segunda-feira, 2 de março de 2015

Passos diz que "estava convencido" de que não era obrigatório pagar à Segurança Social


O primeiro-ministro declarou que não teve acesso a qualquer "benefício ou regalia".
O primeiro-ministro declarou nesta segunda-feira que entre 1999 e 2004 – período em que devia ter pago 5016,88 euros à Segurança Social - julgava que o pagamento de contribuições à Segurança Social não era obrigatório. “Estavaconvencido de que, na época, era opção” pagar, afirmou. Aos jornalistas,Passos Coelho disse não ter tido conhecimento da dívida.
O primeiro-ministro declarou ainda que não teve acesso a qualquer "benefício ou regalia" e que foi "tratado como qualquer cidadão" . Passos Coelho assegurou, por outro lado, que não vai "fazer um caso" sobre o facto de terceiros terem tido acesso a informações sobre situações de que nem ele próprio tinha conhecimento.
Recorde-se que Passos Coelho, em resposta ao PÚBLICO, declarou nunca ter sido notificado da dívida em causa, que prescreveu em 2009, adiantando que, em 2012, quando confrontado com dúvidas sobre a sua situação contributiva, o Centro Distrital de Segurança Social de Lisboa lhe indicou que tinha registados 2880,26 euros em seu nome, acrescidos de juros de mora – dívida que, apesar de prescrita, poderia ser paga "a título voluntário e a qualquer momento". Foi o que fez depois de confrontado pelo PÚBLICO com esta situação: em Fevereiro pagou, voluntariamente, cerca de quatro mil euros.
Já nesta segunda-feira, Edmundo Martinho, ex-presidente do Instituto da Segurança Social (ISS) entre 2005 e 2011, disse ao PÚBLICO que a situação em que o primeiro-ministro confirmou encontrar-se entre 1999 e 2004 "corresponde àquilo a que tecnicamente se chama, e é assim que é definida internacionalmente, uma situação continuada de evasão contributiva".

Edmundo Martinho manifestou também a sua surpresa pelo facto de a Segurança Social ter aceitado, no mês passado, conforme disse Passos Coelho ao PÚBLICO, o pagamento de uma dívida que se encontrava prescrita. O Código Contributivo da Segurança Social, explicou o ex-presidente do Instituto da Segurança Social, estabelece que "só a título excepcional é que pode ser autorizado o pagamento de contribuições com efeitos retroactivos quando a obrigação contributiva se encontre prescrita". E a excepção prevista na lei corresponde às situações em que "à data da prestação dtrabalho, aactividade não se encontrasse obrigatoriamente abrangida pelo sistema de segurança social".
A aplicação deste preceito ao caso concreto não é óbvia pelo que Edmundo Martinho entende que deve ser o Insituto da Segurança Social a clarificar os motivos pelos quais foi aceite o pagamento da dívida prescrita, sendo certo que a aceitação do pagamento permite que Passos Coelho acrescente alguns anos à sua carreira contributiva.
Esta manhã, o primeiro-ministro respondeu a algumas das afirmações que Edmundo Martinho já tinha feito ao DN e à TSF: “Esse senhor foi responsável pela Segurança Social durante anos e, nessa altura, essa informação devia ter sido prestada aos contribuintes e não foi.”
Passos Coelho aproveitou ainda a presença dos jornalistas para explicar porque é que, sabendo da dívida desde 2012, não a havia regularizado até agora. “Para acabar de vez com qualquer dúvida” sobre a sua situação contributiva, acrescentou que, quando afirmou que só tencionava pagar a dívida à Segurança Social quando deixasse de ser primeiro-ministro, pretendia com isso significar que pretendia saldá-la numa altura em que já não houvesse margem para suspeitas de que estaria a “usufruir de algum benefício particular”.
Foi isso mesmo que levou o ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, a apresentar nesta segunda-feira a intervenção de Passos Coelho como “um exemplo” de clarificação. Para o ministro da Defesa, a disponibilidade do seu chefe de Governo para tudo explicar foi um “exemplo” da “linguagem de verdade” que se exige a um político.
Houve, na realidade, quem ficasse satisfeito com as justificações de Passos. Segundo o porta-voz do PSD, Marco António Costa, os sociais-democratas sentiram-se “confortáveis e solidários” com o primeiro-ministro.
Mas ouviram-se também críticas, e a expressão de dúvidas. O bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, Domingues Azevedo, classificou as declarações de Passos como “um desastre” político, observando que em 2004 o sistema da Segurança Social já estava “oleado”, a funcionar muito bem, e “toda a gente sabia da obrigação” de descontar.
A CGTP foi ao ponto de falar em “mentira grosseira”. Lembrando os “procedimentos de cobrança coerciva” que visaram contribuintes com dívidas de valor “bem menos significativo”, a central sindical concluiu estar perante um caso de “tratamento privilegiado”.

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