SAVANA – 03.08.2007
Ivone Soares, porta-voz do Gabinete Eleitoral da RENAMO,
proclama
Com RENAMO é possível mudar Moçambique
Por S. Muchanga e F. Gumende (texto)
e Joel Chiziane (fotos)
É política, estudante
de comunicação e imagem, apresentadora de rádio e poetisa. Ivone Soares, 28
anos, primeira mulher na RENAMO a ocupar o cargo de porta-voz do Gabinete
Central de Eleições, fala, em entrevista exclusiva ao SAVANA, dos seus ideais,
da vida política e do estágio actual da democracia em Moçambique. Pelo caminho
foi tecendo rasgados elogios a Afonso Dhlakama, homem que considera ser um dos
líderes “mais carismáticos que o mundo político já viu”. Siga as partes mais
relevantes da entrevista.
Em Maio último, foi nomeada
porta-voz do Gabinete Central de Eleições da RENAMO. O que lhe moveu a
filiar-se no partido da perdiz?
Entrei na RENAMO no dia em que
completei 18 anos (1997). Decidi presentear-me com algo que pudesse mostrar que
realmente já sou adulta. Sempre interessei-me pela política. Filiei-me neste
partido por achar que é o que melhor responde às minhas expectativas. É a
formação política que está a lutar para melhorar as condições de vida dos
moçambicanos, dando-lhes a liberdade de se expressar livremente. Achei que só a
RENAMO está a lutar pela democracia.
Filiou-se à RENAMO a convite de
alguém ou foi por sua iniciativa?
Sou de uma família em que quase
todos estão envolvidos na política. A começar pela minha mãe que esteve
envolvida na luta de libertação do país do jugo colonial português. Então, dada
as estórias que ela contava sobre a política e porque ela singrou na política
muito nova, sinto que realmente os jovens têm o poder de criar revoluções. Acho
que com a RENAMO é possível mudarmos Moçambique, torná-lo num país mais livre e
democrático e não apegado aos valores internacionais. Fazermos de Moçambique
uma terra agradável, onde os jovens possam ter os seus direitos e opiniões.
Saber que há diversidade de opiniões e isso não ser entendido como algo
mau, mas que vale a pena. O que tenho notado neste país é que é
di fícil uma pessoa ser da RENAMO. A pessoa é espezinhada, colocada no
terceiro plano, não tem facilidade de nada, até para fazer amizades é difícil.
Desde que o Estado moçambicano
tornou-se democrático, a RENAMO ainda não chegou ao poder. O que está a falhar
na vossa estratégia?
Não é verdade que a RENAMO nunca
ganha eleições. Penso que quem diz isso deve fazê-lo em estado de embriaguez,
mas, mesmo nesse estado, é difícil que alguém diga uma coisa dessas. Todos
sabemos que, neste país, quando há eleições, há manipulação do processo em si.
O que nós podemos dizer em relação ao que tem estado a falhar e faz com que não
consigamos contar os nossos votos é que se deve ter uma maior vigilância, não
só por parte dos nossos fiscais, mas de todas as pessoas envolvidas neste
processo.
Como é que a RENAMO está a
preparar-se para conquistar o voto da maioria da população nas próximas eleições:
provinciais, autárquicas e gerais?
A nossa preparação está virada à
campanha, para explicar o que está à vista de todos, mas que as pessoas não têm
coragem de dizer, chamar a consciência do povo moçambicano para esta nova
realidade, para que se faça a alternância democrática. E, nesse sentido, nós
acreditamos que há uma grande possibilidade de chegarmos a um resultado diferente.
É como eu estava a dizer, isto não parte só do esforço da RENAMO.
Deve-se fazer um processo eleitoral transparente que passa por um grande
cometimento dos elementos ligados à Comissão Nacional de Eleições (CNE) a todos
os níveis. Eles devem começar a perceber que, ao permitir fraude, não estão a
enganar a RENAMO, mas, sim, a condenar o povo moçambicano a continuar numa
situação que tende a criar cada vez mais assimetrias entre os moçambicanos,
havendo um punhado de gente que se torna cada vez mais rico, enquanto a maioria
da população vai ficando cada vez mais pobre.
O Governo moçambicano decidiu
alterar a data da realização das eleições provinciais de 20 de Dezembro para 16
de Janeiro do próximo ano. Esta mudança não vai afectar a estratégia da RENAMO?
Temos estado a apelar a todos os
moçambicanos em idade de votar para aderiar às urnas em massa. Isto vai evitar
que tenhamos cenários de grandes abstenções. Gostaríamos que as mesas de
votação não ficassem muito distantes de onde as pessoas residem, porque se isto
não acontecer só vai favorecer à FRELIMO. O partido no poder faz isso
intencionalmente com o propósito de fazer com que as pessoas desistam de ir
votar.
O Governo diz que não há dinheiro
suficiente para cobrir as eleições provinciais. Que comentários tem a fazer?
Houve uma grande negligência por
parte do Governo. Ele mostra que não está interessado na realização de eleições
e tudo faz que haja défice não só em termos de observadores internacionais,
mas, também, em meios financeiros para a realização deste processo. Há várias
situações que mostram que a FRELIMO não queria que se realizassem eleições
provinciais, mas por causa da pressão a que foi sujeita, não só pela RENAMO,
teremos eleições provinciais. Com isso não quero desencorajar a comunidade
internacional a apoiar o processo. São as primeiras eleições provincias na
nossa história. Devem ser realizadas para que haja descentralização efectiva do
aparelho do Estado.
Na Assembleia da República, pelo círculo
eleitoral de Gaza, só existem deputados da FRELIMO. Que estratégia a RENAMO traçou
para inverter este cenário?
Seria absurdo falar em estratégia
da RENAMO. O que posso deixar claro é que estamos atentos a essa província,
porque, não obstante votar no partido no poder, é uma das mais empobrecidas do
país. Há possibilidades, de acordo com aquilo que são as potencialidades da
província, de a RENAMO mudar o cenário da província. Isto acontece porque o
Governo não consegue gerir devidamente os bens, o que com o Governo da RENAMO é
possível alterar.
Nas eleições passadas, a RENAMO
conseguia a maioria de voto em algumas províncias do país, sobretudo as da Zambézia
e Nampula, mas actualmente o cenário tende a alterar. O que é que está a
acontecer?
Há a necessidade de acabar com o
jogo da FRELIMO. Podemos dizer que a RENAMO deixou que eles brincassem com os
seus bastiões, mas o que temos que fazer é reforçar a nossa capacidade de
fiscalização no terreno e começar a implementar novas estratégias que possam
realmente mostrar a necessidade de manutenção do apoio que vinha sendo dado à
RENAMO por parte da população. Mas é bom e importante que se diga também que o
que está a acontecer não significa que a RENAMO está a perder espaço nas
províncias. Quero dizer que houve mais roubos nessas províncias por se saber
que são as mais populosas. Mas esta é uma situação que vamos procurar estancar.
Os críticos dizem que para a
RENAMO ascender ao poder deveria afastar o seu presidente, Afonso Dhlakama. Que
comentários faz sobre este pronunciamento?
O que eu posso dizer é que isso é
uma hipótese fora de cogitação. No entanto, a meu ver, esse tipo de
pronunciamento é um boato lançado pela FRELIMO para tentar desacreditar aquilo
que é a imagem carismática e emblemática que temos do líder do nosso partido. O
presidente Dhlakama é um líder que, no meu entender, é incontornável na
política mundial. É uma pessoa que tem presença em qualquer ponto de
Moçambique. Não precisa de fechar escolas, mandar encerrar instituições
públicas quando chega numa província. Os seus comícios são extremamente
concorridos. É uma pessoa que mostra que realmente está em melhores condições
de colocar este país no caminho certo.
Como é que vê o processo democrático
em Moçambique?
É um processo que começou e
esperamos que os passos que já foram dados, desde que a RENAMO impôs a
democracia, continuem. Acredito que grandes liberdades foram alcançadas. Isto é
um processo e neste momento não se deve deixar que seja a RENAMO sozinha a
fazer com que a democracia se mantenha. Toda a sociedade moçambicana tem
que sentir que a manutenção da democracia no país é um processo de todos.
Porém, eu penso que a democracia em si não é perfeita, tem as suas lacunas, mas
é o melhor sistema que conheço e que sinto que vale a pena lutar por ele.
Disse que a democracia tem algumas
lacunas. A que se refere exactamente no caso moçambicano?
Como sabemos, quem tem a maioria
dos votos é que vence. Isso cria certos descontentamentos. Se for a
analisar, neste momento, nas comissões distritais de eleições, por exemplo,
temos a FRELIMO em maioria, em relação à RENAMO, devido a estas questões de proporcionalidade.
Temos elementos da sociedade civil que têm que ser escolhidos através de
critérios de coabitação, mas os elementos da RENAMO que estão nas comissões distritais
de eleições, quando chega a vez de escolher um elemento da sociedade civil para
ser membro da CNE distrital como está previsto na lei, a FRELIMO tem estado a
colocar impedimentos, para não se exercer o direito de coabitação. Estão a usar
a ditadura de voto para amordaçar o direito de coabitação dos elementos da
RENAMO.
CNJ partidarizada
Em 2005, candidatou-se à presidência
do Conselho Nacional da Juventude. Qual era o seu propósito?
Criar no seio do Conselho Nacional
da Juventude (CNJ) espaço para todos os jovens, independentemente da sua
origem. Eu decidi submeter a minha candidatura porque notei que este Governo
partidariza o CNJ, isto para ganhar dividendos, manipulando os jovens
envolvidos naquele processo. Se a pessoa não estiver filiada na FRELIMO
dificilmente obtém apoio do CNJ. Há uma grande perseguição. Eu sou capaz de
mudar aquele conselho, pena é não ter tido oportunidade. O que se quer é ser
frontal, contestar o que não é correcto.
É poetisa, apresentadora de rádio,
estudante universitária e política. Entre todas essas actividades de qual é que
mais gosta?
Eu gosto mais de ser um ser
político. O resto é consequência.
Poderia explicar melhor?
Um ser político por excelência
gosta de trabalhar e lutar por aquilo que é justo. Posso envolver-me em guerras
que penso que sou capaz de vencê-las ou mesmo sabendo que serei vencida não
desanimo antes de lutar. Só a realidade é que me pode dizer que salta para
outra guerra. Nunca deixo uma luta a meio com receio de perder. E isso é algo bom
porque se estás em política tens que ser decidida e determinada. Se consegues
fazer política e ser coerente consigo mesma não terás dificuldades para
conseguir fazer outras actividades suas.
Como mulher e política, quais são
os seus princípios?
Acima de tudo, sou pela lealdade e
coerência. Eu tenho que ser coerente comigo mesma. Eu não posso estar aqui
agora a dizer viva a RENAMO enquanto que no meio interior não acredito no que
digo. Mesmo quando candidatei-me ao CNJ o princípio era o mesmo.
Onde é que se inspira para
escrever poemas?
No dia-a-dia. Alguns dos meus
poemas falam um pouco de mim, do país.
Já pensou em publicar os seus
poemas em livro?
Não descarto essa hipótese. Penso
que é possível. Pegando nas obras que já publiquei em alguns jornais e
revistas, penso que já teria um número interessante de poemas para publicar em
livro. Mas, para publicar um livro, primeiro tenho que amadurecer bem os
poemas, porque eu só publico algo que li, reli e tenho certeza de que
realmente espelha o que pretendo publicar.
O que é que espera que Moçambique
seja nos próximos anos?
Eu gostaria que os recursos de que
o país dispõe fossem distribuídos de igual modo por todo o moçambicano.
Gostaria que aqueles que têm o poder na mão possam seguir o exemplo dos grandes
líderes que quando tiveram que escolher entre encher os bolsos e não
desenvolver os seus países, preferiram desenvolver o país. Gostaria que a
FRELIMO me mostrasse nos próximos anos algo muito interessante que tenha feito
para o desenvolvimento do país, como construir uma cidade.
SAVANA – 03.08.2007
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