Moçambique
Jorge Arroz, que lidera uma greve geral no setor da saúde em Moçambique, foi libertado esta madrugada (27.05), após algumas horas detido, acusado do crime de sedição. Ordem dos Advogados diz que a detenção não foi legal.
O presidente da Associação dos Médicos de Moçambique (AMM), Jorge Arroz, foi detido na noite de domingo (26.05) na sede da organização, na capital moçambicana, quando dialogava com os seus colegas. Foi levado para a sexta esquadra da polícia da cidade de Maputo, onde foi interrogado e detido durante cerca de quatro horas.
“Pelos dados que conseguimos obter ontem na Polícia de Investigação Criminal (PIC), a detenção não foi legal”, disse à DW África opresidente da Ordem dos Advogados. Tomás Timbana, que também esteve na esquadra. Para sustentar a ilegalidade da detenção, o advogado refere o tipo de crime pelo qual foi detido, a hora e o dia e até o próprio local da detenção. “Hoje surgiram indicações de que estaria a ser preparada uma mobilização de médicos para a paralisação de todos os hospitais, mas os elementos que nós fomos recolhendo não apontavam de modo algum para esta situação”, acrescentou Timbana.
O ocorrido levou figuras proeminentes da sociedade civil, médicos e até populares a aglomerarem-se no local para exigir a libertação de Jorge Arroz. Entre as figuras que contestaram esta detenção, destaca-se o procurador-geral da República de Moçambique, Augusto Paulino, que pôs em causa a decisão da polícia. Tomás Timbana considera que esta contradição de decisões evidencia ”um mau sinal e até certo ponto uma descoordenação entre a polícia e a Procuradoria”. Reconhece ainda que “é verdade que não é culpa da Procuradoria porque a polícia teve elementos mais do que suficientes para procurar outras entidades e tomar uma decisão.”
O analista Egídio Vaz acredita que a detenção de Jorge Arroz representa uma tentativa de intimidação destes e de outros profissionais que pretendam reivindicar melhores condições
Tentativa de intimidação?
Os médicos moçambicanos estão em greve desde o passado dia 20.05 por melhores salários e melhores condições de trabalho, entre outras exigências que ainda não foram satisfeitas, como contou à DW África Jorge Arroz.
Quando terminou a anterior greve de janeiro, a AMM assinou um memorando de entendimento com o Governo que continha três pontos principais. Segundo o responsável, o primeiro ponto era “a ausência de represálias aos médicos estagiários que aderiram à greve”. O segundo ponto está dividido em dois sub-pontos: o primeiro é a reforma do setor público com efeitos a partir de abril de 2013 e o segundo sub-ponto está relacionado com a aprovação do estatuto de médico na primeira sessão da Assembleia da República. Finalmente, o terceiro ponto do memorando “visava a manutenção de um diálogo permanente contínuo, com uma matriz, com ações concretas e prazos”, recorda o presidente da associação.
Será a detenção de Jorge Arroz uma forma de intimidação a esta e outras classes profissionais? O analista e historiador Egídio Vaz não tem dúvidas: “Sim, trata-se de uma forma descorrdenada de intimidação e desencorajamento, tanto do movimento solidário em torno dos médicos, como do próprio movimento associativo para o desintegrar.” E, em última análise, acrescenta, “para lançar sinais vibrantes da musculatura do Estado contra os prováveis movimentos reivindicativos que queiram surgir com vista a exigir os seus direitos, sejam eles cívicos ou laborais.”
A primeira greve destes profissionais aconteceu em janeiro passado, altura em que o Governo prometeu cumprir as suas exigências. Em meados deste mês, o Conselho de Ministros anunciou um aumento salarial, mas que no caso dos médicos não correspondia ao acordado, o que desencadeou a segunda greve. O Ministério da Saúde, através do seu porta-voz, Francisco Cândido, assume o facto. “Foram cumpridos, mas não foram cumpridos na íntegra”, reconhece.
Greve afeta atendimento
Por causa da greve, o já deficiente sistema de saúde do país piorou e as unidades sanitárias estão a funcionar com pessoal reduzido. O Ministério da Saúde de Moçambique (MISAU) diz que teve de mobilizar pessoal de apoio, médicos militares e até estudantes do curso de enfermagem para cobrir a ausência de alguns enfermeiros que aderiram a greve.
Paralelamente, prossegue a falta de diálogo entre as autoridades e os grevistas. A imprensa moçambicana tem dito que o Ministério não mostra sinais de querer negociar. No entanto, Francisco Candido assegura que “o MISAU quer dialogar com os médicos”, tendo até sido já realizados dois encontros. “Num primeiro, o presidente da Associação Médica esteve presente, mas depois abandonou a sala porque impunha como condição a presença de uma outra instituição que não está legalizada. E na segunda vez pura e simplesmente não apareceu”, lembra.
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