Tuesday, March 10, 2015

Acomodação, conveniência, conluio e cumplicidade consequentes

O TRILHO DA MORTE JÁ É ANTIGO

Canal de Opinião por Noé Nhantumbo

Em nome da revolução ou de qualquer outro artifício conveniente construído deve haver capacidade de discernir que o assassinato político é de génese antiga em Moçambique.
O caminho para a independência nacional tem exemplos bastantes para elucidar quem esteja interessado em conhecer um lado negro da nossa história que alguns recusam que os moçambicanos conheçam.
Embora seja compreensível que quando se luta a morte é uma das consequências directas, outra coisa diferente é montar ou pretender fundar um estado em alicerces dessa natureza.
A cultura da morte como solução de litígios e desinteligências mina a possibilidade de a tolerância reinar e das pessoas viverem em paz e concórdia.
Mesmo antes da morte prematura de Eduardo Mondlane, o movimento de libertação moçambicano sofria de assassinatos de génese e motivação política.
De uma maneira claramente suspeita as autoridades judiciais e policiais nacionais não têm conseguido trazer a público resultados de seu trabalho visando o esclarecimento de crimes.
Cidadãos são baleados e mortos, asfixiados ou raptados mas pouco ou nada acontece ao nível dos órgãos com responsabilidade neste tipo de assunto.
Fala-se e torna-se a falar, declarações são proferidas e aparentemente existe um interesse de esclarecer os casos, só que a maioria acaba esquecida e arquivada.
Pelo que se pode depreender, existem comandos concretos que impedem que as investigações tenham o seu curso normal ou que se reúnam condições humanas e tecnológicas para que as autoridades funcionem e produzam resultados.
Com o acumulado de casos e com o tratamento que tem recebido por parte das autoridades policiais e judiciais, torna-se descabido defender que não existe partidarização destas instâncias oficiais.
O poder político sempre que coincide com o executivo e quando possui influência excessiva sobre os poderes legislativos e judiciais, concorre para a derrapagem de processos democráticos, policiais e judiciais sempre que estes possam influir na mudança do status.
A paralisia institucional e a escassez de resultados, sempre que se exige, não são unicamente obra ou produtos da incapacidade dos agentes policiais.
Vimos durante as eleições de 2014 que a PRM em Gaza não conseguiu prender e dirigir aos tribunais os autores da restrição de actividades políticas pelos partidos da oposição naquele ponto do país.
Fogo posto e violência politicamente motivada verificaram-se noutros pontos do país, tendo havido vítimas humanas, mas isso não foi suficiente para levar as autoridades a agirem conforme está plasmado na lei.
Por declarações verbais, entanto que porta-vozes de um partido, viu-se a PGR e PRM céleres em prender Malagueta e Muchanga, alegadamente por incitação à violência.
Verónica Macamo e outros membros seniores da Frelimo já se manifestaram de igual modo, mas nada lhes aconteceu judicialmente.
Esta maneira de tratar os assuntos indica e demonstra que o poder executivo e judicial estão “inclinados”.
Construir uma sociedade democrática acarreta e significa fazer escolhas concretas e possui uma dimensão moral e ética sem as quais tudo se torna uma fachada.
Enganam-se os políticos de proa e outros quando julgam que podem isolar-se do meio que os rodeia.
Instituir regras e procedimentos a executar por uns e não por outros, impedir que a lei esteja de todos e tudo mina justiça social.
Um emaranhado de procedimentos protocolares e pretensamente símbolos da existência de um sistema democrático e de um estado de direito não constituem em si tais situações.
Crime é crime e todos devem ser tratados com o rigor da lei, independentemente do sujeito que os tenha cometido.
A impunidade judicial enraizada no país supostamente visando proteger “as estruturas” ligadas ao “partido dirigente do Estado e da sociedade”, eram práticas do passado partido único que ainda não foram eliminadas.
Quantas vezes não se tem a percepção de que um comandante provincial ou distrital ou de esquadra da PRM está a obedecer a comandos partidários, que está a cumprir instruções ou ordens do secretário do partido no poder?
Os ataques nas redes sociais de natureza xenófoba e racista contra cidadãos moçambicanos, multiplicados em alguns jornais públicos a coberto de pseudónimo ou abertamente, constituem um recuo político? Ou são unicamente uma forma maquiavélica de gerir um processo pós-eleitoral que não correu a contento de certas pessoas? 
Se a autonomia regional/provincial é tão temida e rechaçada por certos círculos afectos ao partido Frelimo, será pelo receio de perca de influência e de acesso exclusivos a fontes de receitas como são os minerais e a madeira?
Abortada a ideia de uma solução ao estilo de Angola ou de Moscovo no que se refere à manutenção do poder executivo ficou complicado e complexo para alguns estrategas desenharem saídas satisfatórias.
O desespero e desnorteamento são notórios em certos quadrantes políticos nacionais.
Para uns 2014 foi o fim da estrada, pois, mais uma vez, não conseguiram eleger sequer um deputado. Embora estejam em termos práticos mortos, não querem reconhecer os factos e aproveitando-se de uma comunicação social pronta a promover a divisão aparecem, ocasionalmente, a opinar e a sugerir para o vento. 
Para outros, a perda efectiva de assentos no Parlamento constitui uma derrota “amarga” que deita por terra a tese de que a sua permanência no poder era “um imperativo nacional”.
Sem apoio e concurso de uma ala importante do partido Frelimo, houve e regista-se uma baixa de qualidade no seu trabalho político. De maneira visível e perceptível já não se pode falar de fissuras ou simples diferenças. Há um desfasamento estratégico entre membros seniores daquele partido que, obviamente, têm consequências na gestão dos dossiers nacionais.
E, como consequência, a gestão pós-eleitoral está a sofrer percalços de vulto.
Típico de cegueira ou miopia política, alguém está a tomar decisões sem se importar com as consequências. Alguém ordenou que Gilles Cistac fosse assassinado como se isso fosse resolver algum problema ou enviar uma mensagem paralisante para outros críticos.
O que está a ser contestado pela oposição política em Moçambique não se resolve com a eliminação física de quem quer que seja.
Desanuviar o país, gerir a crise faz-se com contenção e inteligência e não com violência bárbara e gratuita. 
Urge interromper o trilho da morte através de medidas concretas de responsabilização política e judicial.
Aos “libertadores”, aos “combatentes pela democracia” essa é a maior herança que Moçambique vos pede que deixem para as gerações vindouras.
Não queremos “puros, imaculados” arvorando-se do direito da vida e da morte.
Queremos dignidade e hombridade, justiça e respeito pelos outros num quadro nacional inclusivo, longe de dogmas e associações delinquentes…
Basta de barbaridades e de sangue de inocentes derramado para que alguém possa exibir pompa, luxo, ouro ou diamantes.
São os moçambicanos e mais ninguém que têm de assumir suas responsabilidades e honrar o sangue fresco de um herói e visionário.
Não basta só marchar nas ruas ou no Facebook… (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 10.03.2015

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