terça-feira, 5 de maio de 2015

Indústria e Industrialização em Moçambique: Por Carlos Nuno Castel-Branco

Indústria e Industrialização em Moçambique:
Análise da Situação Actual e Linhas Estratégicas de Desenvolvimento

Industry and Industrialization in Mozambique:
Analysis of the Current Situation and Future Strategic Development Directions

Carlos Nuno Castel-Branco1
cn.castelbranco@tvcabo.co.mz

Agosto de 2003

Posted with permission of the author




Abstract

This paper, in Portuguese, analyses the trends and dynamics of industrialization in Mozambique over the last four decades. It aims at identifying the major characteristics of industrial development that has been taking place in Mozambique, whether they have changed significantly over the years, what are the major sources of industrial dynamics, and what are the implications for policy.

The paper relates the process of industrialization in Mozambique and the integration of the Mozambican economy within the regional economic system of Southern Africa, which is particularly influenced by the dynamics of the minerals-energy complex of South Africa and oligopolistic competition.

Drawing from the analysis of the process of industrialization, the paper also develops some policy challenges for future transformation of the process of industrial growth into a process of industrialization and socio-economic development in Mozambique.

This paper is an extension and development of a background paper on industrial development originally written for the "Agenda 2025, a long-term vision for the development of Mozambique".


Notas Introdutórias e Quadro Analítico

Industrialização e desenvolvimento são relacionados, na literatura económica, por intermédio de três ligações fundamentais: a indústria como engenho do desenvolvimento estrutural da economia; as vantagens criadas pelas capacidades industriais para os processos de internacionalização; e o papel da indústria na libertação e absorção de recursos excedentários de outros sectores, em especial dos sectores de inferior produtividade.2

Industrialização é entendida como um processo de transformação da base estrutural e das dinâmicas sócio económicas de acumulação, através do qual as conquistas da ciência e tecnologia são aplicadas a todas as esferas de organização das cadeias de produção e valor; a qualidade dos factores se desenvolve substancialmente; estes factores são transferidos para os sectores e processos de maior produtividade e sinergias; e a sociedade evolui do auto emprego para processos dominantemente sociais, colectivos e cooperativos de trabalho.

Industrialização funciona como engenho de desenvolvimento na medida em que: (i) gera tecnologia, conhecimento tecnológico e métodos mais avançados de organização e gestão, os quais tornam irreversíveis os avanços na produtividade e possível a concretização dos avanços na inovação e pesquisa científica; (ii) o seu impacto no crescimento e desenvolvimento económicos é substancialmente maior do que o seu contributo percentual para o PIB e para o emprego directo, por via da transmissão, para a economia e para a sociedade como um todo, dos ganhos de produtividade e dos avanços tecnológicos registados na indústria, e pelo emprego indirecto criado por via das ligações de crescimento potenciadas; (iii) articula a economia através das redes de fornecedores e consumidores, redes de cooperação inter empresarial e inter industrial, e ligações dinâmicas de crescimento desenvolvidas em torno de cadeias sócio económicas de produção e valor, através das quais as dinâmicas de produtividade, qualidade, organização e inovação são transmitidas para a economia como um todo; e (iv) por efeito combinado dos factores anteriores, potencia a criação de novas dinâmicas, capacidades e padrões de desenvolvimento, novos sectores, produtos e processos, e novos standards e pontos de referência em torno e ao longo dos quais a economia se pode desenvolver, independentemente dos limites impostos pelas suas vantagens comparativas estáticas iniciais.3

Em relação com os pontos anteriores, a industrialização potencia a capacidade da economia tirar proveito de, e influenciar, dinâmicas regionais e internacionais de desenvolvimento. A economia pode, assim, evoluir de um estado de constante pressão para se ajustar a choques internacionais e estabilizar, para um em que se torna parte activa de dinâmicas positivas de crescimento, inovação e desenvolvimento.4

Finalmente, um outro papel fundamental do processo de industrialização é absorver os factores e recursos libertados pela dinâmica de desenvolvimento. Num sentido, mais restrito, isto significa absorver produtivamente na indústria e serviços relacionados os factores (em especial a força de trabalho) que são libertados pela reestruturação e aumento da produtividade na agricultura e outros sectores. Num outro sentido, mais amplo, isto também significa que excedentes, novos factores e novas capacidades são crescentemente integrados nas dinâmicas fundamentais à volta das quais os ritmos e a qualidade do crescimento e desenvolvimento aceleram e progridem, pelo que os benefícios do crescimento e desenvolvimento podem ser amplamente partilhados.5

Estas considerações teóricas têm em vista fornecer um quadro analítico em torno do qual a discussão sobre industrialização em Moçambique possa ser feita. Neste contexto, essas considerações teóricas permitem avaliar, pelo menos qualitativamente, até que ponto existe um processo de industrialização dinâmico, sustentável e progressivo em Moçambique; isto é, até que ponto a indústria, em Moçambique, funciona como engenho de desenvolvimento da economia e da sociedade como um todo. Uma outra questão é que tipo(s) de processo(s) industrial(ais) ocorrem em Moçambique e que impacto dinâmico e estrutural podem ter para a economia como um todo.

O padrão de industrialização em Moçambique terá um carácter dinâmico, sustentável e progressivo na medida em que transforma e fortalece ligações económicas e sociais, acelera o crescimento, desenvolve a capacidade de a economia nacional participar positivamente na economia mundial, e fortalece as capacidades económicas identificadas por via de alguns indicadores macroeconómicos chave.

Há restrições óbvias de tempo, espaço e recursos (em especial informação com suficiente detalhe, consistência e abrangência) para a análise que pode ser feita nesta comunicação. Por isso, a análise vai circunscrever-se a alguns pontos seleccionados sobre as características da indústria e dos processos de acumulação na economia Moçambicana, e, com alguma incerteza, vai centrar o debate em torno do que pode ser inferido dessa análise.6


As notas:
  1. Prof. Doutor, docente na Faculdade de Economia da Universidade Eduardo Mondlane em Maputo. cn.castelbranco@tvcabo.co.mz. Versão adaptada, modificada e expandida de uma artigo de análise feito no quadro do processo de elaboração da Agenda 2025.
  2. Fine and Rustomjee 1996, Kaldor 1967 e 1957, Lucas 1990 e 1988, Nelson and Pack 1999, Weiss 1985.
  3. Amsden 1989, Boon 1982, Chandler et all (eds.) 1998, Chandler et al (eds.) 1997, Freeman and Hagedoorn 1994, Hirakawa (ed.) 2001, Hirschman 1981 e 1958, Leahy and Neary 1999 e 1994, Ocampo and Taylor 1998.
  4. Amsden 1997, 1994 e 1993, Bayoumi and Helpman 1996, Eaton and Kortum 1996, Gore 1996, Greenaway 1991, Rodrick 1995 e 1992, Shirai and Huang 1994, Wangwe 1994 e Wangwe (eds.) 1995.
  5. Dasgupta 1980, Hirschman 1958, Kaldor 1967 e 1957, Nelson and Pack 1999, Stiglitz 1996.
  6. Esta análise é desenvolvida em torno de quatro artigos, nomeadamente Castel-Branco 2002a, 2002b, 2003a e 2003b.

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