quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Quem são os responsáveis políticos pelas falhas de controlo na Caixa?

CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS

Tribunal de Contas.

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Auditoria do Tribunal de Contas cobre período entre 2013 e 2015, mas cita relatório da comissão de auditoria da Caixa do último trimestre de 2015, na transição do Governo de Passos para o de Costa.
MIGUEL A. LOPES/LUSA
A auditoria do Tribunal de Contas que denuncia a existência de fragilidades no controlo feito pelo Ministério das Finanças à Caixa Geral de Depósitos cobre o intervalo entre 2013 e 2015. Na maior parte deste período, o Governo em funções foi o de coligação entre o PSD e o CDS. Aliás, as principais reações a contestar as conclusões do Tribunal de Contas, conhecidas esta terça-feira, vieram precisamente dos antigos governantes sociais-democratas, em particular de Pedro Passos Coelho, ex-primeiro-ministro, e de Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças.
É indiscutível que as críticas à falta de controlo e acompanhamento acionista do banco, designadamente ao nível da aprovação de contas e planos de investimento e orçamentos, visam o tempo do Governo da coligação.
No entanto, as conclusões do Tribunal de Contas, sobretudo quando questionam a inexistência de um pedido de auditoria da Inspeção-Geral de Finanças, também estão sustentadas num relatório da comissão interna de auditoria da própria Caixa Geral de Depósitos do último trimestre de 2015. O documento revela uma exposição da Caixa a operações, a maioria de crédito, no valor de 4.500 mil milhões de euros, e imparidades (perdas reconhecidas) de 1.500 milhões de euros.
O Tribunal de Contas não revela a data deste relatório, nem quando terá ele chegado ao conhecimento da tutela acionista da Caixa, mas, perante a revelação de “matérias de interesse para a tutela”, os autores do relatório concluem: “Ainda assim, não há evidências de que esta empresa tenha sido objeto de qualquer ação inspetiva da IGF solicitada pelo acionista”.
Mas a quem se dirige a crítica do Tribunal de Contas? O relatório do quarto trimestre reporta-se à situação nos últimos três meses do ano, que só está em condições de ser conhecida e analisada depois de terminado o período. Ou seja, o documento terá sido produzido em 2016 e comunicado à tutela já com os socialistas no poder.
Observador questionou o Tribunal sobre a data em que foi concluído o relatório da comissão de inquérito e quando terá sido reportado ao Ministério das Finanças, que exerce a tutela acionista da Caixa. Fonte oficial do órgão respondeu que toda a informação considerada relevante está no relatório.
A propósito de datas, o documento refere que no SIRIEF (Sistema de Recolha de Informação Económica e Financeira) “apenas constam quatro relatórios trimestrais da comissão de auditoria, relativos a 2015, mas introduzidos no sistema já em 2016.” Também o Ministério das Finanças não respondeu à pergunta sobre se fez algum pedido de auditoria à IGF, na sequência dos dados sobre a exposição da Caixa.
Para Guilherme d’Oliveira Martins, que foi ministro das Finanças, presidente do Tribunal de Contas e está atualmente à frente do conselho fiscal da Caixa Geral de Depósitos, o “acionista Estado não pode deixar de assumir todas as suas responsabilidades em todos os momentos”.
O último trimestre de 2015 apanha o período de vazio de poder, ou de transição entre governos — naqueles três meses, dois liderados por Passos Coelho e um por António Costa — que tão prejudicial foi à gestão do caso Banif. Se o relatório da comissão de auditoria analisa a informação financeira da Caixa do último trimestre, é provável que tenha já sido produzido em 2016, e, portanto, reportado à equipa liderada por Mário Centeno. Se foi concluído e entregue no último trimestre, a dúvida mantém-se: O Governo de António de Costa tomou posse a 26 de novembro.

As reações à auditoria do Tribunal de Contas

A auditoria do Tribunal de Contas é mais uma acha para a muito acesa fogueira de polémicas da Caixa Geral de Depósitos. As primeiras reações vieram dos partidos e dos dirigentes mais diretamente visados. Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque não referiram o relatório da comissão interna da Caixa, preferindo valorizar a relevância e profundidade do controlo da supervisão bancária, do Banco de Portugal e até do Banco Central Europeu, para desvalorizar a capacidade de fiscalização do Estado enquanto acionista e da Inspeção-Geral de Finanças.
O ex-primeiro-ministro, Passos Coelho:
Não há nenhuma falta de transparência, pelo contrário,. Não acredito que o Governo pense de outra maneira e aquilo que existe é um nível de auditoria com profundidade e exigência muito maior do que existiam no passado”.
Destacando a melhoria de transparência, de auditoria, de monitorização que abrangeu todas as instituições do setor empresarial do Estado”, o ex-primeiro ministro destaca que “no caso das instituições do setor financeiro essas exigências ainda eram superiores e foram realizadas por entidades que têm mais vocação do que a Inspeção-Geral das Finanças para as poder fazer, em particular o próprio Banco de Portugal”.
A ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque:
A aprovação das contas da CGD era feita com toda a informação necessária. A Caixa é escrutinada por entidades nacionais e europeias que colocam graus de exigência muito superiores”.
Cecília Meireles, deputada do CDS:
A CGD foi uma instituição muito vigiada e auditada por variadíssimos organismos”.
Para os partidos à esquerda, o relatório do Tribunal de Contas vem reforçar a narrativa de que o anterior Governo desvalorizou a Caixa Geral de Depósitos e não acompanhou os bancos com a atenção necessária.
João Galamba, deputado do PS:
A incúria de PSD e CDS no setor financeira, durante a governação anterior, teve custos. Recapitalizar o Banif com 1.100 milhões de euros e a CGD com 1.650 milhões de euros, sem qualquer acompanhamento adequado do dinheiro que se investiu, teve custos.
Miguel Tiago do PCP:
O Governo PSD/CDS “não utilizou todos os mecanismos que tinha ao seu alcance para controlar a Caixa Geral de Depósitos”. Para o deputado Miguel Tiago, isto significa que houve “falta de zelo do anterior governo“, o que “se torna mais grave ainda porque em 2012 a CGD teve uma injeção de 1.150 milhões de euros de dinheiro público”. Tanto na CGD, como no Banif, o Governo PSD/CDS “atirou os problemas para debaixo do tapete”, enquanto deveria ter “cumprido escrupulosamente” com os mecanismos de controlo.
O Bloco de Esquerda vai pedir a audição do presidente do Tribunal de Contas, Vítor Caldeira, na sequência desta auditoria.
Para Moisés Ferreira, a situação é “grave, não só pela irregularidade processo e falta de transparência, mas também pelo conteúdo dos relatórios trimestrais, evidenciando um crescimento anormal das imparidades (1.500 milhões de euros no final de 2015)”, o que, de acordo com os bloquistas, “deveria ter merecido especial atenção por parte do acionista do Estado”.
“A intenção da audição é muito simples e tem a ver com o relatório sobre o controlo que é feito pelo Estado ao seu setor empresarial e que demonstra que o anterior Governo (PSD/CDS), apesar de ter estabelecido algumas metas estratégicas, nunca fez o controlo sobre se essas metas estavam a ser atingidas e que medidas estava a CGD a implementar para atingi-las”.
Os bloquistas querem que a comissão de inquérito da Caixa investigue a “atuação da tutela no exercício da sua função acionista”.

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