sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Impera fome e miséria dos nativos que perderam terras para investidores estrangeiros nas zonas rurais moçambicanas

Governo reconhece incapacidade da EMATUM pescar atum em 2017 e pretende agravar Dívida Pública em mais meio bilião de dólares
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Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 09 Dezembro 2016
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ArquivoO Governo de Filipe Nyusi reconhece no seu Plano Económico e Social(PES) e Orçamento de Estado(OE) para 2017, aprovado na generalidade nesta quinta-feira(08) pelos deputados do partido Frelimo na Assembleia da República, a incapacidade da Empresa Moçambicana de Atum(EMATUM) de realizar a actividade para que foi criada, pescar atum. Paralelamente o Executivo, parecendo ignorar que a Dívida Pública é neste momento insustentável, pretende endividar o País em mais meio bilião de dólares norte-americanos no próximo ano. Os deputados dos partidos Renamo e MDM votaram contra.
O discurso dos governantes do partido Frelimo, e outros apaniguados, de que a EMATUM poderia pagar a dívida de 850 milhões de dólares norte-americanos - que contraiu secretamente em 2013 com Garantias do Estado que violam a Constituição -, e até poderia gerar lucro, é todos os dias desmentido pela realidade dos barcos ancorados no porto de Maputo e a enferrujarem sem se fazerem à faina.
Enfim o Executivo de Nyusi, que assumiu como de todos os moçambicanos a dívida dessa empresa, reconheceu no Plano Económico e Social que a EMATUM não tem capacidade para pescar atum, a sua razão de existência. É que no plano da produção pesqueira para 2017 estão previstos ser pescadas 900 toneladas de atum, pela frota nacional, e mais 5.100 toneladas, pelas embarcações estrangeiras que operam no Canal de Moçambique.
“A captura do Atum no subsector comercial estimada em 900 tons é justificada pela entrada de 6 embarcações da operadora Pesca Moz, no Porto Base na cidade da Beira”, pode-se ler no PES para 2017 que refere ainda que, “na pesca artesanal, projecta-se uma produção de cerca de 2.700 tons de Atum com maior concentração da produção na província de Nampula”.
Agostinho Mondlane, o ministro do Mar, Águas Interiores e Pescas, que num passado recente afirmou que “a EMATUM está a começar e nós temos a esperança de que a empresa vai singrar”, questionado pelo @Verdade no Parlamento, sobre a não referência da produção da Empresa Moçambicana de Atum no documento que serve de guião para as actividade do Governo no próximo ano, disse apenas “essa conversa tem que ter com a própria empresa”.
Recorde-se que uma análise do @Verdade ao plano de viabilidade que a empresa apresentou ao banco Credit Suisse para a contração do empréstimo mostra que os 24 barcos de pesca nunca conseguiriam geram os 850 milhões de dólares da dívida que entretanto foi assumida pelo Governo de Filipe Nyusi como de todos os moçambicanos e legalizada, com a cumplicidade da bancada parlamentar do partido Frelimo.
A EMATUM está tecnicamente falida e não conseguindo sequer honrar os compromissos com os seus trabalhadores que recentemente realizaram um greve.
Orçamento para hipotecar ainda mais o futuro de Moçambique
Orçamento do Estado 2017Entretanto o Governo de Nyusi, que está a braços com uma Dívida Pública que este ano vai atingir 130% do Produto Interno Bruto, e assumiu recentemente que não tem capacidade para pagar antes de 2021 os mais de 2 biliões de dívidas que a EMATUM, a Proindicus e a Mozambique Asset Management contraíram secretamente com Garantias do Estado que violam a Constituição, pretende a emitir garantias e avales estimados em 550 milhões de dólares norte-americanos durante o próximo ano.
“O país está abraços com uma dívida medonha, impagável e criminosa, avaliada em mais de dez biliões de dólares com taxas de amortização fixada em mais de 25%, as mais altas do mundo, decorrente, como todos sabemos, da emissão de avales e garantias irresponsáveis. Mas hoje, o governo insiste e pede que autorizemos a emissão de mais avales e garantias, não é isso brincar com o povo? Mas exige o governo sem papas na língua e quer que esta assembleia aprove: É autorizado o Governo a emitir garantias e avales, no montante máximo de 40.600.000,00MT, confiram artigo 10, pg. 11. Da Lei do orçamento para 2017” questionou o deputado Silvério Ronguane do Movimento Democrático de Moçambique.
Ronguane interrogou ainda ao Governo sobre os motivos que o levam a pretender contrair mais dívida não conssecional e comercial, “O que querem com isso? Hipotecar o país? Penhorar os seus recursos? É assim que pagais o povo que vos sustenta?”.
Parlamento é um guiché onde Governo carimba os documentos que precisa
Por outro lado o Orçamento que corta em cerca de meio bilião de meticais o apoio a Protecção Social Básica - das crianças, pessoas idosas, pessoas com deficiência, mulheres e chefes de agregado familiar mais pobres -, não contempla a totalidade dos fundos necessários para a minimizar o drama da seca no Sul e Centro e nem mesmo aloca a totalidade dos recursos necessários para materializar o Plano de Contingências da época chuvosa, mostra a pouca atenção que o Governo dá a agricultura.
Além de parcos recursos alocados ao sector que não só é fundamental para a geração de comida, cujos preços não param de aumentar, mas também emprega mais de 70% dos moçambicanos, muitos deles de forma precária, o PES é fundamentado com dados errados e não apresenta as previsões da produção nas principais culturas de rendimento. Os extensionistas rurais que tanta falta fazem aos camponeses continuarão a ser poucos, em 2017 deverão ser contratados apenas cerca de quatro centenas.
Arquivo“Onde é que está o plano para 2017” questionou o deputado José Samo Gudo, da bancada do partido Renamo. O ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, retorquiu que o quadro de previsões foi elaborado por campanha agrícola daí a não referência ao próximo ano. Mais uma vez faltou com a verdade o ministro Maleiane pois no que diz respeito as culturas alimentares os dados já indicam 2017.
Outra incongruência nota-se na repartição dos fundos, embora o Governo apregoe que os distritos são os pólos de desenvolvimento na verdade dos mais de 209.893 milhões de meticais previstos gastar no próximo ano 65,9% ficarão em Maputo, pouco mais de 3% do que em 2016.
Indiferente a estes planos e alocações financeiras que continuarão a não beneficiar o povo os deputados do partido que governa Moçambique desde 1975 votaram à favor e até louvaram os esforços do seu Executivo transformando a Assembleia da República “num departamento do Governo, num autentico guiché para carimbar todos os documentos de que precisa e com o entoar do som do martelo vão aumentado o calvário do povo moçambicano”, como afirmou o deputado Ivan Mazanga, da bancada parlamentar do partido Renamo.
Escrito por Emildo Sambo  em 09 Dezembro 2016
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A vida da população que perdeu as suas terras a favor das companhias que, com o beneplácito do Governo moçambicano, implementam ambiciosos projectos de produção de alimentos numa cadeia orientada para o negócio e a exportação, definha a cada dia que passa. As dificuldades a que essa gente está sujeita são as mesmas de sempre, desde a usurpação da terra com promessas de um falso futuro melhor à falta de meios de sobrevivência, sobretudo de comida, água, saneamento e serviços básicos e dignos de saúde, educação e electricidade. No distrito de Gurúè, província da Zambézia, a situação é a mesma.
Um relatório divulgado quinta-feira (08), em Maputo, pela Acção Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU) em parceria com O Instituto para a Pobreza, Terra e Estudos Agrários (PLAAS), da África o Sul, indica que, pese embora a nossa Lei de Terra seja uma referência na região Austral, vários camponeses perdem as suas terras e “são confinados em espaços marginais” e impróprios para qualquer prática agrícola.
Em Gurúè, os pequenos agricultores que ainda não foram atingidos pela vaga de expropriação de terra “sentem-se inseguros devido às deslocações galopantes causadas pelos novos agro-investidores.
As áreas de cultivo reduziram”, aponta o estudo sobre “o papel de agro-negócio na reconfiguração dos sistemas agro-alimentares”.
O drama de população daquele ponto do país é inimaginável, principalmente para quem usualmente fala da agricultura como um chavão político. Os camponeses que sobreviviam nas encostas mais baixas do monte Namuli, onde agora a empresa Macadamia explora a produção de nozes, foram privados não apenas das suas terras, mas, também, do “acesso aos riachos e outros recursos naturais”, ora vedados.
Quem antes produzia chá, couve, cebola, tomate, feijão, batata-doce, entre outras culturas, agora recorre, forçosamente, aos mercados locais para se alimentar. “As mudanças têm sido negativas para os menos abastados, incluindo mulheres (...)”, disseram Clemente Ntauazi, da ADECRU, e Felioe Joala, da PLAAS.
“(...) Estas terras não são suficientes e os sofre são pobres. Produzo meia tonelada de milho por colheita. O meu celeiro vai esvaziar antes do fim do ano e esta situação é agravada pelo facto de eu ter de vender parte dos meus cereais para satisfazer as minhas necessidades imediatas, ou seja, propinas escolares dos meus filhos durante o ano. Terei de comprar comida, incluindo milho, o que nunca acontecia antigamente”, narrou uma mulher agricultora, no estudo identificada pelo nome de Gladiaona.
Entretanto, ainda há algumas mulheres que, como forma de assegurar a sua sobrevivência e de seus dependentes, desenvolvem uma produção de soja em grande escala e usam sementes certificadas oferecidas pelo governo da Zambézia e por algumas organizações.
“A soja tornou-se uma importante cultura de rendimento no distrito de Gurúè, à frente de produção do tabaco, chá e girassol”, disseram os apresentadores da pesquisa, esclarecendo que o seu trabalho toma Gurúè como um caso concreto, mas os problemas levantados ocorrem com os camponeses de outras regiões do país.
Apesar desse auxílio na aquisição de sementes certificadas (consideradas transgénicas), cujo preço é considerado bastante elevado, os pequenos agricultores queixam-se do facto de elas não resistirem à seca nem às pragas. Aliás, eles alegam ainda que a garantia da disponibilidade de tais sementes pode não existir mais quando os investidores estrangeiros abandonarem o país.

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