quinta-feira, 12 de março de 2015

O G 40: É COMO UM REI QUE VAI NÚ!


Eu também faço parte do G 40 e tenho enorme orgulho de fazer parte daquela lista. É uma honra e não tenho vergonha nenhuma disso, dado que falo aquilo que penso sem qualquer tipo de limitação. Foram estas as palavras do jurista e analista político António Boene quando comentava ontem na “Noite Informativa” da STV as declarações do líder da Renamo Afonso Dhlakama segundo as quais os académicos que recebem dinheiro em troca da sua independência intelectual não podem ser chamados intelectuais. Foi nestes termos que Dhlakama referiu-se às acções do G 40. Orgulhoso de ser um G 40, António Boene diria ainda que os académicos não estão vedados de serem da esquerda ou da direita, o que, quanto a mim, não significa, necessariamente, que esses académicos devem ser alistados pelos partidos da esquerda ou da direita a fim de andarem a promover o linchamento político do outro nos órgãos públicos de comunicação social. Lembrando uma tal prostituta que escolheu o caminho da prostituição como forma de ganhar a vida, Silvério Ronguane, deputado do MDM, defendeu, perante o seu colega do painel, que nada há a discutir face a liberdade de quem escolhe o seu caminho de sobrevivência, incluindo estes 40 senhores que, tal como aquela prostituta que vende sexo sem se preocupar com aqueles que acham isso imoral, também vendem a sua consciência em troca de dinheiro. Não podemos nos esquecer, segundo Ronguane, que em matéria de liberdade de expressão também há lugar para a expressão da cobardia reservado a esses académicos, sendo que os cobardes, aqueles que trocam a sua liberdade de pensamento por alguns tostões, também merecem ser respeitados. Enquanto a ironia do Silvério Ronguane vai igualando a acção dos alistados do G 40 ao trabalho das prostitutas, quem acabaria por perder a paciência é o terceiro membro do painel, o deputado Eduardo Namburete, da Renamo, que encontra no G 40 a expressão exacta da violência estrutural de um sistema em decadência, cujas mensagens de ódio contra o académico Gilles Cistac foram subindo de tom até desembocarem no seu brutal assassinato nas ruas de Maputo. Enquanto Boene vai se orgulhando por ser um G 40, ante o olhar de Ronguane que vê nisso uma certa forma de prostituição, Namburete descreve Boene como uma das raras excepções que confirma a regra do que caracteriza a acção daquele grupo de analistas políticos a soldo do regime, porquanto este consegue debater em órgãos privados de comunicação social com outros analistas que pensam diferente dele, sem temer o contraditório, tendo dito, entretanto, que os restantes devem ser vistos como sendo um grupo que está a atentar contra o funcionamento normal dos serviços públicos de comunicação social, atentando, em linha directa, contra o Estado de Direito e Democrático. É caso para se dizer que o rei vai nú. Por isso anda toda a gente a rir-se destas tristes figuras de comédia, que começam por demonstrar a sua genica no manuseamento da lingua portuguesa, para depois culminarem, invariavelmente, na promoção do ódio, servindo-se, para isso, da rádio e da televisão pública que, sendo de nós todos, é paga por nós todos, que somos os contribuintes do Estado. Enquanto o jornalista Gustavo Mavie vai desmentindo a existência do G 40, chegando mesmo a apontar Fernando Lima como tendo inventado a lista, eis pois que já começam a aparecer alguns integrantes da lista impopular, como é o caso de António Boene, a confirmarem a existência da mesma, embora o façam acrescentando condimentos de orgulho por fazerem parte da mesma, a fim de nos distrair, a fim de que não nos apercebamos de que estamos em presença de uma fábrica do ódio e do apartheid na imprensa pública. Pelos novos desenvolvimentos do caso, tudo indica que estamos a entrar para a segunda parte do jogo. O jogo entre as forças de revelação e as forças de ocultação que caracteriza o desdobramento de um escândalo político. Todo o escândalo tem um ciclo de vida: nasce, cresce, reproduz-se e morre. Estamos a meio do jogo e tudo indica que ainda vai correr muita tinta, com novos dados e novas revelações que ainda hão-de ser feitas, para o gáudio das audiências que agora vão começando a abarrotar as bancadas. Talvez o G 40 ter que se reunir de emergência, a fim de concertar posições, pois tudo indica que o grupo está a perder a unicidade discursiva e a expressão monocórdica que determinou a sua origem e a sua acção subsequente. É tempo de ajudarmos as audiências a compreenderem o escândalo político, as suas causas, os seus actores e as suas consequências. Para aumentar o alcance das lentes das audiências, serve-nos o apoio de John Thompson, um sociólogo norte-americano que se dedicou a estudar o escândalo político, começando por definir que o mesmo refere-se a “acções e acontecimentos que implicam certos tipos de transgressões que se tornam conhecidos de todos e que são suficientemente sérios para provocar uma resposta pública”. O aspecto mais óbvio do escândalo, segundo Thompson, é que implica acções ou acontecimentos que transgridem determinados valores, normas ou códigos morais. Os escândalos políticos são, como no caso G 40, acontecimentos confusos não apenas porque os valores e normas são comumente contestados, mas também porque no desdobramento subsequente das acções e falas que formam um escândalo específico, uma multiplicidade de valores e normas pode estar implicada. Muitos escândalos implicam o que Thompson descreveria como “transgressões de segunda ordem”, onde a atenção é transferida de uma ofensa original – como a lista publicada pelo SAVANA que ofende o mais sensato dos mortais – para uma série de subsequentes acções que têm como objectivo esconder a ofensa. A tentativa de encobrir a transgressão – um processo que pode implicar engano, obstrução, negações falsas e puras mentiras como aquelas que vão sendo propaladas por Gustavo Mavie que chega a acusar Fernando Lima de ter inventado a lista infâme – pode se tornar mais importante do que a própria transgressão original, dando origem a um ciclo intensificado de afirmações e contra-afirmações que deixa em segundo plano o desenvolvimento da ofensa inicial e abastece o escândalo, que vai sendo incrementado a cada lance subsequente. Para o gáudio das audiências, o caso G 40 vai se desdobrando, com promessas de mais e sérios desdobramentos ao longo dos proximos dias. O que há a sublinhar, entretanto, é que os visados tudo farão para desmentir a existência do grupo, contradizendo-se uns aos outros, tudo na tentativa de ocultar uma transgressão grave que atenta contra a liberdade de imprensa e de expressão, o direito à informação, o pluralismo político, ideológico, de expressão, de opinião e de informação. A lista do G 40 revela-nos, para o nosso espanto colectivo, que o debate de ideias na rádio e televisão públicas é gerido a partir do gabinete de propaganda do partido Frelimo, que, segundo o professor Lourenço do Rosário, ainda não apareceu para se distanciar publicamente do trabalho desenvolvido pelos seus analistas, daí que Afonso Dhlakama fale de académicos que recebem dinheiro em troca dos seus posicionamentos e em detrimento da verdade. Portanto, o rei vai nú. E a procissão ainda vai no adro!
Major-General Henri Miller

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