imageO Presidente de Portugal reuniu-se a sós com a Renamo, na residência do embaixador português em Moçambique, e recebeu uma carta enviada pelo líder do partido Afonso Dhlakama. Não a leu, mas desconfia já saber o que lhe é pedido. Marcelo rebelo de Sousa diz que prefere concentrar-se no que une as duas forças políticas, fintando a questão sobre o pedido da Renamo de mediação internacional.
“Nestas questões o mais importante é começar o encontrar aquilo que une”, define Marcelo na declaração depois do encontro com a delegação de deputados do partido, encabeçados pela líder parlamentar Ivone Soares. E, depois de ouvir Renamo e Frelimo (ainda falta uma reunião com o MDM), Marcelo diz que há um objetivo comum que é “a paz é uma prioridade para o futuro e tem a ver com a situação económica, financeira e social”. A última coisa a unir a duas partes, segundo Marcelo, é que “há uma urgência em olhar para essas questões porque o tempo não pára, nem económica, nem financeiramente, nem politicamente”.
“Não somos um partido armado”
Para Ivone Soares, o encontro foi “muito agradável”: “Estávamos a falar praticamente com um filho e Moçambique também. Os portugueses vão ter de se habituar a partilhar connosco o presidente Marcelo Rebelo de Sousa”. Mas depois dos elogios, a líder parlamentar que de manhã tinha pedido mediação internacional, passou ao ataque à Frelimo, que também fez parte da reunião com o chefe de Estado português. “Fizemos questão de dizer que a situação do país é preocupante, já que estamos com problemas”, sobretudo “de cariz político e social, decorrentes da fraude eleitoral das ultimas eleições”.
A deputada da Renamo acusa ainda o Governo da Frelimo de “contrair empréstimos, dinheiro usado para comprar armamento para combater um partido” da oposição, recordando a ocultação de dívida de três empresas estatais, nas contas públicas. E garantiu que a Renamo não é “um partido armado. Nem temos armas. Temos a prerrogativa de garantir a nossa segurança”, insistindo na necessidade de “integração de forças de segurança”. “A nossa força residual está acantonada, aguardando ser reintegrada”.
Através desta carta, O presidente da RENAMO Afonso Dhlakama quer parabenizar o Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa pela sua recente eleição como Presidente da República Portuguesa, desejar-lhe as boas vindas à Moçambique, na sua primeira visita como estadista, e por último lhe colocar a par do essencial que constitui motivo de sua preocupação como cidadão e líder político, numa altura em que se encontra impossibilitado de estar na Cidade de Maputo para, devido a situação de Tensão Politico Militar em que o país. Acompanhe na íntegra a carta:

Excelentíssimo Senhor Presidente da República Portuguesa 
Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa 
Excelência, 
Queira antes de mais receber os meus melhores cumprimentos e felicitações pela sua recente eleição para o cargo de Presidente da República Portuguesa. Aproveito também a oportunidade para desejar-lhe as boas vindas ao nosso belo Moçambique, terra que lhe é muito próxima. Não seria demais mencionar o quão importante é a sua visita ao nosso país, num momento em que estamos confrontados com vicissitudes de variada natureza, que urge ultrapassar para recolocarmos o país de volta aos carrís do desenvolvimento. Moçambique é uma terra abençoada por Deus, com homens e mulheres extremamente trabalhadores, inúmeras terras f’érteis e recursos naturais abundantes, mas continua classificado como dos mais pobres do mundo, obviamente situação de que não temos nenhum orgulho. A minha expectativa, como cidadão moçambicano e como líder político, e acredito representar a opinião de milhões de outros cidadãos moçambicanos, é que a sua visita ao nosso país ajude a encontrar caminhos para a solução de alguns dos problemas que insistem em prevalecer. Senhor Presidente, Endereço-lhe estas linhas, uma vez impossibilitado de estar na Cidade de Maputo para, de viva voz e de corpo presente, com Vossa Excelência interagir. Sabendo que Vossa Excelência é conhecedor da história do nosso país, não lhe vou enfadar com os detalhes sobre as dificuldades que o nosso país enfrenta, mas gostaria de tomar algum do seu tempo para lhe colocar a par do essencial que constitui motivo de preocupação para mim como cidadão e líder político; alguém que lutou e continua a lutar pela democracia, pelo bem-estar, pelas liberdades individuais, pela justiça e pelo progresso do meu país. Se no longíquo ano de 1977 quando, juntamente com outros jovensmo- çambicanos, decidi iniciar a luta contra o comunismo em Moçambique, exigindo a democratização do país, o respeito pela dignidade humana e a consagração das liberdades individuais, tinha a certeza de que esse era o caminho que o país devia trilhar para se impôr na comunidade das nações. Hoje, diante dos inúmeros problemas que o nosso país enfrenta, estou mais convencido de que a nossa luta era justa e continua justa. Foram necessários dezasseis longos anos de guerra civil para o Governo da Frelimo aceitar que o povo mo- çambicano desejava ser livre e ter a liberdade de escolher os seus governantes. Mas este desiderato tem sido frustrado pelas sucessivas fraudes eleitorais que impedem que a vontade do povo, expressa nas urnas, seja efectivamente realizada. O povo ambiciona melhorar as suas condições de vida, mas os recursos naturais que serviriam de base para alavancar o desenvolvimento do país e por essa via melhorar as condições de vida dos moçambicanos, estão a ser pilhados para benefício de uma pequena elite filiada ao partido Frelimo; aqueles que têm opiniões contrárias às do governo da Frelimo são reprimidos, processados judicialmente e até assassinados. Este não é o Moçambique que os moçambicanos sonharam e sonham para si e seus filhos. O nosso sonho como moçambicanos é de um país onde todos, independentemente da sua filiação partidária, possam ter as mesmas oportunidades para exercitarem as suas capacidades humanas e técnico-profissionais e realizarem os seus sonhos. Apesar das insistentes tentativas da Frelimo de acabar com a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) através das artificiais reduções dos seus assentos na Assembléia da República, o nosso partido continua firme na sua luta pelo bem-estar do povo moçambicano, exigindo esclarecimentos sobre a utilização dos recursos públicos, bem como legislando a favor dos interesses dos mo- çambicanos. É a RENAMO que exige esclarecimentos sobre os gastos dos recursos públicos e a implementação de procedimentos transparentes na alocação dos recursos. E porque a RENAMO inviabiliza a prática de nepotismo e outras que consubstanciam a corrupcão, a Frelimo agora persegue a estratégia de eliminar-me fisicamente, pois sou tido como o elemento aglutinador e mobilizador pela causa da democracia. Ao perseguir este caminho, a Frelimo acredita facilmente eliminará a própria RENAMO. Excelência, Eu e a RENAMO, com o apoio incondicional do povo moçambicano, lutamos pelo progresso de Moçambique, protegendo os recursos naturais da pilhagem de um pequeno grupo da elite da Frelimo. A RENAMO protege os investimentos estrangeiros, incluindo os de empresas europeias, americanas e asiáticas e luta para que os recursos naturais sejam para benefício de todos os moçambicanos e que o acesso a esses não seja condicionado pela filiação partidária, como tem sido o apanágio do partido Frelimo. A Frelimo procura, a todo o custo responsabilizar a RENAMO pelo fracasso das suas opções políticas e de governação. A redução do investimento directo estrangeiro, a subida do endividamento público para fins não produtivos, a queda do nível de confiança do país são factores que levam o país ao actual estágio e não se pode, de maneira nenhuma, atribuir responsabilidade sobre estes factos à RENAMO. Pelo contrário, a RENAMO tem estado a proteger importantes infraestruturas económicas de interesse não só nacional mas também regional. São disso exemplo o pipeline que transporta combustível para o Zimbabwe; o Corredor da Beira, que liga o porto da Beira ao Zimbabwe; a via de Cassacatiza que liga Moçambique e Zâmbia, através da fronteira com a província de Tete; a via de Zobwe, que garante o transporte rodoviário entre o porto da Beira e Malawi; a linha férea de Nacala, a linha de transporte de energia de Cahora Bassa para a Àfrica do Sul, e todo o acesso dos paí- ses do Interland, nomeadamente Zimbabwe, Zâmbia, Botswana, Swazilândia, Malawi, aos portos de Moçambique. Os empreendimentos acima elencados são fontes privilegiadas de receitas para Moçambique e de importância estratégica para a região da Àfrica Austral, pelo que a RENAMO jamais colocaria em risco estes empreendimentos que contribuem para o alcance daquilo que a RENAMO defende – o bem-estar dos mo- çambicanos. O Governo da Frelimo, usando os meios de comunicação do sector público, tem estado a promover uma campanha de desinforma- ção atribuindo à RENAMO ataques a alvos civís. Mais uma vez, estas acusações são contrariadas pelo crescente apoio popular que a RENAMO tem conhecido nos últimos tempos e o encorajamento para continuar com a luta pela defesa dos interesses dos moçambicanos. O Governo da Frelimo tem estado a usar viaturas e autocarros civís para transportar militares e armamento nas suas perseguições aos elementos da RENAMO e, como seria de esperar, na confrotação esses meios são afectados. Temos consciência de que o nosso conflito é com o Governo da Frelimo e não com o povo moçambicano, porque os moçambicanos são a nossa fonte de inspiração e a nossa razão de luta pela implementação plena da democracia e promoção das liberdades individuais e direitos humanos no país. Estamos também cientes de que o nosso conflito não é com os investidores nacionais nem estrangeiros, pelo que em nenhum momento a RENAMO colocou e nem colocará como seus alvos os empreendimentos económicos dos moçambicanos nem de estrangeiros. Continuaremos a defender os cidadãos, bem como os empreendimentos e interesses económicos nacionais e estrangeiros, com particular destaque para os africanos, europeus, americanos e asiáticos, nossos principais parceiros. A implementação plena da democracia, a prática da transparência na gestão da coisa pública, a justiça, a liberdade, a realização de eleições livres justas e transparentes, são factores essenciais para a estabilidade do país, que por sua vez constitui condição primordial para o incremento do investimento estrangeiro no nosso país. Esta é a razão porque a RENAMO luta para que estes factores sejam efectivamente implementados no nosso país. Estamos comprometidos com a estabilidade de Moçambique, condição fundamental para o desenvolvimento económico e sócio-cultural do país. É nosso desejo e vontade que as questões que nos opõem ao Governo da Frelimo encontrem solução num diálogo franco e sério, em que o conhecimento, as experi- ências e contribuição dos nossos parceiros internacionais não sejam ignorados ou inferiorizados. Senhor Presidente, Espero ter, nestas poucas linhas, partilhado com Vossa Excelência a minha visão da actual situação do país e a minha predisposição para o alcance de uma solução negociada, pois acredito que o diálogo entre a RENAMO e o Governo da Frelimo é um imperativo nacional. Termino reiterando os meus melhores cumprimentos e votos de uma continuada cooperação entre Moçambique e Portugal. Respeitosamente, Maputo, 5 de Maio de 2016 Afonso M.M. Dhlakama Presidente.