sexta-feira, 10 de março de 2017

Sasol continua a não fazer negócios com a “boa gente” e dá preferência a trabalhadores estrangeiros



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Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 10 Março 2017
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Foto do Zitamar NewsA Sasol, que explora gás natural na província de Inhambane há 16 anos, continua sem dar negócio às pequenas e médias empresas locais. “A justificação continua a ser as que as empresas daqui não reúnem qualidade” disse ao @Verdade o representante dos empresários na chamada “Terra da boa gente”. De acordo com o Centro de Integridade Pública, em Moçambique “o conteúdo local não é usado para beneficiar as comunidades locais ou empresariado local. É usado como oportunidade de negócio para figuras da elite política e económica”. Para além disso a empresa sul-africana dá preferência a mão-de-obra estrangeira em detrimentos dos moçambicanos, na semana passada a Inspecção-Geral do Trabalho(IGT) apanhou 34 trabalhadores estrangeiros em situação laboral ilegal.
Entre a mão-de-obra estrangeira ilegal foram encontrados 17 cidadãos de nacionalidade sul-africana, na empresa Sasol Petroleum Temane, Lda, de acordo com um comunicado do Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social, seis deles, “não obstante terem apresentado atestados de contratação no regime de quota, não reuniam condições para o exercício da actividade pois, a empresa já tinha esgotado a quota a que legalmente tem direito, daí que deveriam ter solicitado autorização da Ministra do Trabalho, Emprego e Segurança Social, enquanto os outros onze trabalhadores não apresentaram nenhum documento que os autoriza a trabalharem em Moçambique”.
“Na ocasião, o empregador referiu que, dos 11 trabalhadores, 10 estão a laborar em regime de curta duração e 1 em regime de prestação de serviço, contudo não apresentou nenhuma autorização de trabalho que lhes habilita a laborar no país”, refere o comunicado que estamos a citar.
Entretanto outros “17 trabalhadores foram flagrados na empresa Sasol Petroleum Mozambique, Lda, também sem nenhuma autorização de trabalho, tendo sido todos suspensos. Nesta empresa foram encontrados trabalhadores de nacionalidade britânica, iraniana, canadiana, brasileira, americana e sul-africana”.
O Instituto Nacional de Estatística indica que ao longo dos anos em que a empresa está a explorar os nossos recursos os “manhambanas” quase não obtiveram benefícios em infra-estruturas básicas ou na criação de postos de trabalho. O @Verdade apurou que no ano passado a Sasol, apesar dos milionários investimentos que tem efectuado com lucros sumptuosos, graças as isenções fiscais e artífices de gestão, empregava apenas 147 cidadãos moçambicanos, de um total de 166 funcionários, e nem todos eram naturais da província de Inhambane.
Seis meses depois conteúdo local não se faz sentir para pequenas e médias empresas de Inhambane
Para além da preferência por mão-de-obra estrangeira, particularmente proveniente da empresa mãe na África do Sul, a petrolífera tem dado, ao longo destes 16 anos que explora o gás moçambicano, primazia às empresas estrangeiras para o fornecimentos de serviços e bens. De acordo com a Confederação das Associações Económicas de Moçambique(CTA) somente cinco empresas nacionais tiveram oportunidade de fornecerem bens e serviços à Sasol. Grande parte dos seus consumíveis, mesmo aqueles que não são específicos da indústria e que naturalmente o nosso País não dispõe, é importado e ainda por cima por empresas estrangeiras ou que não são integralmente propriedade de cidadãos moçambicanos.
Supostamente para tentar inverter esse cenário, em finais de Junho do ano passado a empresa realizou, pela primeira vez, um encontro com representantes de empresas nacionais estabelecidas na província de Inhambane.
ArquivoNo evento denominado de “programa de conteúdo local”, que aconteceu em Maputo e em Inhambane, os empresários da “Terra da boa gente” tiveram acesso pela primeira às condições gerais para concorrer às oportunidades de negócios com a Sasol. Uma das condições de base é o cadastro do potencial fornecedor numa base de dados da empresa, contudo constataram exigirem várias exigências e requisitos que as pequenas e médias empresas de Inhambane não reuniam.
Passados mais de seis meses o @Verdade entrevistou, telefonicamente, o presidente do Conselho Empresarial de Inhambane, Amade Osman, que afirmou que “(...)de uma forma geral ainda não é muito notório o envolvimento destas empresas.”
“Em Vilanculo praticamente não se faz sentir nada desse conteúdo local para as pequenas e médias empresas. Em Inhassoro há um pequeno sinal, algumas empresas estrangeiras contratadas(pela Sasol) estão a iniciar alguma sub-contratação de nacionais, mas ainda é uma coisa muito irrisória”, revelou o representante dos empresários da província de Inhambane.
Por outro lado, para as empresas que conseguiram cadastrar-se o desafio seguinte foi terem informação sobre as oportunidades de negócio quando eles surgissem. É que a multinacional sul-africana anuncia-as no jornal estatal publicado em Maputo mas que é de difícil acesso na província de Inhambane.
“(...)Havendo oportunidades eu penso que deveriam encontrar formas de fazer a divulgação em coordenação com o sector privado daqui, mandar uma cópia dos anúncio para que possamos partilhar pelos nossos associados”, lamentou Amade Osman.
O @Verdade contactou no início da semana a Sasol para saber, desde o lançamento do programa quantas micro, pequenas ou médias empresas moçambicanas passaram a prestar algum tipo de serviço à empresa. A multinacional não respondeu as nossas questões.
O @Verdade tentou ainda apurar quantas oportunidades de negócio para as empresas de Inhambane tinham surgido e anunciadas mas a Sasol também não respondeu e, a terem sido anunciados publicamente só devem ter saído no diário estatal que não é acessível a maioria dos moçambicanos. Nem mesmo no sítio da internet do gigante petrolífero foi possível encontrar algum tipo de informação.
Em Moçambique “conteúdo local” dos mega-projectos beneficia figuras da elite política e económica
Recorrentemente os governantes moçambicanos referem que os acordos com as empresas que exploram os nossos recursos minerais preveem que estas devem garantir que uma parte dos seus fornecedores sejam nacionais e da região onde estão implantadas, o denominado “conteúdo local”, daí o nome da iniciativa lançada pela Sasol há pouco mais de seis meses.
Borges Nhamire, investigador do Centro de Integridade Pública(CIP), explicou ao @Verdade que filosoficamente o objectivo do uso de conteúdo local na indústria extractiva é garantir que esta gera desenvolvimento na economia local, através da ligação com outros sectores de economia, criação de postos de trabalho fora do sector extractivo; transferência de tecnologia; impulsionamento do sector privado do país/comunidade hospedeiro, desenvolvimento de infra-estruturas sociais locais.
Todavia Moçambique ainda não tem uma lei específica de conteúdo local, embora a Lei de Minas (Lei 20/2014, de 18 de Agosto) e Lei de Petróleo (Lei 21/2014, de 18 de Agosto) façam menção do uso do conteúdo local mas sem estabelecer regras especificas.
“Da disposição do articulado sobre o conteúdo local nas leis supracitadas aprende-se que o uso de conteúdo local no sector extractivo é uma norma facultativa e não imperativa. Ou seja, não é de carácter obrigatório. É apenas aconselhado que se recorra ao conteúdo local quando este se revelar mais vantajoso”, aclarou o investigador do CIP acrescentando que “está em elaboração desde 2015 a Lei de Conteúdo local”.
De acordo com Borges Nhamire a “prática em Moçambique mostra que o conteúdo local não é usado para beneficiar as comunidades locais ou empresariado local. É usado como oportunidade de negócio para figuras da elite política e económica. Tais figuras se associam ao capital internacional, comparticipando em média com 5% a 15%. O papel destas figuras é garantir a facilitação de negócios através do tráfico de influencia nas instituições públicas de licenciamento e fiscalização”.
“Nos casos estudados pelo CIP, no sector extractivo e de infra-estruturas, a participação do empresariado local nos grandes projectos é muitas vezes feita sem a realização de capital. É uma participação de júri e não de capital. Sendo que o capital destas figuras é político”, concluiu Nhamire.

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