domingo, 10 de maio de 2015

As cerejas do céu

OPINIÃO


Parece ser sempre um milagre que as cerejas tenham voltado. Quantas vezes, durante as noites de chuvadas loucas, deixámos de acreditar que pudessem sobreviver?
Ontem, sábado, chegaram as primeiras cerejas de Resende. Tinham chegado, uma semana antes, os primeiros pêssegos carecas de Olhão e há duas semanas atrás, os primeiros pêssegos do Algarve.
Começa a felicidade da fruta de Maio. Nas semanas que aí vêm (que só agora, neste momento único, parecem muitas...) as cerejas e os pêssegos serão maiores, mais doces e mais baratos. Mas nunca mais serão tão apetecidos.
Estes pêssegos rijos e acidulados — que é uma pena não se poder comprar durante o Verão, sobrando apenas os inteiramente doces  vingam-se de nove meses de paciência, resignação e saudades.
Aqui em Colares, onde houve pouquíssimos pêssegos-rosa nos últimos dois anos, os pessegueiros andam a prometer um Verão de abundância. Fazem falta a adstringência deles, o quinino secreto que trazem, as manchas de sangue que atravessam a carne cor-de-rosa. Mesmo enquanto vou roendo os magníficos parentes algarvios, os pêssegos-rosa não me saem da cabeça.
As cerejas  por enquanto a 5 razoáveis euros o quilo  já são verdadeiras. "Ainda não estão muito doces", desculpam-se os vendedores. "É mesmo assim que gostamos delas", respondemos.
Tal como os andorinhões que cortam o céu à volta da nossa casa com as foices das asas, parece ser sempre um milagre que as cerejas tenham voltado. Quantas vezes, durante as noites de chuvadas loucas, deixámos de acreditar que pudessem sobreviver?
Elas aí estão. Chegam cansadas, a anunciar que vêm aí muitas mais.

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