Canal de Opinião
Por: Matias Guente
Maputo (Canalmoz) – Não me é característico debater pessoas, principalmente quando são de uma monumental insignificância que só um País “interessante” como este lhes pode ainda dar crédito. E mais grave: crédito e um cargo numa empresa pública.
Vem isto muito a propósito do senhor Gustavo Mavie que por acaso, explicado só pelo contexto decadente em que vivemos, é antieticamente director da Agência de Informação de Moçambique (AIM) e propagandista do Governo da Frelimo fazendo uso de uma instituição do Estado.
Vamos aos factos: Gustavo Mavie, um PhD em Culambismo ao regime, escreveu no boletim da AIM que o texto que eu próprio escrevi e que fez capa no semanário Canal de Moçambique (onde trabalho com muito orgulho) está prenhe de demagogia porque o framing textual por mim dado leva à interpretação de que houve insensibilidade por parte do chefe de Estado e seus assessores ao festejarem o aniversário do Senhor Armando Guebuza com direito a oito horas de transmissão em director pela TV pública, enquanto famílias choravam, a poucos quilómetros, a desgraça de que foram vítimas, causada pelas enxurradas.
Não tenho medo de repetir aqui que houve insensibilidade, sim, e muita hipocrisia. E tenho elementos que me fazem chegar a esta asserção. Enquanto o senhor comia e bebia de borla (arte em que de resto mostrou ser perito), eu liderava uma equipa de Reportagem no terreno (na água), nas zonas da Costa do Sol, Inhagoia e Laulane, testemunhávamos o sofrimento das pessoas. Insensibilidade porque o direito privado de uma figura como a do PR não lhe abre o leque para poder dar festas pomposas, enquanto o povo, a quem jurou servir, está no auge da miséria, ainda que seja momentânea como é o caso destas enxurradas. Mais grave: o banquete enquanto durou foi transmitido com pompa e circunstância, oito horas seguidas, enquanto a população afectada enterrava os seus mortos ou chorava as outras consequências mergulhada no sofrimento: sem água, sem comida, sem cobertores. Hipocrisia porque enquanto bebiam e comiam, liam discursos de combate à pobreza para elogiar o chefe rumo à caça de mais um tacho nesses cargos, cujo critério passa por quem leva mais tempo ajoelhado aos pés de Guebuza, outros estavam a serpura e simplesmente ignorados.
Qual é o combate à pobreza de que falam, enquanto se embebedam com vinhos e comem vários acepipes quando em contracena está o povo desesperado?
Precisamos de ler mais manuais de governação e desenvolvimento para entender o que encerra o vosso conceito de luta contra a pobreza.
Não há demagogias da nossa parte, senhor Mavie. Pelo contrário, há demagogias do lado de quem fala da pobreza com uma taça de vinho e rissóis na mão, tal como o senhor. Enquanto a televisão pública transmitia em directo os “Mavie” a dançar e a comer na festa do chefe de Estado, eu estava na Polana Caniço em casa da família Mulhovo, que chorava a perda do pequeno Jorge que em vida nas conversas de sonho com os amigos dizia querer ser juiz. E o senhor Mavie sabe por acaso como morreu o pequeno Jorge? – Foi soterrado. A precária casa em que viviam desabou o lado do quarto onde Jorge estava e foi tudo parar à cratera que se abrira por causa da chuva. Saberá por que desabou o quarto do pequeno Jorge e não a casa do senhor Mavie? – Porque a casa do senhor Mavie foi bem construída. A do pequeno Jorge era de construção precária muito por culpa de um Estado que nem sequer tem um ante-projecto sério de política de habitação e vive alimentando “Maviísmos”.
Na mesma altura que os muitos “Mavie” comiam, duas senhoras lutavam no “Acolhimento Força do Povo” por causa de arroz sem caril que era distribuído lá. Era uma única refeição que cobria: matabicho, almoço e jantar. Diga-me agora o que é demagogia entre um Mavie falar de sucessos de uma luta contra a pobreza, enquanto está na fila de um buffet, e milhares de pessoas se espancam por arroz sem caril, porque perderam tudo com as enxurradas? O senhor Mavie tanto tem um tal de dicionário quanto não sabe ler o que lá está escrito…
Fala também do texto de Elísio Macamo publicado no “Notícias” que sustenta a tal demagogia que o senhor nos atribui. Ao escrever sobre a tal “demagogia”, Elísio Macamo fala da introspecção ética e moral (relativos à padrões individuais e colectivos comummente aceites), exercício que cada um devia fazer logo que recebeu o convite da festa. Esta introspecção de que fala Macamo seria para decidir se era moralmente aceite comemorar faustosamente e exibir em TV, enquanto outros estão na miséria. Isso, o bom de Mavie não percebeu. Mas também como perceber se o que importa é só escovar?
A interpretação do texto que nos traz Mavie é típica daquilo que para efeitos deste texto, vou chamar de Hermenêutica da fome! Consiste em interpretar factos ou textos com pendor para o lado que nos vai garantir gás, combustível, pão e um convite para próxima festa do chefe! É disso de que padeceu Mavie na sua leitura!
Na forma como faz a descrição fiel dos pratos que foram servidos na festa, mostra, não só que o senhor comeu tudo quanto esteve lá, revelando a sua categoria de faminto, como mostra que é, como já todo o mundo sabe, a comida que o move para ser mercenário.
O senhor fala tanto de Guebuza como o dono da independência. Não duvidamos que Guebuza seja “herói”. Mas porque não fala de Paulo Samuel Kankomba, de Urias Simango, com o mesmo ânimo e efervescência? Não será porque morreram ou porque lutaram menos, certamente. É porque não podem dar-lhe dinheiro agora. Porque o senhor é um vendilhão! Há muitos heróis vivos que lutaram pela independência e só não recebem hossanas nas suas delirantes crónicas porque não têm dinheiro para lhe pagar a consciência, nem estão na posição de lhe poder convidar para viajar ao exterior para ter ajudas de custo. Portanto, não venha aqui nos enganar, senhor Mavie! Conhecemo-lo da letra e consciência! Vá vender o País por outra freguesia!!...
Fala de convite presidencial como se fosse aquilo fosse o auge do jornalismo. Quanta miséria, meu Deus!! Saiba que também recebi o tal convite para ir a tal festa. Só não fui porque preferi ir trabalhar (arte de que certamente o senhor tem pavor).
Diz no seu ensaio escovista que alguém nos manda escrever as reportagens. Saiba, senhor Mavie, que contrariamente ao senhor que é mandado escrever textos para “deixar claro que o Governo está a trabalhar”, eu não sou mandado escrever. Eu escrevo! Porque tenho capacidade suficientemente intelectual para tal. Não sou da sua estirpe. Não sou mercenário. Não estou à venda, muito menos por migalhas. Não faço parte da sua facção de contrabando de consciência e de valores. Tenho dignidade e valores, coisas que certamente na sua legião é considerado heresia.
Ninguém me manda escrever nada. Temos uma pauta noticiosa semanal, que é feita e executada por uma equipa de jovens liderada actualmente por mim. Não recebo chamadas para difamar médicos que cuidam dos nossos compatriotas. Não recebo garrafas de vinho e convites para o exterior para falar mal da oposição nem do Governo.
Não pense o senhor Mavie que não tenho lido os seus delírios que só a mais afeiçoada tendência para a “escova” pode confeccionar. Temos lido os insultos e ofensas que o senhor tem dirigido contra este jornal e seus profissionais. Temos lido as suas desgraças textuais de cunho racista contra o director deste jornal e contra muitos outros cidadãos moçambicanos de raça branca. Aliás, a raça é, a par do anti-criticismo, o único expediente que o senhor sabe tramitar. Longe de ver críticas e pessoas que com seu conhecimento contribuem para fazer deste País um lugar normal, Mavie vê primeiro a cor dos críticos. Anda aos rodopios com a raça do director deste jornal e contra outros cidadãos moçambicanos de raça branca, mostrando que infelizmente estamos perante um primata sebastianista. Quer que os brancos e negros voltem a se estranharem? Quanta irresponsabilidade!
Saiba, senhor Mavie, que só não respondemos porque não nos queremos sujar com tamanha porcalhada intelectual. Saiba que o nosso silêncio perante as suas basbaquices textuais é o nosso tributo à sua imponente insignificância, que tal como diria Barbosa du Bocage: “tem o estatuto da quinquagésima potência, que o vulgo denomina NADA!”
Tem mais: nunca me dei tempo de responder a um Mavie que é acusado pelos seus próprios subordinados de gerir de forma danosa a AIM, um bem público. Lemos em muitos jornais (que nem são da propriedade do Canal de Moçambique, nem de “brancos”) que o senhor está metido em muitos esquemas que levaram a AIM à falência técnica. São os trabalhadores da AIM que são citados nessas notícias que o denunciam. O senhor nunca desmentiu isso. Certamente que sabe em que esgoto repousa a sua consciência. Ou seja: fazendo fé naquilo que está publicado sobre a sua gestão da AIM, não chegamos a outra conclusão se não a de que: só a almofada cúmplice do regime é que ainda o mantém fora das grades. Mas tenho pena de ter que o recordar que a Justiça tarda mas não falha. Brevemente a legalidade vai bater-lhe à porta e a justiça vai de forma exemplar o colocar no lugar propício para pessoas de instinto calamitoso como o senhor!
Ainda bem que o senhor prefere-se acobardar no conforto dos seus decadentes textos. Lamba como quiser, até as partes mais desaconselháveis do regime, mas não o faça à custa do nosso trabalho honesto. Continue a delirar na sua prostituição intelectual, mas não cometa o erro de usar o meu trabalho para trepar as escadas do regime. Faça-o com os que ainda não sabem o hino à fraude jornalística que o senhor é! (Matias Guente)
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