficou. Valeram à pena aquelas sessões de estudo político e aquelas aulas de educação política.
A segunda coisa é que o debate político em Moçambique (pelo menos no Facebook) se faz sob o falso pressuposto duma unidade de propósitos. Os que criticam o governo pensam que formam um grupo coerente e os que defendem o governo pensam também o mesmo. Pelo posicionamento de algumas pessoas nos debates suscitados pelas dez questões deu para ver que o xadrez é bem complicado, que os do contra podem ter muito em comum com alguns do está tudo bem até ao ponto de fazer mais sentido formarem o seu próprio grupo e jogarem pedras aos outros. A importância desta constatação explica o título que escolhi para este texto. O leitor atento deve ter pensado logo em George Orwell e seu livro com o título (moçambicanamente falando) “a machamba dos animais”. Os porcos lideraram a revolução contra os humanos para mais tarde descobrirem que só a hostilidade aos humanos não era suficiente como programa político e que na ausência dum fundamento normativo comum as vaidades individuais acabariam por anular todos os ganhos.
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