domingo, 21 de agosto de 2016

COMO TUDO COMEÇOU


27. Outubro 2013
FORÇAS ESPECIAIS DESTROEM BASES MILITARES DA RENAMO.
As Forças Armadas de Defesa e Segurança (FDS) estão a realizar operações para desmantelar as bases da Renamo que albergam elementos armados que têm estado a efectuar, desde os princípios do ano em curso, vários ataques a alvos civis e outros. Esta semana foi tomada a base de Santundjira, onde estava aquartelado Afonso Dhlakama, na sequência de provocações efectuadas por homens da “perdiz” às FADM.
A Reportagem do jornal domingoescalou o Posto Administrativo de Vunduzi quarenta e oito horas depois da desactivação da base militar de Santundjira, onde há cerca de um ano, o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, se refugiara com um número significativo de guerrilheiros. Parte destes elementos vinham, desde Abril, perpetrando ataques armados a alvos civis e militares em alguns pontos da província de Sofala, nomeadamente, Muxúnguè, Chibabava, Savane, Vunduzi e Maringué.
Conforme apurámos no local, a operação que culminou com o desmantelamento da “base de Santundjira” processou-se em dois momentos distintos. O primeiro foi a 18 de Outubro, quando uma força conjunta, que integra os diferentes ramos e unidades das Forças de Defesa e Segurança (FDS), assaltou e ocupou uma base avançada dos homens armados da Renamo na região de Macodza, há sensivelmente 17 quilómetros de Santundjira, onde pelo menos dois guerrilheiros da Renamo foram abatidos e outros sete capturados (um na base e outros seis, quando encetavam uma fuga precipitada).
A derradeira operação que culminou com a tomada da base de Santundjira deu-se no dia 21, segunda-feira passada, por volta do meio-dia, onde, segundo relatos de altas patentes militares, não houve baixas humanas do lado das forças governamentais em razão de a mesma “ter sido estrategicamente concebida e executada de modo a evitar um banho de sangue”.
A Renamo, por via do seu porta-voz, Fernando Mazanga, condenou o ataque àquela base e avançou que também não havia sido registada qualquer baixa humana, embora na tarde de sexta-feira última se tenha reportado a morte de Armindo Milaco, que era deputado na Assembleia da Republica pela bancada da Renamo, na sequência de alegados ferimentos graves contraídos durante o ataque à base de Satundjira.
A nossa Reportagem chegou à fala com alguns membros das FDS que participaram na operação e que, sem quaisquer formalismos, trataram de anotar que o objectivo não era aniquilar Afonso Dhlakama, mas sim agir em legítima defesa aos ataques provocatórios e sistemáticos dos homens armados da guarda pessoal do líder da Renamo tal como aconteceu no próprio dia 18 de Outubro, sem falar de outros episódios do género anteriormente registados.
“Isso passava necessariamente por responder, na proporção e meios apropriados, a tais provocações e iniciar um processo de desactivação gradual das bases militares que a Renamo deliberadamente estabeleceu em alguns pontos da província de Sofala à margem da lei e de todos princípios que regem um Estado democrático. Em qualquer parte do mundo os focos de instabilidade e insegurança de pessoas e bens devem ser eliminados, e é o que aconteceu”, disse peremptória a nossa fonte.
Localizada num ponto bastante estratégico nas proximidades da serra da Gorongosa, a base encontra-se no meio de um autêntico arvoredo que disfarçadamente omite a presença de cabanas e guaritas e estava cercada por um número razoável de casas de pau à pique e machambas pertencentes a algumas famílias nativas, que involuntariamente serviam de escudo humano, numa medida ardilosamente tomada pelos estrategas militares da Renamo com intuito de impedir ou dificultar um eventual ataque militar das forças governamentais.
Mas ao que tudo indica o até então último reduto de Afonso Dhlakama foi tomado sem ter sido necessário “queimar muitas munições”. A ofensiva militar das forças governamentais, que durou cerca de duas horas, deverá, segundo nossas fontes, prosseguir, e estender-se para outras zonas de Vunduzi, principalmente para a zona da serra da Gorongosa.
As FDS não podem cruzar
os braços quando atacadas
- Armando Guebuza, Presidente da Republica e Comandante em Chefe das Forças de Defesa e Segurança
Naquele que foi o seu primeiro pronunciamento em volta dos últimos acontecimentos de Santundjira, o Chefe do Estado e Comandante em Chefe das Forças de Defesa e Segurança, Armando Guebuza, reiterou a partir da vila sede do distrito de Chemba, o seu compromisso com a manutenção da paz no país de tal forma que se predispõe “apesar de tudo, a dialogar com o líder da Renamo”. Mas advertiu que as “Forcas de Defesa e Segurança (FDS) não podem continuar a cruzar os braços quando atacadas”.
Guebuza expressou a sua indignação em relação a certos sectores de opinião que explicitamente condenam o desmantelamento das bases militares da Renamo, em Gorongosa, e que insinuam, paradoxalmente, que as FDS devem responder “com o diálogo” aos ataques que amiúde têm sido perpetrados pelos homens Renamo.
“Ora, isto é uma autêntica inversão de valores. O governo e as Forças de Defesa e Segurança, quando atacadas, não podem cruzar os braços porque, se assim for, como indivíduos correm perigo de vida e, pior do que isso, a Nação fica desgovernada. Alguns daqueles que defendem que as FDS deveriam ficar inactivas quando atacadas de facto não estão interessados numa ordem constitucional sólida no nosso país”, disse Guebuza.
Num outro momento, o Chefe do Estado referiu que as mesmas pessoas não se pronunciam quando há ataques à população, às Forcas de Defesa e Segurança e nem quando há raptos, mas quando o Governo responde aos ataques de malfeitores “sentem-se mal”.
Contudo, apesar do que aconteceu, o Governo acredita que “o diálogo é que é a resposta para os problemas que nós temos agora”, tendo o Presidente Guebuza apelado à população moçambicana para que não se deixe aterrorizar pelos cenários dramáticos que deliberadamente têm sido “fabricados”, provavelmente pelos mesmos sectores, que defendem a violação da ordem constitucional no país e que as FDS “cruzem os braços quando atacadas e fiquem, igualmente, impávidas e serenas quando a integridade física de cidadãos civis e suas propriedades é posta em causa. Esses procuram criar um ambiente de medo no seio da população para as pessoas ficarem assustadas e as suas ideias e posições, baseadas em interesses e objectivos ocultos, serem facilmente aceites. Mas devemos ser firmes e estarmos certos de que estamos no caminho certo. A nossa missão é defender os interesses dos 23 milhões de moçambicanos e o desenvolvimento de Moçambique, o que está efectivamente a acontecer”, sustentou Guebuza.
Dhlakama pode ter-se
escapulido antes do ataque!
São ainda escassas as informações sobre o paradeiro e estado em que se encontra Dhlakama. Dos vários relatos, ainda que divergentes, consta que pouco antes do “assalto”, Dlhakama e dois deputados da bancada da Renamo bem como alguns dos seus guerrilheiros trataram de se escapulir da base, quando se aperceberam-se que a base avançada de Macodza havia sido desmantelada.
Aventam-se, de entre várias hipóteses, a de ter havido uma fuga de informação ou simplesmente ter se deixado uma brecha para que Dhlakama se escapulisse e ele próprio “julgar que conseguiu fugir”.
Há quem diga que ao refugiar-se em Santundjira, o líder da Renamo metera-se num beco sem saída e isso foi motivado pela forte pressão que a sua força residual vem fazendo. Os guerrilheiros da Renamo exigem a Dhlakama um conjunto de condições difíceis, ou quase impossíveis, de satisfazer sem um suporte financeiro de “uma mão amiga”.
Contudo, contra todo o drama e desinformação que se produziu em volta do desbaratamento da base de Santundjira, a nossa Reportagem não visualizou qualquer sinal que denote que se tenha fustigado o líder da Renamo e seus homens armados com artilharia pesada, como especulou o porta-voz da Renamo, Fernando Mazanga, em conferência de imprensa.
Na sua fuga para as colinas da serra da Gorongosa, o líder da Renamo e seus homens armados deixaram ficar duas viaturas “pick up” de marca Nissan Navara e Ford Ranger, supostamente pertença de dois deputados da Assembleia da República pela bancada da Renamo e que eram usadas para as operações logísticas na base de Santundjira.
Para além disso, foram encontrados, de entre os bens pessoais de Dhlakama, protótipos de novos símbolos da Renamo (bandeira), electrodomésticos e uma cama na palhota onde supostamente dormia o líder da Renamo.
Cenário de guerra é improvável
No entanto, a nível do meio urbano multiplicam-se e sobem de tom algumas vozes que consideram esta situação como sendo o “princípio do fim da paz em Moçambique” numa clara insinuação de que irá eclodir uma guerra civil no país a qualquer momento.
Pelo que a nossa Reportagem constatou, tanto em Santundjira assim como noutros pontos da província de Sofala, onde se teme que os guerrilheiros da Renamo possam estar escondidos e em posição de, a qualquer momento, iniciarem uma guerra, parece pouco provável que tal teoria se operacionalize.
Tudo indica que Dhlakama e suas tropas refugiaram-se na serra de Gorongosa, a qual até altura em que a nossa Reportagem por lá passou, encontrava-se cercada por um contingente militar que controla quase que à lupa todos movimentos de qualquer bípede. Trata-se de uma força conjunta que integra vários ramos das FDS “super equipados” e que “exalam” muita experiência de combate em ambiente de guerrilha.
Ora, o cenário de uma eventual guerra, no sentido clássico do termo, parece improvável nas actuais condições desvantajosas em que o líder da Renamo e suas forças residuais se encontram.
À parte a desarticulação dos vários grupos e subgrupos de homens armados da Renamo que se encontravam tanto em Santundjira assim como em outras bases ora desmanteladas em Mucodza e algures em Muxúnguè, Dhlakama e seus estrategas militares” precisariam de uma logística, que no mínimo teriam que levar mais de dez anos a organizar.
Outro factor que não joga a favor de Dhlakama e seus homens armados prende-se com a baixa densidade populacional da região onde se havia instalado a base de Santundjira e mesmo da zona onde se acredita que eles tenham se refugiado depois do ataque de 21 de Outubro.
Como se isso não bastasse, nota-se um total alheamento da população de Gorongosa, zonas circunvizinhas (e de quase toda sociedade moçambicana) em apoiar a Renamo a levar a cabo as suas acções de guerrilha.
Importa referir que enquanto nos dirigíamos à base de Santundjira cruzamo-nos com várias pessoas carregadas de trouxas e que revelaram estarem à caminho da sede do posto Administrativo de Vunduzi onde entendem haver melhores condições de segurança e não correm o risco de a qualquer momento serem usadas como escudos humanos pelos guerrilheiros da Renamo.
Regressem às vossas casas
porque não estamos em guerra
- apela Viola Caravina, Chefe do Posto Administrativo de Vunduzi
Alguns elementos da população de Vunduzi viram-se forçadas a abandonar as suas casas e procurar abrigo em lugares mais seguros da província de Sofala, tais como a vila-sede do distrito de Gorongosa, distritos de Macossa, Caia, e a cidade da Beira.
Com cerca de 16.500 habitantes distribuídos em quatro localidades com terras altamente férteis para a prática da agricultura as autoridades locais de Vunduzi viram-se na contingência de paralisar quase todos os serviços públicos.
As unidades sanitárias e as escolas estiveram completamente encerradas durante alguns dias. O pessoal médico, alunos e professores abandonaram Vunduzi dado o espectro de violência que se instalou naquele local. O comércio também ficou completamente paralisado.
domingo abordou alguns populares de Vunduzi os quais manifestaram-se preocupados com o espectro de violência e apelaram para que o Governo faça tudo que estiver ao seu alcance para devolver o ambiente de tranquilidade às suas vidas e ao desenvolvimento socioeconómico local.
Carlitos Mainato, pai de oito filhos levava trouxas à cabeça, quando foi interpelado pela nossa Reportagem o qual contou que naquele instante estava a fugir para as matas por temer “uma confrontação entre as FADM e os homens da Renamo. A população ficou dispersa. Algumas pessoas foram para região de Bango outras em Nhaduto. Já estamos a passar fome, porque não tivemos tempo para recolher os nossos alimentos. Agora vou à vila, para ver se consigo adaptar-me à nova vida, até que se ultrapasse o problema”, disse.
Por seu turno, Farena Johane revelou que “havíamos fugido para o monte Chiluvo, mas quando mandaram-nos regressar às nossas casas reocupamos os nossos campos de produção agrícola e recuperamos outros bens. Estamos com planos de nos refugiarmos na cidade de Chimoio, mas, não temos dinheiro de transporte. Queremos chegar à casa do meu filho para nos escondermos. Não podemos ficar aqui porque estamos com medo. Os guerrilheiros da Renamo ainda estão na zona da montanha e as FADM também por aqui. A qualquer altura podem começar a disparar. Não temos outra hipótese senão abandonarmos a zona até que a situação se normalize”, afirmou aquela cidadã, mãe de quatro filhos.
Entretanto, Viola Caravina, chefe do posto administrativo de Vunduzi, assegurou-nos que como governo local, os seus executivos está a sensibilizar a população para que, o mais urgente possível, regresse às suas residências, porque “não estamos em guerra. As pessoas devem retomar a vida normal. Tudo passou. Estamos na época agrícola. A chuva está cair e é tempo de lançarmos a semente para produção de comida e combatermos a fome. Se ficamos longe dos nossos campos de produção, o tempo vai passando e no futuro teremos bolsas de fome, o que poderá agudizar a pobreza”, referiu Caravina.
Num outro desenvolvimento, o nosso entrevistado garantiu que os apelos estão a ser acatados positivamente por algumas pessoas que já voltaram às suas residências, embora de forma tímida. “Outros ainda não. Mesmo assim continuamos a lançar os apelos. A resposta concreta veio do lado dos funcionários públicos que começaram a chegar para o trabalho”.
Homens da Renamo atacam “mini-bus”
Mais de uma dezena de homens, com fardamento verde e idade avançada, supostamente da Renamo, atacaram e queimaram, na manhã de ontem, na Estrada Nacional Número Um (EN1), um “mini-bus” de marca Toyota Hiace que saía de Machanga com destino à Beira, transportando passageiros.
Segundo relata o nosso correspondente em Chimoio, Domingos Boaventura, que na altura dos acontecimentos se encontrava em Muxungué, e citando o director do Hospital Rural de Muxungué, João Vidamão, como resultado do ataque, dez pessoas ficaram feridas, tendo uma perdido a vida naquela unidade sanitária em consequência dos ferimentos contraídos. Os sete feridos graves foram transferidos para a Beira. As duas pessoas com ferimentos ligeiros tiveram alta hospitalar ainda ontem em Muxunguè.
Conforme relatos de passageiros, o ataque com armas de fogo se deu por volta das 7 horas da manhã, tendo os assaltantes conseguido furar os pneus do carro que imediatamente se imobilizou. Depois dispararam contra o condutor da viatura e para os restantes passageiros. Antes de queimar a viatura, os bandidos saquearam todos os bens que vinham no “mini-bus”.

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