domingo, 23 de outubro de 2016

Faltam recursos e capacidade para conter criminalidade,

MOÇAMBIQUE

 afirma procuradora-geral de Moçambique

Segundo Beatriz Buchili, é preciso reforçar a cooperação jurídica e judiciária para dar mais celeridade às investigações de crimes como os assassinatos de membros da RENAMO.
Beatriz Buchili (DW/J. Carlos)
Beatriz Buchili, procuradora-geral de Moçambique, no encontro em Lisboa
As autoridades judiciais e policiais moçambicanas não dispõem de recursos e capacidade suficientes para conter a onda de criminalidade, abrangendo atos que indiciam prática de corrupção e branqueamento de capitais. A relevação é da procuradora- geral da República de Moçambique, Beatriz Buchili, que, em declarações à DW África em Lisboa, manifesta preocupação face à penetração do crime organizado nas instituições do Estado e do sistema judicial.
A procuradora-geral está na capital portuguesa a participar no 14º Encontro dos Procuradores-Gerais da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), cujos trabalhos terminam esta sexta-feira (14.10.). Beatriz Buchilli considera hediondos os crimes envolvendo o assassinato de figuras políticas da sociedade moçambicana, mas recusa entrar em detalhe a respeito dos processos de investigação em curso sobre o caso das dívidas ocultas.
Segundo a procuradora-geral, as entidades competentes moçambicanas estão a envidar todos os esforços na investigação dos crimes que têm como alvo figuras do xadrez político em Moçambique.
"Todos estes processos estão em investigação. O grande problema que nós temos é que são processos que têm contornos de crime organizado e transnacional. Daí que a nossa preocupação de reforçar mesmo essa cooperação jurídica e judiciária para dar celeridade às investigações desses processos (em curso). E são processos que demonstram que há necessidade de reforçarmos muito (as capacidades de resposta do) Ministério Público e os demais orgãos auxiliares de investigação criminal como a polícia de investigação criminal e demais instituições, o judiciário no seu todo”, afirma Buchili.
Apelo ao fim da impunidade
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O membro da RENAMO, Jeremias Podenca, à esquerda, assassinado no dia 8 de outubro
O mais recente acontecimento foi o assassinato, no dia 8 de outubro, de Jeremias Pondeca, representante da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO, principal partido da oposição) nas negociações de paz com o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), no poder.
A este somam-se vários outros crimes como foram nos casos de Gilles Gistac, constitucionalista moçambicano de origem francesa (morto a 3 de março de 2015), e Manuel Bissopo, secretário-geral da RENAMO, que escapou à morte depois de ter sido baleado por desconhecidos a 20 de janeiro deste ano.
Esta semana, o Governo português, através de um comunicado emitido pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, deplorou o assassinato de Jeremias Pondeca, membro da delegação da RENAMO na Comissão Mista para a Preparação do Diálogo de Alto Nível. Portugal apelou às autoridades moçambicanas para que todos os esforços sejam envidados no sentido de identificar e julgar os perpetradores deste ato deplorável.
Celeridade judicial
O Ministério Público moçambicano também investiga o caso das dívidas ocultas, estando em curso procedimentos para se apurar as responsabilidades. Mas, por dever legal, Beatriz Buchilli mostra reserva em abordar o assunto.
"O que nós podemos dizer é que estamos a fazer todo o esforço para dar celeridade a este processo.
Fato é que as autoridades moçambicanas enfrentam sérias dificuldades para lidar com todos estes crimes, incluindo os de natureza económica e financeira”, confirma a procuradora-geral da República.
 
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Faltam recursos e capacidade para conter criminalidade, afirma procuradora-geral de Moçambique

Beatriz Buchili defende um reforço da cooperação jurídica e judiciária para tornar a Justiça moçambicana mais célere. "Sem dúvida que nós sentimos grandes dificuldades. Neste momento temos um quadro legal que acomoda um pouco, mas temos que melhorar por exemplo na área da cooperação jurídica e judiciária, porque com a globalização todos os crimes hodiondos que nós temos em Moçambique, como os homicídios, os raptos, tem contornos de crime organizado transnacional. Então esta componente tem que ser reforçada”.
Além disso, acrescenta, é também preocupante em Moçambique a questão da ética e deontologia dos magistrados, debatida num seminário internacional, que decorreu esta quarta-feira (12.10.) na sede da Polícia Judiciária portuguesa.
"O grande problema é que o crime organizado e transnacional em Moçambique tem penetrado até nas instituições do Estado, incluindo o setor judiciário. Então é preciso fazer um trabalho muito grande para termos magistrados ética e deontologicamente também preparados”, pontua.
Cooperação
 Em Lisboa, a procuradora-geral moçambicana tem mantido contatos com os parceiros lusófonos, em busca de cooperação internacional para fazer face à onda de criminalidade no seu país.
"Nós temos cooperação, acordos bilaterais, com alguns Estados, mas neste momento vamos alargar os nossos contatos com os países da CPLP e com outros países ibéro-americanos. Porque para além dos contatos formais de cooperação – que são muito morosos para a dinâmica das investigações que nós queremos –, os contatos informais que a gente consegue aqui facilitam muito as investigações. Sem dúvida que a experiência portuguesa e brasileira vai ser útil para Moçambique”, acrescenta.
Buchilli considera este encontro uma oportunidade para partilha de informação e de experiências num momento em que o Estado moçambicano enfrenta situações graves de corrupção e de crime organizado transnacional como o branqueamento de capital.

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  • Autoria João Carlos (Lisboa)

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