quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Que se lixem os contribuintes

OPINIÃO


Durante o ano de 2012, após o quase-colapso da zona euro, tornou-se dominante a opinião de que havia que quebrar o “vínculo de morte” entre os estados e a banca. Não era aceitável que os contribuintes andassem, desde 2008, a salvar bancos falidos. A solução estaria em regras comuns para a supervisão do sistema financeiro na zona euro e para a resolução dos bancos insolventes — uma união bancária europeia.
O tema entrou em discussão nas instituições europeias mais ou menos na mesma altura em que, em Portugal, se dava mais outro exemplo do mesmo ciclo vicioso, com a nacionalização de mais de metade do Banco Internacional do Funchal - BANIF. A partir de 2013, portanto, este banco passou a ter por principal acionista o estado e por responsável último o governo português.
Entretanto prosseguia a discussão da União Bancária. O primeiro semestre de 2013 foi passado em consultas, e em julho de 2013 foi apresentada pela Comissão Europeia uma proposta de lei europeia (um regulamento, no caso) para a resolução bancária na União. Essa legislação foi discutida em 2014 no Parlamento e no Conselho Europeu e aprovada em agosto desse ano com uma data de plena entrada em vigor para 1 de janeiro de 2016 — daqui a uma semana. O governo sabia.
Em todo esse tempo os pilares futuros da resolução de bancos na UE foram sempre bem conhecidos: quem pagaria a conta seriam os acionistas e grandes depositantes, sendo os estados e o sistema financeiro a garantir os pequenos depositantes. Durante todo esse tempo, o governo em Portugal foi o mesmo.
Durante três anos, portanto, o governo português foi negociador da legislação da união a nível europeu e banqueiro principal do BANIF a nível nacional. E os responsáveis têm nome: Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque sabiam que a 1 de janeiro de 2016 as regras europeias mudariam e que, no caso do BANIF, teriam um impacto enorme sobre aforradores de uma vida nos Açores e na Madeira e nas comunidades emigrantes oriundas destes arquipélagos, onde o BANIF detêm uma considerável quota de mercado. Durante todos estes anos, Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque foram maus governantes para Portugal e maus banqueiros para o BANIF.
Sendo assim, o estado português chega ao fim de 2015 correndo contra o calendário e duas soluções possíveis: ou a liquidação, com perdas certas até 3000 milhões de euros, ou a resolução, opção que foi seguida, com perdas possíveis até 3000 milhões de euros. Pelo caminho perdeu-se a possibilidade de tirar partido da nacionalização do BANIF e potenciar o seu valor social para as comunidades que ele servia, provavelmente após uma ligação à Caixa Geral de Depósitos.
Esta não é só uma história de uma assustadora irresponsabilidade perante factos que só poderiam ser conhecidos do governo de Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque. É mais assustadora ainda quando pensamos na possibilidade, que foi real, de agora termos um governo de bloco central a mascarar a omissão culposa de Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque. Pode ter havido um móbil para este arrastar da situação: a “saída limpa”, as eleições. Mas não pode haver desculpa para Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque.

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