domingo, 25 de novembro de 2012

Na batalha por Moçambique todos contamos

Cana de Opinião
Por: Noé Nhantumbo
Maputo, Mozambique
 
Assumir posições e interpretar as necessidades com patriotismo e entrega…
Grandiosidade, génio e sabedoria, sentido de estado e responsabilidade inerente que venham ao de cima…
Beira (Canalmoz) - Entrega abnegada, amor à pátria não são palavras vãs ou politicamente correctas num momento grave da nossa história. Moçambique está sendo “apedrejado” por políticos obtusos, caducos e saudosistas dos tempos áureos do regime monopartidário.
A paz e estabilidade nacional estão correndo riscos desnecessários por causa de tendências monopolistas e ditatoriais de uma meia dúzia de pessoas que se julgam insubstituíveis.
De uma maneira desavergonhada e sem pudor, alguma gente supostamente de nomeada, existe proclamando aos quatro ventos que enganou ou ludibriou Afonso Dhlakama em Roma ou em Gaborone. Que isso é importante e se revela importante para uma leitura actual não há duvidas. Terá havido uma soma concreta de factos desconhecidos para a maioria que levaram a que aspectos de importância fulcral fossem escamoteados e deturpados de maneira conveniente para uma parte durante o processo negocial do AGP.
Da mesma maneira como continuam secretos os protocolos secretos assinados entre o governo português e a Frelimo em 1974, Lusaka, também existem protocolos secretos entre a Renano e o governo da Frelimo, assinados em 1992.
Alguns intervenientes nas negociações de Roma actuaram de má-fé como se pode concluir depois destes de vinte anos de uma paz morna, por vezes fria e noutras nem tanto. De alguma forma as armas de guerra se calaram mas houve mortes com contornos políticos como se viu em Montepuez. A asfixia terá de maneira cruel substituído as balas. De uma aparente cedência e aceitação de uma nova realidade recuou-se rapidamente para uma camuflagem ou mascarada de democracia. Exclusão tácita meticulosamente cultivada terá sido a ordem exarada dos altos escalões do partido no poder.
Mas como a “mentira tem pernas curtas”, tanto a Renamo como Dhlakama se deram conta da dimensão do logro em que haviam caído. De forma completamente nova, aberta e com conhecimento de todos, no país e na comunidade internacional, a Renamo está colocando “as cartas na mesa” e exigindo que elas sejam novamente baralhadas e redistribuídas.
Aqueles que sempre pretenderam monopolizar a história política do país, os que se colocaram no topo e de lá passaram a ditar e a impor os destinos dos outros, os que por conveniência algum dia disseram que já não havia vocação, os que escrevem e entortam a história comum como lhes convém, querem outra vez comandar o destino de todos. Se alguns dos autodenominados ideólogos de um regime que faliu a olhos vistos ainda teimam em defender o indefensável isso não constitui novidade. Mas que todo um partido não olhe para as questões pertinentes com olhos de ver e se decida a enveredar pelos caminhos óbvios isso já é preocupante e desolador. Certo que na Frelimo se vive alguma confusão no que se refere a correlação interna de forças. Alguns dos que antes eram todo-poderosos estão sendo cirurgicamente removidos. Há dificuldades evidentes na tomada de decisões que se afiguram cruciais para entabularem-se negociações sérias com a Renamo. Sabe-se que não há caminhos fáceis em política mas qualquer que seja a via escolhida, exige uma coragem e capacidade de criar consensos partidários superiores à retorica habitual. Se aparentemente Afonso Dhlakama terá sido empurrado para Gorongosa por membros do seus antigo estado-maior não se pode recusar que AEG esteja sofrendo pressões concretas de vários sectores influentes de seu partido, para dialogar, recusar dialogar, adiar, protelar ou ganhar simplesmente tempo arrastando e levando a que as hostes da Renamo cometam erros e conheçam um verdadeiro suicídio político. São possibilidades ou probabilidades não estranhas atendendo ao tipo de situação difusa que se vive em Moçambique.
Arregimentando a comunicação social como se pode observar pela ofensiva levada a cabo, instruindo e determinando agendas editoriais no sector público e nalguma imprensa privada, tomando de assalto as companhias de telefonia móvel, controlando a internet, estamos numa situação atípica e perigosa para a democracia moçambicana emergente.
Insidiosamente, arquitetando e programando novos passos, existe uma firme vontade de algumas pessoas concretas se perpetuarem no poder neste país.
Jogando e baralhando os assuntos conforme lhes convém e adiantando aos outros através da utilização escandalosa de informação privilegiada assiste-se a uma movimentação sem igual nas fileiras do partido no poder. Aquela ideia de pensamento comum e actuação dispersa que caracterizava a Frelimo dos outros tempos não encontra eco favorável nos dias de hoje. Há tantos focos de desinteligências e de sonhos acalentados que uma grande parte dos se sentiam coagidos a seguir silenciosamente instruções superiores hoje se consideram preparados para assumir posições superiores na hierarquia do partido e no governo. Numa teia ou rede em que se manifestam preocupações de natureza étnica crescentes em que algumas das indicações para cargos de topo na Frelimo reflectem equilíbrios étnico-regionais, faz falta uma coesão programática àquele nível. Mesmo no seio da Frelimo a “Unidade Nacional” apregoada parece contestada por práticas visíveis incontestáveis. Parece que cresce o sentimento de que “nos querem para votarmos por eles” mas na realidade “não nos querem”.
Se alguns julgavam que com o seu último congresso em Pemba todos os assuntos mais importantes seriam discutidos e acautelados, o país recebeu uma surpresa vinda de Gorongosa. De uma forma sorrateira, longe dos holofotes da comunicação social, Afonso Dhlakama anunciou uma posição de seu partido a contestar o status, exigindo que todas as questões pendentes relativas ao AGP fossem retomadas e discutidas entre o governo da Frelimo e a Renamo. Terá sido o maior acontecimento político de 2012, ofuscando mesmo o congresso da Frelimo em Pemba.
A Frelimo e o seu governo pressionados pelas confissões religiosas, certamente pelas corporações investidoras, pelas chancelarias ocidentais, por Pequim e Brasília, terão concluído que de facto tinham de alterar sua postura e aceitar dizer em público, que estava disposta a conversar com a Renamo.
Há algumas zonas de penumbra e sombra quanto ao tipo de vontade expressa pela Frelimo sobre os assuntos em jogo. Primeiro nomeiam uma comissão de membros seus para dialogar com a Renamo e esta prontamente rejeitou essa possibilidade, avançando que era com o governo que se teria que conversar. Depois de um compasso de espera eis que avança com a indicação do ministro de Agricultura José Pacheco como a pessoa com que a comissão nomeada pela liderança da Renamo terá que lidar.
Em si os passos que se sucedem já são animadores na medida que contrariando positivamente a tese de Joaquim Chissano e outros comentadores televisivos da praça, “há pano para mangas”.
Julgo que existe uma convicção cada vez mais esclarecida de que os avanços públicos e privados em matéria de economia serão irremediavelmente interrompidos se a situação evoluir para a violência no país.
As fraquezas estruturais no aparato de defesa e segurança são tão evidentes que o governo teria que contratar um exército completo para acudi-lo.
Uma guerrilha experiente e com sucessos registados no passado, depressa tomariam conta da maior parte do país. Os celebrados megaprojectos de exploração carbonífera, a construção de linhas férreas, de portos, de barragens hidrelétricas, de exploração de ferrovanádio, de urânio, de ouro, de fosfatos, as plantações açucareiras, as fábricas de algodão, paralisariam da noite para o dia.
Um corte de rodovias e ferrovias, relativamente fácil para uma guerrilha determinada e experiente, ditaria um envolvimento quase que imediato do exército zimbabwiano no conflito moçambicano o que somado aos actuais combates em Goma, RDC, colocaria a SADC em polvorosa. Quem quer assumir a responsabilidade descalabro nacional e regional?
Só quem tem alguma coisa a perder é que está realmente preocupado com a possibilidade de eclosão de um conflito armado em Moçambique.
A coesão emergente na Renamo quanto a necessidade de renegociação dos pendentes deve ser vista sob esse prisma.
É preciso que os interlocutores abandonem os bluffs e se engajem de corpo e alma nos debates pertinentes. Com urgência que a situação exige e requer, com criatividade e abertura assumam-se moçambicanos animados por sentimentos e posturas de respeito uns para com os outros. Que as lideranças não se escodam em agendas dispares com o interesse genuinamente nacional.
Ganhamos todos se nos incluímos e nos toleramos.
Não é tempo para retorica barata, gasta, carcomida por uma realidade que se mostra bem diferente dos discursos de normalidade, de desenvolvimento, de vitórias na luta contra a pobreza.
Sejamos minimamente honestos, enquanto aumenta o número de vendedores ambulantes de maças sul-africanas, de “calamidades” , de trabalhadoras do sexo, de crime violento, de aluguer de armas de guerra por membros da FADM, de raptos e sequestros não esclarecidos, de tráfico de órgãos humanos, de tráfico de drogas, não faz sentido falar de desenvolvimento.
Os moçambicanos estão atentos e esperando por resultados concretos nos diálogos anunciados… (Noé Nhantumbo)

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