segunda-feira, 18 de maio de 2015

Os rubis do General Raimundo Pachinuapa

De Cabo Delgado, o país está à espera do gás e, eventualmente, petróleo da Bacia do Rovuma. Contam-se os anos, antecipam-se cenários, projectam-se investimentos, flutuam as cotações das acções dos investidores no negócio, a Autoridade Tributá- ria vigia com engodo as tributações actuais e futuras, e a sociedade civil clama por transparência, prestação de contas e melhor regime fiscal. De Cabo Delgado, em Montepuez, para o mundo dos leilões e das bolsas de valores, há um mineral cujo brilho factura milhões de dólares: são os rubis do General Raimundo Pachinuapa. Enquanto o mundo mediático se delicia do tiki-taka do Barça de Messi, semana sim, semana sim, Moçambique e o mundo dos petróleos vivem a tensão do tic-toc, tic-toc à espera de 2019 e do “Messias” LNG/GNL, nome de código de gás natural liquefeito. É a promessa de prosperidade e riqueza, profetizada pelas descobertas breakthrough (traduza-se revolucionárias), anunciadas ao ritmo do vento no consulado de Guebuza. Enquanto assistimos à Liga dos Campeões da Europa do futebol milionário, sonhamos com um país na Primeira Liga mundial dos cifrões e campeões de vendas de gás natural. A tentar refazer-se da ressaca do (fracassado?) eldorado Tete do carvão mineral, o país vive sob a névoa da instabilidade política que tudo condiciona: as exigências-ameaças de Afonso Dhlakama, os avanços e recuos próprios de um debutante Presidente Filipe Nyusi, o tragicómico teatro político das Mil e Uma Noites do Centro de Conferências Joaquim Chissano, o crescente debate sobre a descentralização colocam o destino de um Povo e de uma Nação sob custódia de um ponto de interrogação, entre parêntesis. Leilões no Oriente e Bolsa de Valores de Londres Não admira que a notícia de um negócio de sucesso, de milhões de dó- lares, passe despercebida. Valha-nos Rosário Fernandes e sua Mannschaft de arrecadação de impostos, que a tudo e todos persegue implacavelmente. Atente-se aos suplementos de anúncios públicos que a Autoridade Tributária publica nas últimas semanas, no jornal Notícias. A notícia em questão: o general Raimundo Pachinuapa e seus sócios na Montepuez Rubi Mining (MRM) estão a amassar milhões de dólares, com a venda de umas pequenas mas preciosas gemas no mercado internacional: rubis. Coloquemos em perspectiva: em 2011, o general Pachinuapa e seu só- cio na Mwiriti Limitada venderam à britânica Gemfields, por “apenas” 2,5 milhões de dólares, 75 % da sua participação numa concessão de prospec- ção e exploração de rubis em Montepuez, constituindo a hoje lucrativa Montepuez Rubi Mining. Com a exploração de rubis e venda em leilão no mercado internacional, em apenas três operações no ano pasDe Montepuez para as bolsas e leilões internacionais, amassa milhões de dólares em surdina Os rubi$ do General Pachinuapa Por Milton Machel sado amassaram 90 milhões de dólares brutos, antes de impostos, taxas, comissões de intermediações, entre outros custos sobre o rendimento deste tipo de negócio. “Fizemos as duas primeiras vendas no ano passado na Tailândia. No primeiro leilão rendemos 30 milhões e no segundo 45 milhões de dólares. A terceira venda aconteceu recentemente, cuja qualidade consideramos baixa, comparativamente às duas primeiras, e ganhámos cerca de 15 milhões de dólares”, estas palavras que salivariam qualquer leitor de notícias de negócios são de Raime Raimundo Pachinuapa, filho do general Pachinuapa e gestor na sociedade. Disse-as para um correspondente do jornal Notícias em Cabo Delgado. Em Junho, no próximo leilão, a Montepuez Rubi Mining espera arrecadar 50 milhões de dólares. Ao diário da Rua Joe Slovo (ex-Joaquim Lapa), Pachinuapa-filho mostrou confian- ça no alcance desse cifrão tendo em conta “a potencialidade da área em que operamos, na qual foi feito um estudo por uma empresa cotada e esperamos que os resultados sejam divulgados publicamente nos pró- ximos dias pela bolsa de valores de Londres.” Assimetria de informação: oceanos de distância Se, em Moçambique, o negócio dos rubis passa despercebido à generalidade do público, é em Londres que a pulsação dos corações dos investidores de bolsa adquire ritmo impróprio para cardíacos. Parecem apostadores em Las Vegas e Hong Kong! No último dia 5, em artigo para uma das agências de informação do mercado de capitais, a Broker Spotlight, o redactor Andrew Neil perspectivava um dia da bolsa de valores de Londres: “a Gemfields tem um negócio único, que oferece exposição a pedras coloridas de alto valor (…) e uma marca de artigos de luxo em recuperação. Tem um potencial considerável, com a declaração inicial dos recursos de Montepuez por ser feita antes do fim do ano e, claro, com a perspectiva de mais leilões de alto valor. A empresa teve um forte desempenho ao longo do ano passado, impulsionado principalmente pelo crescente reconhecimento do valor potencial da mina de Montepuez Rubi.” Publicação da correctora de bolsa Proactive Investors, a Broker Spotlight considera-se uma influente fonte das análises mais inusitadas, que iluminam pensamentos e opiniões por detrás das grandes estórias que gravitam em torno da bolsa na City londrina. Falando à reportagem do Notícias nesta segunda-feira, o Administrador do distrito de Montepuez, Arcanjo Cassia, traduz o oceano de distância informativa entre o mercado internacional e o país, sobre os rubis de Montepuez. Parte da delegação da MRM no leilão de Jaipur na Índia, Arcanjo disse ao Notícias ter sentido que naquele país asiático o posto administrativo de Namanhumbir ficou valorizado, enfatizando: “foi muito bom saber que afinal temos muita riqueza!” Um dos media de autoridade mundial em finanças e negócios, a Bloomberg publicou em Abril uma matéria intitulada “O valor de rubis”, na qual era citado o CEO da Gemfields, Ian Harebottle, a afirmar categoricamente que “com rubis há um potencial elevação bastante saudável” e que “nos próximos dois anos poderemos duplicar os preços.” A Gemfields já detém 20 por cento do mercado das esmeraldas, tornando-se no maior produtor destas pedras preciosas. A firma pretende replicar essa margem nos rubis. “Esperamos que a Gemfields repita com rubis o sucesso que alcançou ao impor ordem nos preços das esmeraldas”, perspectivou a Investec Plc, firma analista da Bolsa de Valores de Londres. “A mina de rubis de Montepuez irá posicionar- -se entre as maiores descobertas em África por décadas”, completou. Segundo o CEO da Gemfields, estima-se que a reserva de rubis de Montepuez contenha mais de 40 por cento do fornecimento mundial conhecido destas pedras preciosas. O executivo espera que a MRM triplique a sua produção, dos 8 milhões de quilates estabelecidos como meta para este ano. Enquanto a ignorância geral governa a Nação, pelo mundo os especialistas só falam dos rubis de Montepuez. No ano passado, uma equipa de pesquisa do Instituto de Gemologia Americano (GIA) dedicou uma visita aos campos de rubi de Montepuez. Uma descoberta de rubis para o Séc. XXI Na sua primeira edição de Primavera de 2015, a revista trimestral Gems & Gemology traz um relatório desse estudo de campo realizado pelos especialistas Merilee Chapin, Vincent Pardieu e Andrew Lucas. Em editorial, a revista considera o depósito de rubis de Montepuez como “actualmente a mais importante fonte comercial de rubis do mundo.” Em artigo intitulado, “Moçambique: Uma Descoberta de Rubis para o Século 21”, os três especialistas apontam: “o primeiro leilão de rubis de Moçambique da Gemfields, realizado em Singapura em Junho de 2014, foi um marco para o comércio global. O rendimento de 33,5 milhões de dólares pelo leilão colocou os holofotes no depósito de rubis da MRM, tanto que todo o inventário foi o resultado directo da amostragem de massa em Montepuez. Esta amostragem de massa orientará os futuros desenvolvimento de opera- ções da mina de grande escala.” Os pesquisadores reportam que, como parte de sua operação de amostragem de massa, a MRM tem tratado cerca de 1,8 milhões de toneladas de rocha em Montepuez, recuperando aproximadamente 8 milhões de quilates de rubi e safira de várias cores. A empresa espera dobrar sua capacidade de 3,6 milhões de toneladas de rocha em 2015 e, eventualmente, aumentar esse número para 10 milhões de toneladas de rocha por ano. Enquanto o General Pachinuapa e seus sócios facturam no mercado internacional e o país mediático passa ao lado do negócio, crónicas colaterais de vez em quando reportam um ambiente de faroeste entre garimpeiros ilegais e a polícia nas comunidades de Mucolotho, Muapeya, Nakala e Namujo, no posto administrativo de Namanhumbir. Para o bem da prosperidade geral, a Autoridade Tributária tem facturado do negócio. Em 2014, embolsou da Montepuez Ruby Mining pelo menos 320 milhões de meticais de impostos das vendas desta pedra preciosa em leilões internacionais. A cor dos rubis de Montepuez Os rubis de Montepuez são considerados pelos pesquisadores do GIA como muito importantes para o comércio por causa das grandes quantidades e a ampla gama de qualidades e tamanhos produzidos. Suas cores colmatam o fosso entre os das fontes clássicas da Birmânia (altamente fluorescente, com baixo teor de ferro) e Tailândia/Cambodja (ligeiramente fluorescente, com alto teor de ferro). Os Rubis devem a sua cor vermelha ao cromo, mas a sua cor é modificada pela presença de ferro, o que reduz a fluorescência provocada pelo crómio. Um interessante aspecto de rubis do depósito de Montepuez é o seu teor de ferro, que varia de quase tão baixo quanto os rubis birmaneses do tipo de mármore para tão alta como rubis encontrados em depósitos relacionados com basalto ao longo da fronteira tailandesa-cambodjana. Isto significa que têm o potencial para atender uma gama de diferentes mercados, sublinham os especialistas do GIA. O Instituto Gemológico da América (GIA) é uma organização independente não-lucrativa, estabelecida em 1931 e reconhecida como a maior autoridade mundial em Gemologia. O GIA é creditado como inventor, nos primórdios dos anos 1950, dos famosos 4Cs (em inglês) que correspondem a cor, corte, clareza e (peso de) quilate (Carat, em inglês). Em 1953 o GIA criou o Sistema Internacional de Classificação de Diamantes™, hoje reconhecido virtualmente por todos os profissionais de joalharia no mundo. O Jackpot do General Pachinuapa O negócio dos rubis de Montepuez configura o velho modelo de doing business in Mozambique: um membro influente da nomenklatura associa-se a um pequeno investidor estrangeiro com algum conhecimento técnico do negócio ou de gestão e obtém licenças de prospecção; subsequentemente entra uma grande empresa internacional do sector, com capital e know-how para investir e alavancar o negócio. Assim se unem os velhos factores de produção económica: terra, capital e trabalho. Recusando fazer parte dos condenados da terra, o General Raimundo Domingos Pachinuapa, natural de Cabo Delgado, fundou em 2005, a Mwiriti, Limitada, com Asghar Fakhraleali. Foi à Mwiriti, Limitada a quem se atribuíram quatro licenças de prospecção numa vastidão de terra em Namanhumbir, Montepuez, aproximadamente 33.600 hectares. O depósito de Montepuez Rubi foi descoberto em Maio de 2009. Logo em seguida, milhares de garimpeiros, apoiados por comerciantes estrangeiros, começaram a trabalhar ilegalmente da área. Isto prevaleceu até Junho de 2011, com a formação da Montepuez Rubi Mining (MRM). Em Junho de 2011, a britânica Gemfields adquiriu à Mwiriti, por 2,5 milhões de dólares, 75% da concessão do depósito de rubis em Montepuez. Formou-se, assim, a MRM numa operação que as crónicas da especialidade consideraram como “uma procura pelos então detentores do projecto de um parceiro profissional, experiente e transparente para os assistir a desenvolver um projecto de rubi potencialmente de classe mundial.” A MRM obteve uma concessão de 25 anos em Março de 2012 e empreendeu um esforço considerável e capital para melhorar a infra-estrutura da mina, maquinaria, recursos humanos, segurança e relações públicas. A Gemfields está listada na bolsa de valores de Londres, com créditos firmados no negócio de esmeraldas. Do jackpot ao take-off do General Pachinuapa, passaram-se apenas três anos. 

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