quarta-feira, 13 de abril de 2016

Prestes a perder guerra do impeachment, Governo Dilma negocia votos um a um



PSD permanece na base do Governo, mas maioria dos 36 deputados decide votar pelo impedimento




Bancada do PSD decide destino no Governo.  Agência Brasil



"Agora já tem a caneta vermelha, para o PT", debochava o deputado Carlos Manato (SD-ES) pelos corredores da Câmara dos Deputados ao coletar palpites para o "bolão do impeachment" da presidenta Dilma Rousseff. A brincadeira, na definição de Manato, contava com 13 apostas de 100 reais no início desta tarde, todas com placares favoráveis ao impedimento. Essas avaliações não representam exatamente as tendências da votação — o governista PDT anunciou nesta quarta-feira que dará seus 20 votos para a presidenta —, mas é cada vez mais arriscado apostar a favor de Dilma na Câmara.
O Governo resiste em jogar a toalha. Questionada por jornalistas sobre o processo nesta quarta-feira, Dilma tentou manter as esperanças: "Digo qual é o meu primeiro ato pós-votação na Câmara [em caso de vitória]: a proposta de um pacto, de uma nova repactuação entre todas as forças políticas, sem vencidos e sem vencedores. Seja pós-Câmara, mas também pós-Senado, sobretudo. No pós-Senado, é que isso será mais efetivo". A presidenta admitiu, contudo: "se eu perder, sou carta fora do baralho". Ela convocou dez jornalistas para uma coletiva na manhã desta quarta, onde reafirmou que seu vice-presidente, Michel Temer, e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, trabalham em sociedade pelo golpe. “Chefe e vice-chefe do golpe”, afirmou ela, segundo o portal UOL que participou da entrevista.
De acordo com o relato dos jornalistas presentes, a presidenta transmitiu tranquilidade, e apesar das baixas no Governo, avaliou que é natural viver uma “guerra psicológica” na reta final deste processo.
A Câmara, onde o processo dá o primeiro passo, encaminha-se para o domingo inclinada a votar pelo impedimento da presidenta. Depois de PMDB e PP abandonarem a base aliada no Congresso Nacional e de partidos como PSB e PRB fecharem posição para votar em bloco contra Dilma, o PSD, uma das últimas esperanças do Palácio do Planalto, anuncia que vai liberar sua bancada — majoritariamente a favor do impeachment — para votar como bem entender. Nas contas mais conservadoras, 26 dos 36 deputados do PSD votarão pelo envio do processo ao Senado.
Agora, sem conseguir atuar no atacado, o Governo Dilma Rousseff está tentando obter no varejo os votos que lhe faltam para evitar o andamento do processo de impeachment na Câmara dos Deputados. Depois dos últimos anúncios de rompimentos ou de declarações de votos a favor da destituição presidencial, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros Jaques Wagner (Gabinete Pessoal) e Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) começaram a ter conversas individuais com os parlamentares. Antes, os diálogos ocorriam principalmente com os líderes das bancadas e com presidentes dos diretórios nacionais.
Assessores e ministros de Dilma usaram o caso dos parlamentares do PP – que contrariaram o seu presidente e o líder da bancada para anunciar voto pelo impeachment – como o principal exemplo do insucesso na condução das negociações.Três deputados do PP que conversavam nos corredores da Câmara nesta quarta-feira debatiam onde foi a falha governista. "O Governo disse que colocaria o Ricardo Barros no Ministério da Saúde sem consultar ninguém. Fez um acordo com o líder e nem consultou a maioria. Foi a gota d'água para a rebelião e mostrou que, se permanecer, a Dilma continuará a mesma. Sem fazer política, sem dialogar, sem ouvir a base", ponderou um deles.
Com o desembarque do progressista, o efeito dominó já era esperado pelo Planalto: a declaração do PSD ou o completo rompimento do PRB. O novo temor é que o PMDB não entregue para Dilma os votos que diz ter (entre 20 e 30 de uma bancada de 67), haja defecções em grupos que declararam apoio aberto (como o PDT que tem 20 deputados) ou alguns nomes específicos de partidos nanicos, como do PTN e do PROS, mudem o voto conforme o andamento das manifestações no fim de semana. “As pressões que esses deputados sofrem vêm de todos os lados. Nas conversas, tentamos evitar que isso interfira muito na decisão final deles”, disse um auxiliar do Governo.
Nesta quinta-feira, será a vez do PMDB anunciar o seu posicionamento. A tendência é que o líder Leonardo Picciani (PMDB-RJ) libere o voto de sua bancada. A decisão, tomada após uma conversa com o vice-presidente, Michel Temer, ainda precisa ser referendada pelos 66 deputados peemedebistas. "O que ficar decidido eu falarei no microfone, por mais que não concorde com o impeachment e tenha sido contra o rompimento com o Governo", afirmou Picciani.
Para amenizar perdas, a gestão Rousseff autorizou que três deputados licenciados do PMDB que hoje são ministros retornem para seus cargos apenas para votarem contra o impedimento da mandatária. Celso Pansera, da Ciência e Tecnologia, Mauro Lopes, da Aviação Civil, e Marcelo Castro, da Saúde, devem retornar aos seus gabinetes no Legislativo entre quinta e sexta-feira.
O clima de que uma derrota se aproxima para a petista é tamanho que as estimativas de deputados favoráveis ao impedimento registram adesões dia a dia e se aproximam do mínimo necessários de 342 votos. Por outro lado, a lista de contrários permanece orbitando em torno de 120 votos. Para interromper o processo na Câmara, o Governo precisa de 172 deputados votando ao seu favor, se abstendo ou se ausentando. A guerra dos placares já chegou até aos votos para a sequência do processo no Senado. De acordo com contagem do jornal O Estado de S.Paulo, 42 dos 81 senadores já se posicionaram a favor do impedimento de Dilma. Apenas 17 disseram ser contra o processo.

Secretário-geral da OEA: “Preocupa o processo contra Dilma, que não é acusada de nada”

Luis Almagro afirma que Dilma não responde por nenhum ato ilegal que justifique o impeachment

O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, em Tegucigalpa em agosto de 2015. reuters
Luis Almagro (Uruguai, 1963) está prestes a completar um ano como secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA). Nesse período, seu objetivo foi levantar uma instituição que havia perdido peso no continente. O ponto fundamental para Almagro, ex-ministro das Relações Exteriores do Uruguai, passa por um aprofundamento democrático. Somente assim, afirma, os males da região como a violência, a desigualdade e a corrupção poderão ser combatidos.
Pergunta. Como o senhor vê a incerteza política no Brasil?
Resposta. O Brasil tem instituições muito fortes que têm a capacidade para responder. Para nós o feito fundamental é que está sendo realizado um processo de impeachment de uma presidenta [Dilma Rousseff] que não é acusada de nada, não responde por nenhum ato ilegal. É algo que verdadeiramente nos preocupa, sobretudo porque vemos que entre os que podem acionar o processo de impeachment existem congressistas acusados e culpados. É o mundo ao contrário.
P. O senhor chegou com o objetivo de revitalizar a OEA. O que está fazendo para consegui-lo?
R. Existem algumas variáveis objetivas que indicam que há uma mudança e que a organização está mais envolvida nos assuntos regionais. Durante minha campanha para ser secretário-geral ouvia-se que era uma organização irrelevante. Sempre considerei isso injusto. E se olharmos com perspectiva, as queixas vêm agora pelo excesso de zelo profissional e de ação da OEA.
P. Como o senhor tentou reverter a situação?
R. A organização foi onde os problemas estão. Tiramos do papel os consensos aprovados por todos e passamos à ação. No momento de defender a democracia, assumimos responsabilidades, assim como na luta contra a corrupção e na defesa dos direitos humanos.
P. Qual é o principal desafio agora: corrupção, direitos humanos, desigualdade…?
R. Não podemos compartimenta-los. Fizemos estudos, nos quais levamos em consideração por volta de 10.000 variáveis, sobre os conceitos fundamentais de democracia. Sem democracia é impossível combater a corrupção, impossível conseguir condições de desenvolvimento, gerar direitos e eliminar as discriminações que ainda existem no continente.
P. O senhor criticou a atuação do Governo da Venezuela contra a Lei de Anistia aprovada no Parlamento, mas declarada anticonstitucional. O que espera que aconteça na Venezuela?
R. Nós gostaríamos que não existissem presos políticos na Venezuela, que os três poderes do Estado agissem para acabar com essa situação. Esperamos que ocorra um diálogo institucional mais fluido para a conquista de resultados concretos, especialmente pela difícil situação de desabastecimento sofrida pelo país. Todos nós devemos almejar isso. Os primeiros, os venezuelanos.
P. O que a OEA pode fazer?
R. Dar uma opinião muito clara sobre o funcionamento do sistema e procurar um diálogo entre as partes. Não mantemos uma neutralidade sobre a situação. A neutralidade moral não é possível quando existem presos políticos e a democracia não está funcionando.
P. O Governo de Maduro não parece disposto a ceder…
R. A história de nosso continente está infestada de casos piores. No Cone Sul foram superadas ditaduras ignominiosas e violações de direitos humanos e isso mudou. Mas muda com a voz e a atitude responsável da comunidade internacional.
P. E o povo venezuelano?
R. O povo venezuelano deve ser o primeiro a ser respeitado. Deve encontrar os caminhos adequados para se expressar e sua expressão deve ser respeitada. Os direitos essenciais, de saúde, alimentação, de ordem pública... precisam ser respeitados.
P. A publicação dos papéis do Panamá dinamita a confiança da população nas elites políticas e econômicas?
R. É possível ser rico e fazer política e ser pobre e fazer política. Os dois devem ter a mesma possibilidade. O importante é que, na política, o dinheiro não grude nas mãos. O problema é que muitos de nossos políticos têm cola e o dinheiro gruda em suas mãos. São fundos de evasão fiscal, de lavagem de dinheiro, e isso é dinheiro que pertence à população. É dinheiro retirado de planos de emergência, de planos sociais, de educação... Não deve existir margem de tolerância. É preciso ser muito duro, muito drástico com essas questões.
P. Mas os paraísos fiscais continuam existindo.
R. Os paraísos fiscais não devem mais existir. Os países precisam de desenvolvimento caminhando pela avenida principal, cumprindo com as regras do jogo, de transparência e de legalidade do sistema financeiro. O que acontece no cruel mundo de hoje é que os países competem por esses fundos. Os Estados Unidos têm Delaware. Do que estamos falando? Competem pelos fundos do narcotráfico. Estamos falando de 400 bilhões de dólares (1,4 trilhão de reais)... É um problema que temos e precisa ser resolvido.
P. Que análise o senhor faz do primeiro turno das eleições no Peru?
R. Eu espero que ocorra o fortalecimento institucional para que o Peru continue o desenvolvimento econômico e social.
P. O senhor acredita que o assassinato da ativista hondurenha Berta Cáceres será algum dia esclarecido?
R. Espero que seja logo esclarecido por Honduras, por sua população, por Berta. Que todos os elementos que obscurecem esse crime sejam esclarecidos. A impunidade no assassinato de indígenas no continente é um sinal de corrupção política muito forte.

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