segunda-feira, 10 de junho de 2013

Não será por via da força que Renamo será alternativa - considera o académico Edilson Munguambe

 
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Edilson_munguambeO ACADÉMICO Edilson Francisco Munguambe, docente de finanças públicas na Universidade A Politécnica, defende que não será por via da força que a Renamo vai se evidenciar como uma alternativa política, mas sim pela sua capacidade de ir resolvendo alguns problemas do país.
 
Maputo, Segunda-Feira, 10 de Junho de 2013:: Notícias
Em entrevista a este matutino, Munguambe observa, entre outras questões, que o povo é que determina a preponderância dos partidos em cada contexto. Sobre o desenvolvimento de Moçambique considera que existem perspectivas positivas a nível macroeconómico e que se souber gerir de forma racional esta dinâmica tornar-se-á numa nação de grande prosperidade. No domínio de combate a pobreza, admite que ainda há muitos cidadãos com carências da primeira linha, sendo que, como desafio, é preciso combinar instrumentos de política macroeconómica de curto, médio e longo prazo.
NOTÍCIAS (N) – Está em curso o diálogo entre o Governo e a Renamo. Como é considera este exercício?
EDILSON MUNGUAMBE (EM) - Considero este exercício de diálogo entre o Governo e o partido Renamo mais um esforço no sentido de consolidação do nosso Estado de Direito democrático. Demonstra a seriedade do Governo do dia em garantir a estabilidade política, a estabilidade económica e social do país, permitindo que os cidadãos vivam num ambiente de paz, de tranquilidade e que possam continuar a contribuir, sem muitos receios, para o grande desafio do país que é o combate a pobreza. Em algum momento, sem o diálogo criamos brechas para que o grande pilar de desenvolvimento do país pudesse ser comprometido. Assim, está assegurado que há um comprometimento do Governo e, felizmente, o partido da oposição compreendeu que o diálogo é o melhor caminho. Quero felicitar as duas partes e que isso sirva de exemplo para que todos os concidadãos compreendam que o diálogo é o único veículo para a garantia da estabilidade do país.
N- A Renamo defende que tudo o que for discutido no âmbito do diálogo deve alicerçar-se no Acordo Geral de Paz. O Governo diz que o Acordo Geral de Paz prescreveu. Com estas posições, o que se pode esperar?
EM - Primeiro gostaria de dizer que não se pode confundir diálogo com imposições. O diálogo pressupõe a cedência daquilo que são valores e opiniões de cada uma das partes para que se encontre o equilíbrio. Este é o primeiro princípio. Na minha opinião, a perspectiva inicial da oposição Renamo veio a ser provada que ela está totalmente descontextualizada. Se recorrermos ao artigo publicado citando o Dr. Hunguana, ficou evidente que todos os aspectos que a Renamo apresentava na mesa das negociações referindo-se ao Acordo Geral de Paz estavam descontextualizadas. Diante deste novo contexto, o que pode acontecer é provavelmente as partes encontrarem o tal equilíbrio, porque o objectivo está claro: a manutenção da paz, estabilidade social e da economia. É preciso deixar claro que não há ambiente e não é actual uma discussão sobre os princípios do Acordo Geral de Paz. Que a Renamo apresente novos fundamentos, novos argumentos, deixando clara a sua visão e opinião sobre o processo de desenvolvimento e o Governo saberá, naturalmente dentro da abertura para o diálogo, enquadrar essas aspirações para que ambas partes saiam a beneficiar dentro deste processo.
N – Acha que o diálogo em curso é resultado dos discursos e actos de violência protagonizados pela Renamo?
EM - Resultou, na minha opinião, duma má interpretação do conteúdo do Acordo e de alguma forma duma inércia da oposição à dinâmica de desenvolvimento económico, político e social do país. E isso trouxe certo desespero da oposição em tentar, pelo mecanismo da força, voltar a se evidenciar como uma referência dentro do quadro político nacional. É preciso perceber que não são os partidos que impõem a realidade política, é o povo que determina a preponderância dos partidos políticos em cada contexto, em cada momento político do país. Por isso, não será por via da força que a Renamo vai se evidenciar como uma referência, como uma alternativa política, mas sim pela via da demonstração da sua capacidade de ir resolvendo alguns problemas com aspirações da sociedade. Está evidente que o povo não está interessado, nesta fase, em recuar para o momento de instabilidade, para o momento de guerra, e os cenários que temos estado a viver em alguns pontos do país protagonizados pela Renamo demonstram que ela está totalmente contrária àquilo que é o princípio de estabilidade, o princípio dum Estado democrático e de Direito. 
N – Pode-se dizer, então, que este diálogo não terá resultados palpáveis?
EM - Termos estado a perceber que a Renamo, gradualmente, vai se reconhecendo que não há alternativa, senão ir pela coerência no diálogo, olhando para aquilo que são os desafios do momento no país. Se nós assumirmos que a violência, o recurso à força não é um mecanismo possível, então a Renamo terá que retirar da sua abordagem, do seu discurso a possibilidade de se recuar ao cenário de guerra caso algumas condições não sejam acomodadas. Este é um aspecto fundamental. Por isso, insistimos: se a Renamo, de facto, está interessada em se manter como uma força alternativa, como um partido dentro daquilo que são os pressupostos dos partidos políticos dentro dum Estado democrático, deve insistir nesta abertura do Governo em aspectos concretos, em propostas concretas que contribuam para a consolidação do processo de desenvolvimento económico e político do país.
N – A Renamo reafirma que não participará das eleições deste ano. E já ameaçou impedir que os moçambicanos votem. Qual é a sua opinião sobre este posicionamento?
EM - Bom, é uma posição de quem não reconhece que o povo não quer mais a violência. Se a Renamo considera-se um partido político, os canais, os mecanismos legais estabelecidos para participação política dos partidos são as eleições, donde vai derivar o mecanismo de força tanto para Assembleia como para a Presidência e para os órgãos autárquicos. É lá onde a Renamo vai poder medir o pulsar da aceitação do povo com relação à sua existência como partido político. Então, eu penso que a Renamo devia insistir em aproveitar esta oportunidade que a Constituição, digamos, cria para todos os partidos políticos para participar do processo e evidenciar-se como uma força alternativa e daí poderá fazer o balanço para ver até que ponto a sua inserção no país é positiva ou não.
N – Crê numa provável renúncia da sua posição e participe das eleições?
EM - Sendo um partido político, não esperaria outra posição da Renamo se não essa. Se não for, terá que reflectir, fazer uma análise de consciência e se questionar a si própria sobre o seu objectivo, o seu projecto político a nível nacional. Sabemos que se não participar nas eleições autárquicas de 2013, só terá oportunidade de o fazer daqui a mais cinco anos. Como é que vai acomodar as forças que ainda existem favoráveis à sua presença, a sua permanência como partido político? Os dirigentes da Renamo têm que olhar para si, não com o forças que impõem os cenários mas como resultado de um processo dinâmico, de aceitação por um grupo que considera que a sua presença nos processos políticos é fundamental para que possa rever as suas aspirações dentro daquilo que é o programa de desenvolvimento do país.
N – Qual é a sua apreciação ao processo de democracia e desenvolvimento do país?
EM - Os resultados e os indicadores que são apresentados diariamente tanto por instituições nacionais como por organizações internacionais revelam que o país é uma referência mundial, tanto a nível político como a nível económico. Naturalmente que o processo de consolidação é contínuo. Temos que estar constantemente a aperfeiçoá-lo, temos que procurar sempre melhorar os mecanismos de governação, os mecanismos de gestão dos instrumentos de política económica no sentido de irmos tornando, cada vez mais, o processo inclusivo, criando bases para que mais cidadãos se sintam beneficiados pelos ganhos do processo de desenvolvimento económico. É um país que tem estado a registar níveis de crescimento económico estáveis, um país que tem perspectivas positivas a nível macroeconómico e que se souber gerir de forma racional, coerente esta dinâmica que surge por via do grande “boom” do investimento directo estrangeiro poderá vir a ser, sem dúvidas, de grande prosperidade.
N – Partilha da opinião de que os níveis de pobreza têm estado a aumentar no país, apesar do esforço governamental tendente a sua redução?
EM - Temos que ter cuidado quando analisamos os indicadores macroeconómicos sobre a redução da pobreza em Moçambique. É evidente que pelos níveis de crescimento e se nós olharmos para aquilo que tem estado a ser a taxa de crescimento da população, sendo a taxa de crescimento económico superior, há um impacto directo ou indirecto ao nível da redução da pobreza. Naturalmente que ainda não conseguimos resolver todos os problemas. Há, evidentemente, um grupo de cidadãos moçambicanos que ainda se encontram em situação de pobreza extrema. Em termos de perspectivas, o desafio da política macroeconómica tem que ser no sentido de melhorar os mecanismos de redistribuição da riqueza, garantindo que cada vez mais os ganhos de crescimento tenham o impacto directo ao nível da população que se encontra no sector real da economia. Este é o grande desafio da política macroeconómica. Têm que ser combinados aqui instrumentos de política macroeconómica de curto, médio e longo prazo. A curto prazo, o desafio do Governo tem que ser no sentido de se continuar a garantir uma estabilidade macroeconómica a nível, por exemplo, da inflação, contribuindo de certa forma para garantir que cada vez mais cidadãos possam adquirir os bens e serviços a custos socialmente aceitáveis. A médio e longo prazo, combinar a política fiscal com as políticas monetárias, de alguma forma a política cambial, garantindo que os mecanismos de financiamento sejam cada vez mais flexíveis e eficientes, garantindo a cada cidadão nacional o acesso directo às possibilidades de financiamento, principalmente o nosso sector produtivo. Temos que garantir, através de canais eficientes, que as unidades produtivas nacionais localizadas no sector real possam ter acesso directo ao financiamento para financiar as suas perspectivas de produção. Por outro lado, temos que melhor os mecanismos de comercialização, através do investimento em infra-estruturas, temos que incentivar a instalação de indústrias de processamento de produtos agrícolas para termos cada vez mais cidadãos a envolverem-se no processo de produção e assim conseguirmos aumentar os rendimentos, aumentar o emprego ao nível da base. Por outro lado ainda, temos que apostar na protecção social como pilar de desenvolvimento. É preciso reforçar os mecanismos de protecção social dos cidadãos, adoptando soluções que sejam extensivas à população inserida no sector informal. Isso reduz a pressão sobre o orçamento público.

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