terça-feira, 1 de novembro de 2016

Caríssimos Colegas das Comissões de instalação criadas pelo MCTES para restruturar a UP



Meu nome é António Prista e sou Professor Catedrático da Universidade Pedagógica. Surpreenderam-me os ofícios emitidos pelo Excelentíssimo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Profissional relativos à criação de novas Universidades a partir da divisão da Universidade Pedagógica (UP). Acredito que, na minha qualidade de Catedrático, docente e investigador da UP há mais de duas décadas, posso ter o direito (e o dever) a uma opinião. Permitam-me que emita algumas considerações e sugestões sobre este assunto.

Nos referidos ofícios é anunciada a extinção da UP e a sua fragmentação em Universidades Regionais. Esta medida tem como objectivo “... reduzir os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas, racionalizar o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros, bem como conferir o ensino superior uma nova dinâmica e eficiência de funcionamento”. No mesmo ofício são criadas comissões instaladoras de 4 novas Universidades que serão criadas a partir da já existente. Constituindo parte 
do quadro docente da Universidade Pedagógica e considerando as responsabilidades educativas, sociais e políticas de uma Universidade solicito a atenção de Vossas Excelências para as seguintes preocupações:

1. A reestruturação de uma Universidade é normalmente acompanhada de um processo de avaliação institucional. Apenas uma avaliação técnica, de carácter objectivo e com reconhecida isenção, pode fundamentar medidas de ajustamento e, em particular, uma medida tão radical como aquela que foi agora adoptada. De outro modo, não se pode entender como a solução sugerida “reduzir” os níveis de duplicação de cursos e Unidades Orgânicas, “racionalizar”, o uso de recursos humanos, patrimoniais e financeiros e tornar a Universidade eficaz e produtiva” surge de um diagnóstico da actual situação. Não existindo essa avaliação crítica não se percebe como a simples divisão da UP em 4 universidades resultará automaticamente na racionalização dos recursos, redução de despesas e melhoria a sua eficiência.

2. Não tendo existido um processo de avaliação e não conhecendo a existência de estudos que conduziram á conclusão mencionada, o que se afigure mais lógico é pressupor que a criação de várias universidades multipliquem as despesas em vários itens, incluindo com a necessária multiplicação de órgãos e cargos.

3. O despacho determina ainda que as Comissões devem “Avaliar e elaborar os currículos dos cursos da Instituição a criar”. No caso da UP os currículos vigentes resultaram de um processo sistematizado e longo de revisão curricular que envolveu toda a comunidade académica. Aliás, foram elaborados depois de um longo estudo sobre o papel da UP no país no quadro do seu plano estratégico amplamente discutido e, o mais importante, elaborados por órgãos académicos competentes (Faculdades) e aprovados por órgãos com competência para tal (Conselho Académico e Conselho Universitário). Não parece ser aconselhável uma nova reforma sem deixar terminar o actual ciclo e ignorando o trabalho sério e responsável realizado pelos profissionais da UP. As alterações fora de um processo sistematizado não permitem um alinhamento e construção de modelos consolidados. Sabendo que o processo de avaliação curricular é complexo e longo, não parece ser viável a avaliação e alteração de 76 currículos no período de 6 meses conforme determina o despacho.

4. A recomendação para cada comissão apresentar o nome tendo em vista a Missão e Visão da nova instituição criada” subentende que a Missão das novas instituições pode não ser a formação de professores. Num país onde o constrangimento mais saliente da Educação é a falta de qualidade, parece ser um contra senso eliminar a missão que norteia a actual Universidade. Pelo contrário, sendo a Educação a condição essencial do desenvolvimento, espera-se o reforço do investimento em meios financeiros e Humanos para que garanta o sucesso dessa missão.

5. As comissões criadas são compostas, com uma única excepção, por elementos alheios á Universidade Pedagógica. O despacho passa por cima de uma experiência acumulada dos mais de 3 mil profissionais da UP (entre docentes e CTA), atribuindo aos mesmos um atestado de incompetência. Ao entregar a reflexão e reformulação dos destinos da UP nas mãos de profissionais de outras instituições dever-se-ia, no mínimo, ter realizado um processo de avaliação dos docentes da UP para que lhes pudesse ser atribuída nota tão negativa. Por outro lado, colocando de lado os actuais docentes e funcionários, é pouco provável que o processo tenha um resultado positivo. Relembro que estatutariamente os cursos, planos de estudo e programas são aprovados pelos órgãos académicos da própria Universidade.

Caros colegas,

O actual estágio da UP resulta de muitos anos de trabalho e esforço de milhares de académicos e outros profissionais. Ao longo desse processo cometeram se obviamente os mais diversificados erros pelo que a avaliação e reformulação constante constitui uma condição indispensável. Contudo é com enorme preocupação que vejo a formação de uma comissão de académicos que vem questionar uma Universidade que pouco conhecem, não para realizar uma avaliação Universitária (que seria muito útil) mas executar uma decisão que nega à partida todas as enormes conquistas da UP. Esta abordagem, mesmo que involuntariamente, é entendida como uma ofensa à dignidade profissional e académica de muitos de nós. Todo um legado de muitos anos e de muito esforço e abnegação corre o risco de ser ignorado e desrespeitado.

Tendo em atenção os motivos acima expostos, e, num espírito de contribuir para o processo de forma construtiva, venho pois sugerir que façam as seguintes sugestões ao Exmo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Profissional:


1. A reformulação dos termos do despacho;
2. A realização de uma avaliação da UP nos moldes academicamente aceites;
3. A integração nas comissões de avaliação institucional elementos da UP, outros académicos nacionais como Vossas Excelências mas também Internacionais;
4. A alteração do calendários em função dos resultados do processo de avaliação institucional;
5. A inclusão na avaliação de um estudo que conduza de facto a uma ou mais instituições mais eficazes e parcimónias conforme designa o despacho como objectivo.

Todas estas sugestões nasceram do fundo desejo de contribuir positivamente na certeza que Vossas Excelências valorizam o meu propósito de partilhar toda a carga de experiência acumulada e na vontade patriótica de ver melhorada a qualidade do ensino e investigação nacional.

Agradecendo a Vossa a atenção ao assunto, endereço as mais cordiais saudações académicas.

Maputo 31 de Outubro de 2016

António Prista
Professor Catedrático da Universidade Pedagógica


GostoMostrar mais reaçõesComentar

9 comentários
Comentários

Naine Mondlane hehehehehe... isto ainda vai animar pah!

Nordito Habibo Nehru Mas esse assunto já foi aprovado no Conselho de ministros e não me parece que a UP ou pelo menos o Conselho Universitário da UP não tenha tomado conhecimento. Só posso pensar que o professor PRISTA foi excluído do processo

Euclides Cumbe Com muita razão Prof. Prista

Isaac Sitoe Jr. Escrever..

Nelson Jorge Nhamahango Foi uma análise muito exaustiva e pontual. Até pode ser que haja essa necessidade, mas como afirma-lo sem um estudo de base ou um diagnóstico situacional????? Penso que um destes instrumentos deve existir porque são a base para que o Conselho que apreciou e tomou a decisão...desse mérito à essa mudança....e que mudança nem!!

Vagner Basilio So posso ficar com saudades da minha UP!

Estevao Muchave Hehehehe, UP vai de mal a pior, já teremos muitas UPs em Moçambique, fruto da fragmentação. Bons tempos da UP, já eram. Fiquei de boca aberta quando tomei conhecimento da existência do curso de mestrado em Jornalismo na UP.

Rutuane Valgy Integrem dr. GaLino Namorro nessa reestruturacao. por favor.

Filipe Nhalungo Professor Prista, eu so ignorante na materia, pelo conteudo percebi o fundo da questao. Problema do nosso pais ou dos nossos gestores publicos, nao escutam conselhos dos tecnicoe ou academicos.

Sem comentários: