segunda-feira, 7 de março de 2016

O NOSSO POVO ESTÁ DESANIMADO E CONTINUA A SOFRER

SENHOR PRESIDENTE, 

Centelha por Viriato Caetano Dias (viriatocaetanodias@gmail.com ) 
“O vaidoso não ouve ninguém. Vive no seu mundo, isolado. Um vaidoso não é capaz de compreender e sentir o sofrimento alheio.” Extraído de uma conversa com clérigos da Igreja São Francisco em Évora. 
Não consegui ver na íntegra a reportagem da STV (Jornal da Noite do dia 28/02/2016) sobre o drama dos refugiados moçambicanos no vizinho Malawi. Desatei-me em lágrimas. Nem os animais selvagens, tidos como irracionais, vivem em condições tão desumanas quanto os nossos compatriotas racionais na terra do mítico presidente Hastings Kamuzu Banda. 
Conheço Malawi e a sua gente. Em Novembro último, desejoso de conhecer Kamuzu Stadium e alguns jogadores da selecção malawiana, revisitei aquele país. É impressionante que Malawi hoje, depois da morte de Banda em Novembro de 1997, o país continua estagnado e fechado como “bichinho-de-conta”. 
Falta estratégia para catapultar o desenvolvimento económico e social do país, mas o que lhe sombra em fartura (o capital humanos profissionalizante e a relíquia do lago Malawi) é mal gerido devido a intrigas intestinais pelo poder, facto que caracteriza a governação naquele país. Até o nascer do sol, significado da palavra Malawi em língua cinyanja, também falta!

O país vive à margem do progresso, mas em “paz” (refiro-me aqui a ausência da guerra). Esta é a principal razão para que muitos moçambicanos, vítimas do actual conflito político-militar, entre servir de carne para calhão e engolir as pílulas amarguras da vida, tenham preferido refugiar-se no Malawi. Mais vale suportar em conjunto as fomes do que testar a eficácia e a eficiência das armas utilizadas pelas duas partes em liça: forças de defesa e segurança e o braço armado da Renamo. 
À luz do Direito Internacional Público o governo moçambicano só tem a agradecer este gesto de grandíssima envergadura da sua congénere malawiana por acolher e amparar compatriotas nossos. A Renamo, como partido político, também tem a obrigação moral e cívica de agradecer ao governo malawiano pela sua filantropia. Faço esta acusação de dedo em riste: a Renamo é a principal culpada pela fuga e condições desumanas de milhares de moçambicanos que se encontram refugiadas em Kapise. Viver num centro de refugiado é igual a estar preso numa cadeia: “a pessoa não vive, existe”. 
A culpa é outrossim nossa como sociedade civil activa (instruída?). Não somos capazes de sair à rua e dizer aos políticos da Frelimo e da Renamo esta mensagem redentora que cito de memória “… todos, filhos do mesmo pai, somos irmãos. Os homens que são irmãos, não podem ser senhores nem escravos. E o principal dever da humanidade é amar ao próximo como a si mesmo. É a lei que pode redimir a humanidade dos males que ainda hoje a torturam.” A frase entre coma pertence ao Professor José Hermano Saraiva. 
Ao contrário disso, saímos à rua e acotovelamos em apoteose para festejar vitória ou título de uma determinada equipa de futebol europeu. Paradoxalmente, refugiámo-nos em búnqueres da ignorância contra uma realidade nua e crua dos irmãos moçambicanos em Kapise. Somos enérgicos em partilhar nas redes sociais cenas desviantes de conduta moral, mas não consegui-mos partilhar a dor e mobilizar apoios a favor dos nossos irmãos em Kapise. Enchemos os espectáculos musicais onde desfilam a tríplice: escória, infâmia e blasfémia, mas não somos capazes de unir esforços em solidariedade dos nossos compatriotas em Kapise. Insuflamo-nos de vaidade, mas somos pobres de mentalidade. Vestimos crucifixos religiosos em corações que palpitam maldade. O que somos, afinal? UMA SOCIEDADE NEFEBILATA E COBARDE. As minhas reflexões, nesta Gazeta de Wamphula Fax, visam acicatar o diálogo e denunciar os actos de barbárie contra o povo moçambicano. Penso que, a avaliar pela receptividade de comentários vindos de diferentes segmentos da sociedade, tenho conseguido equilibrar a balança e fazer a diferença. 
Não valerá a pena deter-me muito a comentar as declarações bombásticas do senhor governador de Tete sobre a situação dos moçambicanos em Kapise. Se até hoje esse senhor não pediu desculpas ao povo moçambicano, que ele próprio representa a nível provincial, então estamos conversados. Como toda a gente sabe, sou natural de Tete, lamento que o presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, ainda não tenha exonerado esse senhor do cargo de governador de Tete. Não sei que destino se reserva à minha província que tem um presidente de município condenado e um governador que insulta o seu próprio povo. Com gente assim, penso que Tete não precisa de inimigos. Winston Churchill, estadista britânico, dizia que “Não basta dizer que estamos a fazer o possível. É preciso fazer o necessário.” E o que está a fazer o governo para remediar a situação? 
Alguns críticos das minhas reflexões acusam-me de sempre concordar com o amigo Nkulu. Pois, hoje, quero apresentar-lhes uma prova contrária de que nem sempre estou em concordância com ele. Transcrevo a seguir um texto que o amigo Nkulo escreveu para mim: 
“Há migrantes que ficam refugiados, porque fogem devido à uma situação anómala, que pode ser instabilidade política, ambiental (climática) e outros primos dos factores da insegurança social. Quando o fundamental é estar perante algo, o nome não é importante. Há interesses das Nações Unidas porque dizer que há refugiados garante o tacho dos funcionários que já estavam de malas aviadas por falta de actividade. Quem come tacho das NU, não saboreia sozinho, presta veneração aos seus superiores: comem juntos. Havendo fome no Malawi, em caso de donativos, uma grande parte irá para o seu povo, para silenciar os murmúrios e, consequentemente, reconquistar, mesmo que seja minúscula, a popularidade do Peter Mutharica que já míngua. Os donativos em comida, dinheiro e roupa não abrangerão apenas os ditos refugiados moçambicanos. Serão usados e gastos como comida do falecimento: todos têm direito, bastando estar no local da desgraça. Na exorcização dos maus espíritos causadores da nossa instabilidade, Malawi não ficará absolvido. É participante do jogo, desde os tempos de então até hoje. ZICO-MO (Obrigado e um abraço nhúngue).
WAMPHULA FAX – 07.03.2016

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