segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

RENAMO: A HISTÓRIA REPETE-SE

Centelha por Viriato Caetano Dias (viriatocaetanodias@gmail.com )

“Quem não tem unhas, não deve inventar sarna. Como irá coçar-se?” Trecho extraído de uma conversa com o amigo Nkulu

Quando andava nas poltronas da Universidade, discutia-se fervorosamente se a história se repete ou não.

Citávamos, de memória, o pensamento de Hegel “A História repete-se sempre, pelo menos duas vezes”, ao que Marx acrescentou o seguinte: “a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”.

Uns buscavam provas das suas escolhas nos exemplos pessoais (uma reprovação repetida na escola), outros (como é o meu caso) recorriam à história para narrar algumas semelhanças nos acontecimentos que jazem nos anais da humanidade.

Para o meu caso, por incrível que pareça, uma caturrice minha já antiga de não gostar de consumir “soros” do estrangeiro, baseava os meus exemplos no comportamento repetitivo da Renamo, sobretudo depois de conhecidos e publicados os resultados eleitorais.

Na vida, segundo a filosofia do meu amigo Nkulu, “a constante repetição é a morte do artista”, porque quem não apresenta novidades positivas não sobrevive face à pressão do mundo da concorrência.


A Renamo ao tomar as mesmas decisões nos pleitos eleitorais, assumindo ocorrência de fraude de cujo processo ela própria é fiscalizadora, corre riscos de uma implosão interna, como esteve muitas vezes prestes a acontecer, tendo sobrevivido graças aos titânicos esforços de algumas “salas de reanimação). Morrendo a Renamo, não haja anestesias de dúvidas, uma parte dos pilares da nossa democracia desaparecerá para o empobrecimento do país. Todos os braços são poucos para, pedra a pedra, construirmos o futuro melhor deste nosso amado Moçambique.

Na Renamo, a história da negação dos resultados eleitorais já tem careca e barba branca. Já fez currículo e escola. É antiga quanto os intervenientes. Já em 1998, de punho em riste, a Renamo e outros partidos da oposição, boicotaram as primeiras eleições autárquicas, sucedendo-se o mesmo em 2013. Estes boicotes não trouxeram benefícios à Renamo, mas permitiram, na esteira das últimas eleições autárquicas, que o embrião chamado MDM conseguisse sobreviver da incubadora.

Foram estratégias mal pensadas que correram mal e demonstram ser altura da liderança da Renamo arrepiar caminho, para que não seja julgado como coveiro do seu partido, isto é, a Renamo tornar-se sujeito do seu auto-sepultamento.

O fogo da prática tem demonstrado, igualmente, ser insustentável a ideia da Renamo não tomar posse nas assembleias provinciais e na “Casa Magna” (Assembleia da República), porque, do ponto de vista democrático, defraudaria as expectativas do seu eleitorado e, mais do que isso, levaria os seus membros a enfrentarem situações de “jejum estomacal”.

Oiço com muita frequência algumas vozes dizerem que a Renamo está habituada à tradição de viver em dificuldades, mas esquecem-se que hoje a Renamo já não é um movimento rebelde, nem possui a mesma capacidade de resistência à estiagem.

Esta decisão de não fazer parte do “jogo democrático” é o mesmo que dar tiro no próprio pé que reforçará, como no passado recente, as esperanças do seu rival MDM. Em democracia não se combate um inimigo político fugindo, como o “diabo da Cruz”, enfrenta-se pacientemente. Não é do lado da bancada (onde se constroem opiniões diversas), que se marcam golos.

É no campo político, onde se decidem os resultados. Parece não ser esta a vontade da Renamo, visto que continua a apostar na mesma tecla, repetindo os mesmos erros que os acorrenta a mente.

Esta decisão de abandono de responsabilidades perante o seu eleitorado pode ter outras consequências desagradáveis na liderança da própria Renamo. Será um pretexto para “desalojar” o poder ao seu líder, até porque há sinais visíveis que mostram para esse interesse. Por outro lado, é importante lembrar a lucubração do escritor zambeziano Arrone Fijamo que “As histórias das piores tempestades ciclónicas tiveram sempre desagradáveis epílogos”, o que pode significar que a acção da Renamo terá uma enérgica reacção dos seus membros se os prazos de tomada de posse forem vencidos. Não é algo vulgar a existência de uma namorada que possa manter laços com um namorado que gazeta na hora crucial de confirmar a sua masculinidade.

Com esta triste decisão, a liderança da Renamo poderá experimentar, desta vez, a pílula amarga dos seus quadros que trabalharam para atingir o sonho de deputado.

Reafirmo recorrendo ao pensamento de João Renato da Silva quando diz “Você não pode amarrar o cabrito no deserto e esperar que ele coma areia.”

Pois, a liderança da Renamo não deve proibir os seus membros de tomarem posse e esperar que comam capim. Uma só iniciativa pode arrastar todos para uma decisão que será justa e de consciência.

Eu não estou aqui para julgar a Renamo.

Também não direi que ela está totalmente isenta de alguma razão, porém, a espingarda nunca foi solução para o entendimento.

Termino concordando com a frase de Peter Bamm “O que na verdadeimporta na vida não são os objectivos a que nos propomos, mas os caminhos que seguimos para realizá-los”. Uma lição de vida. Zicomo (obrigado).

P.S.: Para quem ama a vida e perfilha a epístola religiosa, não pode ficar indiferente ao ataque terrorista contra a gazeta Charlie Hebdo e que vitimou vidas humanas. A minha voz pode ser de “pigmeu” para dizer stop ao terrorismo, mas a vontade, a minha oração e os meus braços são de gigante para dissuadi-lo. Estive em Paris por duas vezes e senti o mesmo que sinto quando vou a África do Sul: existem problemas religiosos e raciais congelados, cuja resolução é urgente para que não degenerem em actos de terror. A intolerância não deve ser imputada somente ao acusado, pois o acusador não é totalmente inocente no tribunal da lógica e da consciência. Ora vejamos. Uma das características receitáveis ao Homem deste século e que deve servir de bússola da sua conduta é o respeito pelas convicções dos outros, naquilo que não constituir radicalismo nem violação dos direitos humanos. Como se explica a existência de um jornal que se dedica a satirização e, em especial, a figura de Maomé (enviado de Alah), figura basilar doutrinária dos muçulmanos? Não digo que os radicais islâmicos tenham alguma razão em cometer actos bárbaros como o recentemente perpetrado em Paris. Contudo, por que meter constantemente o dedo na toca da cobra, sabendo que, em alguns momentos, ela pode ensaiar actos violentos? A tolerância não deve ser exigida apenas aos muçulmanos, mas, também, a nós cristãos para que não estejamos a renovar constantemente as feridas que desejamos que fiquem cicatrizadas. O meu posicionamento não consiste em defender os radicais, mas em apelar para que as vítimas do radicalismo islâmico não contribuam para a quota-parte na exacerbação dos actos terroristas. Há coisas eticamente incorrectas. Uma sogra consciente da sua condição de sogra não deve criar situações que agucem os “apetites sexuais” do genro, na esperança de que ele permaneça comportando-se apenas como genro. Foi por isso que Berthold Brecht alertou para o seguinte facto: “Do rio que tudo arrasta se diz que é violento, mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.”

WAMPHULA FAX – 12.01.2015

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